Estafe de Neymar quer ‘plano de emergência’ para recuperar imagem do atacante

Se, em 2010, apesar do apelo popular, Neymar ficou de fora da lista de Dunga e, em 2014, o craque sofreu no Mundial do Brasil a mais grave contusão da sua carreira que quase lhe tirou os movimentos das pernas, a Copa da Rússia ficará marcada como aquela em que o atacante fracassou na tentativa de levar o Brasil ao título e ainda acabou como principal alvo de críticas da imprensa internacional e até de jogadores e técnicos por exagerar nas expressões de dor a cada falta sofrida. Nas redes sociais, Neymar virou motivo de chacota e, ridicularizado, gerou memes que debocham da sua performance nos gramados russos.

Com a imagem arranhada, o desafio do craque agora é tentar mudar a percepção que o público tem de si. O Estado apurou que o pai e empresário do jogador vai se reunir nos próximos dias com seus assessores mais próximos para buscar alternativas e ações com o objetivo de melhorar a imagem do filho.

Apesar de o Brasil ter sido eliminado no dia 6, o pai de Neymar esticou a sua estadia na Rússia e só retornou ao Brasil quase uma semana depois do jogo. Em Moscou, por exemplo, ele esteve com André Cury, empresário que intermediou a transferência do filho do Santos para o Barcelona, em 2013.

Desde a derrota para a Bélgica, o atacante do Paris Saint-Germain tem optado pela reclusão. Ficou decidido juntamente com o seu estafe que a próxima aparição pública do craque deve ser apenas em um leilão beneficente, quinta-feira, como parte da estratégia de tentar apagar a imagem narcisista que Neymar passou durante a Copa. Depois, vai promover um campeonato entre jovens na sede do seu instituto, na Praia Grande.

O público infantil, por sinal, é um nicho importante a ser explorado, de acordo com especialistas ouvidos pela reportagem. Após o jogo diante do México, pelas oitavas de final, o técnico Juan Carlos Osorio falou, sem citar nominalmente Neymar, que ele não era “um exemplo para o futebol e para as crianças que veem o futebol”.

“É mostrar justamente o contrário, que ele é, sim, uma influência positiva para as crianças, que se preocupa com a formação. O instituto dele é uma boa ferramenta para isso”, explica Mauro Corrêa, sócio-diretor da CSM Golden Goal, empresa de gestão esportiva. “Mais do que ser honesto, é preciso parecer honesto. Mais do que ser uma boa influência, é necessário demonstrar isso.”

O problema, alegam especialistas, é que mesmo ações corretas do camisa 10 do ponto de vista estratégico acabam se voltando contra ele neste momento. De acordo com a consultora de mídias digitais Soraia Lima Herrador, que também coordena a Pós-graduação em Planejamento Estratégico e Concepção de Branded Content no Senac, o silêncio do jogador foi acertado. “Ele fez certo. Perdeu, se resguardou. Está preservando a imagem dele. Colocou seu ponto de vista, disse que estava triste e ponto”, analisa.

Na França, a aposta é de que Neymar conseguirá dar a volta por cima com boas atuações no PSG. “Estrelas como Beckham e Zidane também tiveram problemas em outras Copas que prejudicam suas imagens em uma visão de curto prazo, mas não em uma perspectiva de longo prazo. Se Neymar for bem em campo, o que é provável que aconteça no Campeonato Francês, ele vai superar tudo isso”, analisa Jean-Philippe Danglade, professor de marketing esportivo da Kedge Business School.

Três perguntas para Washington Olivetto, publicitário

1. Neymar saiu desta Copa do Mundo um patamar abaixo do que entrou em relação à sua imagem?

O Neymar faz parte de uma geração de jogadores de futebol que apelidei, anos atrás, de ‘futpopbolistas’, uma mistura de jogador de futebol com artista pop. O primeiro que simbolizou isso fortemente foi o David Beckham. E o Neymar faz muito parte dessa cultura. Acho que ele sai com uma imagem enfraquecida, sim, por alguns fatores que são até curiosos. Houve um primeiro um erro mercadológico dele ou de quem o assessorou no episódio da estreia da Copa do Mundo. O grande fato ali era a recuperação física dele, que voltava de uma contusão, mas aquele cabelo diferenciado acabou chamando mais a atenção. Outra coisa que não foi favorável: exacerbar nas reações às faltas sofridas. Esses dois componentes começaram a prejudicá-lo já no início da Copa do Mundo. É claro que, se o Brasil tivesse vencido e ele continuasse até a final, tudo isso seria jogado para um segundo plano.

2. Isso interfere de alguma forma na inserção dele no mercado publicitário? Alguma marca deixaria de procurar um jogador como ele em virtude da crise extracampo?

Como ele tem enorme talento, pode se recuperar. Mas, que nesse momento a imagem foi prejudicada, não há dúvida. Existe outra coisa para a gente pensar. Essa Copa está valorizando – e talvez isso esteja acontecendo porque acabou exaurindo essa questão da imagem do jogador, por mais talentoso que seja, estar muito atrelada ao fator mercadológico – talentos igualmente brilhantes, mas mais discretos. É o caso do Modric, por exemplo, do Hazard e do Mbappé. Talvez, até no futebol mundial, o maior fenômeno de equilíbrio disso seja o Cristiano Ronaldo, que equilibra muito bem o talento futebolístico com o talento mercadológico.

3. O que você sugeriria ao Neymar para reverter esse quadro?

Pela dimensão dele, e principalmente no Brasil, o Neymar é um fenômeno da mídia aberta, da grande mídia. Então, tanto no momento favorável quanto no desfavorável, é preciso ter preocupação em estar presente na grande mídia e, obviamente, nas mídias sociais. Ele errou em priorizar a grande mídia nos momentos de sucesso e, na dificuldade, ter optado pela mídia social. Tenho impressão de que, nesse momento, ele também cometeu alguns erros de comunicação. O produto tem de ser sempre mais importante do que a sua publicidade. E teve um momento em que se valorizou mais a publicidade do que o produto. O Neymar tem tudo para reverter, pois é um jogador que tem o talento natural. Ele precisa focar exatamente nisso, no trabalho e nas atenções como jogador. É o que vai recuperar a imagem dele como negócio.

Cristiano melhorou na base da ‘porrada’

Cinco prêmios de melhor do mundo, cinco títulos da Liga dos Campeões e uma vasta coleção de troféus. Hoje, Cristiano Ronaldo é reconhecido apenas por sua performance fora de série. Porém, num passado nem tão distante assim, ele experimentou algo semelhante ao que se passa com Neymar: o talento incomum era, muitas vezes, ofuscado pela fama de cai-cai.

A mudança do Sporting de Lisboa para o Manchester United, onde jogou de 2003 a 2009, lhe rendeu prestígio, dinheiro e uma enxurrada de críticas da mídia, dos torcedores e dos jogadores do Campeonato Inglês, que o acusavam de simular faltas e tentar ludibriar a arbitragem – por lá, o gesto é chamado de “diving” (“mergulho”). Não raro, CR7 recebia vaias quando pegava na bola durante os jogos.

A mania irritava os próprios companheiros de equipe. Em um documentário, Phil Neville, ex-atleta do United, contou que o primeiro ano, especialmente, foi de “aprendizado” para o português. A técnica? Pancada. “Nos treinos, tínhamos o (Roy) Keane, o (Nicky) Butt e o (Paul) Scholes, e sempre que ele pegava a bola, eles o chutavam repetidamente. Não apenas uma vez. Chutavam-no todo dia, toda semana, a temporada toda”, contou Neville. Tudo incentivado pela comissão técnica, orientada pelo técnico Alex Ferguson.

A fama negativa chegou a tal ponto que os árbitros ingleses utilizaram Cristiano como objeto de estudo, ao produzirem um vídeo com a compilação de vários lances de simulação. O ex-árbitro e atual comentarista da TV Globo Leonardo Gaciba conta que esse material foi exibido durante um curso na Granja Comary ministrado para juízes do quadro da Fifa. “Aqui no Brasil, um vídeo semelhante a este seria considerado perseguição ao jogador. É uma cultura diferente”, analisa Gaciba.

O português ainda comete exageros, reclama com a arbitragem, mas melhorou sensivelmente nesse aspecto.

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