Muay Favela: projeto social em AL “forma cidadãos” pelas mãos da arte marcial

Professor Luiz Tigrão enxergou em Rian a vontade que ele tinha quando começou a praticar a arte marcial (Foto: Jonathan Lins/G1)

Não tem no dicionário, mas no dia a dia a gente aprende que um dos sinônimos de esporte é superação. É clichê, é senso comum, mas é real. Note como começam as histórias dos jogadores de futebol, dos atletas e dos lutadores. Todos têm o mesmo objetivo: se firmar no esporte para conseguir uma vida melhor. A narrativa abaixo não é muito diferente. Na verdade, ela começa até em uma academia de nome forte, de impacto: Super Ação. A história é sobre a vida de dois irmãos e um professor que encontraram no muay thai a chance de evoluir.

– Meu sonho antes era formar atletas, agora é formar cidadãos –, declara o criador do projeto social Muay Favela, Luiz Tigrão, ao lembrar a motivação que o levou a dar início aos treinos de muay thai gratuitos aos meninos na Grota do Rafael, no Jacintinho.

Fabrício “Binho” e Rian Alves – de 20 e 16 anos, respectivamente – são irmãos. Os dois fazem parte do projeto Muay Favela. O caçula luta muay thai há dois anos, e o mais velho há apenas alguns meses. Ele foi incentivado a praticar a arte marcial pelo nobre motivo de acompanhar e apoiar o irmão mais novo nos treinos.

– O muay thai trouxe um bem estar para mim e [participar dos treinos] é um incentivo para o meu irmão. Estou aqui como um apoio para ele. Antes de eu praticar o muay thai eu já apoiava ele, mas agora estou achando melhor ainda que estou lutando com ele, treinando com ele. O Rian está melhor do que antes. Antes eu apoiava de casa, incentivava. Ele sempre foi bastante esforçado – conta o atleta.

Binho tem dois empregos, é montador de móveis e garçom em uma pizzaria. Na casa onde mora com sua família, só ele e o pai trabalham. Com essa rotina, ele consegue participar dos treinos apenas uma vez na semana. Binho, lá no fundo, também quer ser um lutador, mas na corda bamba da vida, ele tenta conciliar o apoio ao sustento da família com a vontade de realizar o objetivo do irmão.

– Sonhar a gente sonha, imagina, mas eu trabalho muito. A galera acredita muito em mim, eu também acredito, mas, às vezes, a gente tem que fazer uma escolha do que está mais perto. Eu tenho que trabalhar, não posso largar o meu emprego para me dedicar só a isso. Eu dou força e apoio ao Rian porque eu acredito nele enquanto ele está novo. Não que eu esteja velho, 20 anos também é pouco e eu também tenho muita coisa pela frente, mas eu acredito mais nele do que em mim. Eu quero que ele chegue lá. Minha motivação para continuar vindo, mesmo que seja só um dia na semana, é ele.

E apostar no irmão não é um tiro no escuro. Rian só tem 16 anos, mas já venceu as duas lutas que participou. Ele conheceu a arte marcial tailandesa através de um amigo, há dois anos, e agora pensa em se tornar um lutador profissional.

– Eu comecei a praticar jiu-jitsu e um amigo meu fazia muay thai. Ele me trouxe para cá no tempo de João [que treinava os meninos antes do Tigrão], e eu acabei ganhando uma bolsa. Eu era o único que não pagava, e o amigo que me trouxe pagava mensalidade. Depois eu ganhei uma bolsa na academia G1, lá eu treino boxe, faço musculação e funcional. Estou focando mais no muay thai, mas o que aparecer a gente luta. Estou preparado para tudo. Tenho duas lutas em novembro, uma de muay thai e uma de boxe. Eu treino todo dia e na quarta-feira eu pego dois treinos – disse o atleta, que encontrou no muay thai uma razão para se tornar uma pessoa melhor.

– O muay thai faz bem para o corpo, para a mente, dá força, equilíbrio e respeito um com o outro, tanto aqui quanto lá fora. Eu melhorei muito em casa, com meus pais, o esporte trouxe disciplina para mim. Eu estava indo por um caminho ruim, mas o muay thai me ajudou a me afastar.

Mas não é só de otimismo que se vive o esporte. Mesmo com toda a vontade de seguir uma carreira profissional, o atleta precisa lidar também com as dificuldades no momento de treino. Rian improvisa com luvas remendadas e os pés descalços debaixo do sol do meio-dia para não deixar morrer a esperança de ser lutador.

Além dos problemas estruturais e financeiros, os jovens que treinam com o professor Luiz Tigrão precisam superar a cada dia a violência que está ao redor, na rotina da comunidade.

– Se brigar, se se meter em confusão, não treina. Comigo, não. Eu bato sempre nessa tecla porque briga é briga e luta é luta. Eles já têm a violência neles. Muitos meninos aqui não estudam, às vezes não têm nem o que comer em casa. Eles já têm a agressão dentro deles, o que eu faço é canalizar essa agressão – explicou.

Acho que é um ciclo. Quando um deles sobe lá [no ringue], eu também subo.

Apesar de todas as dificuldades para realizar os treinos, o desempenho do jovem atleta fez despertar no professor a vontade de ajudar outros meninos a realizarem um objetivo que um dia também foi seu.

– Aos poucos eu estou parando de lutar, e o grande motivo de eu começar a vir para cá foi o Rian. Ele é muito esforçado, com um capricho, com vontade, aí quando eu bati o olho nele eu sabia que dava [para ele se tornar um profissional]. Eu vi nos olhos dele a vontade que eu tinha de lutar quando eu era mais novo. Acho que é um ciclo. Quando um deles sobe lá [no ringue], eu também subo. Então, não é só por mim, não é uma coisa só minha de querer lutar, eu compartilho o que eu sei e subo lá com eles. Isso é muito gratificante, saber que eu estou ajudando eles a realizar um sonho, assim como os meus professores me ajudaram – revelou.

Fonte Globo Esporte

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