Casos Clínicos: Ansiedade

Quando B.F.Skinner lançava uma proposta filosófica de homem, estava comprometido com a compreensão da humanidade considerando o comportamento humano, seja ele observável (comportamentos emitidos publicamente) ou privado (pensamentos, sonhos, desejos, etc., internos ao sujeito). Neste sentido, buscou compreender este fenômeno considerando a tríplice contingência como ferramenta para análise; com isso eventos que antecedem o comportamento são causas do mesmo e os eventos consequentes do comportamento podem torná-lo mais provável de acontecer ou não. Nos atendimentos que fazemos, o primeiro passo é fazer com que o sujeito analise seu comportamento considerando esses aspectos que estão implicados no ambiente em que o comportamento problema ocorre. Isso também é válido para comportamentos tidos como ansiosos, ou seja, comportamentos respondentes (sudorese, taquicardia, tensão muscular, tremor, etc.) também podem ser analisados considerando a influencia do meio ambiente sobre eles, pois toda ação do organismo deve ser compreendida como um comportamento. Basta estarmos com fome para salivarmos involuntariamente quando sentimos cheiro de comida. Salivar é um comportamento e deve ser analisado considerando os fatores que o influenciam.

Ao se aproximar o momento em que Isabel precisará expor em um grande evento da cidade seu projeto para construção de academia ao ar livre em praças públicas, ela sente o coração palpitar e as mãos soarem. Ao falar, percebe a voz trêmula e um incômodo na barriga. Esta situação pode ser considerada uma situação ansiogênica, onde o nosso organismo elicia respostas no sistema nervoso autônomo preparando o indivíduo para agir. Ou seja, todas estas sensações de desconforto nada mais são do que a preparação do organismo para que Isabel faça uma boa apresentação. É natural e foi selecionada ao longo de nossa evolução para lutarmos ou fugirmos de situações aversivas como esta em que Isabel está passando. A afirmativa “não consegui fazer uma boa apresentação porque estava ansiosa” não pode ser considerada neste caso como verdadeira porque o estado de ansiedade NÃO pode ser causa de comportamento. Queremos dizer com isso que sentimento não causa comportamento. Por outro lado, o mais correto seria afirmar que por não saber lidar com situações como esta, incluindo falta de treino e poucas situações semelhantes não desenvolveram no indivíduo comportamentos necessários para uma boa apresentação. E por isso Isabel não se deu muito bem. O estado de ansiedade apenas sinaliza que o indivíduo não sabe lidar com aquilo. Dessa forma a apresentação em público é um estímulo aversivo para Isabel, e a aproximação da hora, é estímulo pré-aversivo para nossa personagem.

Com isso, podemos diferenciar medo de ansiedade. O medo ocorrerá quando o estímulo aversivo estiver presente, e a ansiedade é um estado que será eliciado pelo organismo quando este sinaliza a presença de um futuro estímulo aversivo. Então na ansiedade os comportamentos sempre terão um movimento para o futuro e não para o presente. Pessoas que sentem ansiedade todos os dias, normalmente vivem em condições que sinalizam probabilidade de consequências aversivas no futuro. Este estado pode ser eliciado por vários estímulos: amigo se formando na faculdade enquanto o sujeito ainda nem começou a dele, presença de amigos que trabalham, enquanto o sujeito está meses desempregado, aproximação da data do vencimento do boleto pra pagar quando o sujeito não tem condições de arcar com as despesas, entre tantos outros exemplos. Veja que nesses exemplos, a situação aversiva sempre está voltada para o futuro, quando o sujeito percebe que vai se dar mal daqui a algum tempo. Conforme Crocomo (2014), “Em função dessas contingências de fuga/esquiva, alguns indivíduos passam a sofrer prejuízos acadêmicos, sociais ou profissionais como, por exemplo, deixar de ir à faculdade para não apresentar um trabalho em público ou deixar de ir à uma reunião importante por não saber se o chefe irá gostar de um determinado projeto que o indivíduo irá apresentar.

A ansiedade passará a ser um problema primeiro quando sua intensidade for extremamente prejudicial de modo que o indivíduo não tem controle sobre ela; sua frequência tornar-se constante e em intervalos de tempo curto considerando o contexto do sujeito e desde que tais estados de ansiedade prejudiquem as atividades rotineiras do indivíduo. O Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais, classifica os transtornos de ansiedade num espectro onde variam de acordo com o grau de intensidade da mesma iniciando pela ansiedade de separação até a ansiedade generalizada. Ainda conforme este manual (APA, 2013) “Os transtornos de ansiedade se diferenciam do medo ou da ansiedade adaptativos por serem excessivos ou persistirem além de períodos apropriados ao nível de desenvolvimento. Eles diferem do medo ou da ansiedade provisórios, com frequência induzidos por estresse, por serem persistentes (p. ex., em geral durando seis meses ou mais), embora o critério para a duração seja tido como um guia geral, com a possibilidade de algum grau de flexibilidade, sendo às vezes de duração mais curta em crianças (como no transtorno de ansiedade de separação e no mutismo seletivo).

Assim, o psicólogo comportamental estará implicado na análise dos estímulos ambientais que eliciam o estado de ansiedade do indivíduo para, assim, junto com ele trabalhar com ferramentas e técnicas eficazes para diminuir este estado, a medida em que o indivíduo começa a compreender o processo pelo qual passa e aprende a lidar melhor com ele.

Diego Marcos Vieira da Silva

Psicólogo comportamental (CRP15/4764), formado pela Universidade Federal de Alagoas, com formações em psicopatologia em análise do comportamento e técnicas de memória e oratória. Com capacitação para avaliação psicológica e experiência em casos de transtornos psicológicos tanto na clínica quanto em instituições de saúde mental

 

Referências:

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. DSM-5: manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 5. Ed. Porto Alegre: Artmed, 2014. 992p.

BANACO, Roberto Alves. Técnicas cognitivo-comportamentais e análise funcional. Laboratório de psicologia experimental Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Disponível em: < http://necpar.com.br/uploads/material/286tcc_e_analise_funcional.pdf>. Acesso em 28 de outubro de 2016.

BRITTO, A.G.S. Psicopatologia e análise do comportamento: algumas reflexões. Boletim Contexto ABPMC | Dezembro de 2012 | n. 37. (pgs. 55-69).

CROCOMO, E.F. Ansiedade: o que a mantém. 2014. Portal Comporte-se. Disponivel em: <http://www.comportese.com/2014/10/ansiedade-o-que-a-mantem>.

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