Órgãos com HIV: mais um sócio de laboratório é preso
Matheus Sales Teixeira Bandoli Vieira, sócio do PCS Lab Saleme, foi preso nesta quarta-feira (23). Ele era o único investigado ainda solto no escândalo dos órgãos com HIV. A Justiça determinou sua prisão nessa terça-feira (22).
Ao se apresentar na Cidade da Polícia, por volta das 8h30 desta quarta, Matheus e o advogado encontraram a Delegacia do Consumidor (Decon) fechada — o expediente na unidade começava às 9h. Deram meia-volta e foram embora de carro. Quinze minutos depois, com a especializada já aberta, o sócio do Saleme retornou — e enfim foi preso.
Segundo a Decon, agentes em diferentes equipes estavam na rua desde antes das 6h para cumprir o mandado de prisão contra Matheus.
Primo do ex-secretário estadual de Saúde Doutor Luizinho, Matheus Vieira foi um dos 6 denunciados pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) nesta terça. Todos viraram réus, porque a juíza Aline Abreu Pessanha, da 2ª Vara Criminal de Nova Iguaçu, aceitou a denúncia.
Nesta terça, a defesa de Matheus tinha dito que o pedido de prisão foi “arbitrário”, uma vez que ele tem colaborado com as investigações. Nesta quarta, o advogado Afonso Destri afirmou que entraria com um pedido de habeas corpus para o sócio do Saleme.
“A decisão é absolutamente ilegal e constitui clara antecipação de pena, sem processo, sem julgamento. A decisão não traz qualquer fato concreto que autorize a prisão preventiva. Matheus sempre colaborou com as investigações, tanto que sequer foi alvo de prisão temporária”, declarou.
Os seis denunciados são:
- Matheus Sales Teixeira Bandoli Vieira, sócio do laboratório (preso)
- Jacqueline Iris Barcellar de Assis, funcionária (presa)
- Walter Vieira, sócio (preso)
- Ivanilson Fernandes dos Santos, funcionário (preso)
- Cleber de Olveira Santos, funcionário (preso)
- Adriana Vargas dos Anjos, coordenadora (presa)
Os denunciados respondem por associação criminosa, lesão corporal e falsidade ideológica. Além desses crimes, Jacqueline responde também por falsificação de documento particular.
“Os denunciados tinham plena ciência de que pacientes que recebem órgãos transplantados recebem imunossupressores para evitar a sua rejeição, e que a aquisição de qualquer doença em um organismo já fragilizado, principalmente HIV, seria devastadora”, citou a promotora.
Na denúncia, o MPRJ cita que, além de uma série de exames com resultados falsos, as filiais do PCS “não possuíam sequer alvará e licença sanitária para funcionamento”.
O relatório de inspeção da Vigilância Sanitária constatou 39 irregularidades, entre elas a presença de sujeira, de insetos mortos e formigas em todas as bancadas do laboratório.
“O que foi apurado neste procedimento não foi um fato isolado, resultado de uma conduta negligente. Mas demonstram a indiferença com a vida e a integridade física dos pacientes transplantados e demais pacientes recebem dos denunciados, que não hesitaram em modificar protocolos de segurança motivados apenas por dinheiro.”
A Anvisa descobriu ainda que o PCS não tinha kits para realização dos exames de sangue nem apresentou documentos comprovando a compra dos itens, o que levantou a suspeita de que os testes podem não ter sido feitos e que os resultados tenham sido forjados.
No documento, o MPRJ cita ainda “a existência de várias ações indenizatórias” propostas contra o PCS por “erro de diagnóstico” e dá como o exemplo o caso dona de casa Tatiane Andrade, que teve exame falso positivo para HIV feito pelo laboratório no parto. O erro fez com sua bebê recebesse tratamento para pessoas com a síndrome por 28 dias.
A Polícia Civil concluiu o inquérito do caso e indiciou os seis investigados — incluindo os cinco presos nas duas fases da Operação Verum. A Delegacia do Consumidor (Decon) também representou pela prisão preventiva deles. A Decon segue investigando o processo de contratação do laboratório.
“A análise do material apreendido poderá trazer elementos para novas investigações”, disse a Polícia Civil.
A situação foi descoberta no último dia 10 de setembro, quando um paciente transplantado foi ao hospital com sintomas neurológicos e teve o resultado para HIV positivo; ele não tinha o vírus antes.
Esse paciente recebeu um coração no fim de janeiro. A partir daí, as autoridades refizeram todo o processo e chegaram a 2 exames feitos pelo PCS Lab Saleme.
A primeira coleta foi feita no dia 23 de janeiro deste ano — foram doados os rins, o fígado, o coração e a córnea, e todos, segundo o laboratório, deram não reagentes para HIV.
Sempre que um órgão é doado, uma amostra é guardada. A SES-RJ, então, fez uma contraprova do material e identificou o HIV. Em paralelo, a pasta rastreou os demais receptores e confirmou que as pessoas que receberam 1 rim cada também deram positivo para o HIV.
A que recebeu a córnea, que não é tão vascularizada, deu negativo. A que recebeu o fígado morreu pouco depois do transplante, mas o quadro dela já era grave, e a morte não teria relação com o HIV.
No dia 3 de outubro, mais um transplantado também apresentou sintomas neurológicos e testou positivo para HIV. Essa pessoa também não tinha o vírus antes da cirurgia. Cruzando os dados, chegaram a outro exame errado, o de uma doadora no dia 25 de maio deste ano.
O que dizem os citados
Nota do PCS Saleme:
“A defesa dos sócios do PCS Lab Saleme considera arbitrário o pedido de prisão de Matheus Vieira, que se apresentou voluntariamente para depor à polícia e segue colaborando com as investigações no âmbito penal e administrativo.
Análise preliminar do HemoRio apontou resultado negativo para HIV em todas as 286 amostras de sangue de doadores de órgãos que foram retestadas. Isso comprova que os dois laudos errados foram episódios pontuais, porém graves, causados por falha humana.
Os pacientes infectados com HIV após transplantes de órgãos receberão o suporte necessário quando o laboratório validar junto às autoridades as medidas reparadoras que serão adotadas para eles e suas famílias.”
Nota de Adriana Vargas:
“A defesa de Adriana Vargas entende que a prisão, mesmo que temporária, é completamente injusta e está agindo para retirá-la do cárcere o mais rápido possível.
É inaceitável que um paciente receba órgãos infectados, devendo os culpados serem responsabilizados, mas para decretação de uma medida tão grave como foi a decretação da prisão de Adriana, deveria ter ocorrido uma dilação probatória mais ampla, o que não se amolda no caso em tela, onde o Delegado representou pela prisão somente por divergências de depoimentos, sem qualquer prova mais robusta.
Ao término da instrução processual será comprovada a inocência de ADRIANA, porém os dias no cárcere de forma injusta nunca serão esquecidos.”