“Olhar do Sertão” de Martha Medeiros leva um dos maiores fotógrafos do Brasil à Piranhas
O Sertão tem muito mais que árvores secas e solos rachados. Lugar de mulheres fortes que vai mostrar ao mundo, o luxo brasileiro.
Foi pensando nisso que Martha Medeiros decidiu junto com o fotógrafo Bob Wolfenson, -um dos melhores do país- que Piranhas seria o cenário do novo catálogo e coleção “Os Sertões” assinada pela estilista alagoana.
Wolfenson desembarcou essa semana em terras alagoanas para realizar o trabalho.
Em seu Instagram, Wolfenson postou fotos ao lado da filha, Helena Wolfenson, nas proximidades da Usina Hidrelétrica de Angiquinhos, na margem alagoana da cachoeira de Paulo Afonso, onde realizou uma sessão de fotos da coleção.
Martha Medeiros aproveitou para postar também fotos em seu instagram. (Confira)
Rendeiras
Quando decidiu trabalhar com renda, Martha sabia dos desafios que tinha pela frente. “Fui atrás daquilo em que acreditava. Foi um trabalho árduo, mas consegui tirar a cara de toalha de mesa das peças, mostrei que existem outras possibilidades de trabalhar com a renda”, diz Martha. Para isso, ela lida diretamente com as cerca de 350 rendeiras espalhadas por várias comunidades localizadas à beira do rio São Francisco. “Não dou o peixe, mostro a elas como pescar. Quero deixar um legado para elas”.
Em São Sebastião, no agreste alagoano, Martha encontrou a renda de Bilro. Na Ilha do Ferro, povoado do município de Pão de Açúcar, à beira do São Francisco, ela encontrou a delicada e exclusiva renda Boa Noite. E por aí vai.
– No início, todas as minhas rendeiras tinham mais de 70 anos. Eu dedico muito empenho para que esse trabalho não acabe. Estamos batalhando para abrir escolas de renda na zona rural, na região do vale do rio São Francisco. Tem pessoas que me ajudam em todas as áreas, o contato com a rendeiras eu gosto de fazer pessoalmente. Eu faço mil quilômetros para ir e mil para voltar. Passo oito, 10 dias com elas. Saio do mapa.
Pelo menos uma vez por mês, a estilista deixa o apartamento onde mora, nos Jardins, em São Paulo, rumo a Maceió, sua terra natal. Quase não usufrui a confortável casa que construiu ali. Costuma seguir direto para Piranhas, a 280 quilômetros da capital.
Martha mantém uma relação muito próxima com as rendeiras da região através do Projeto Olhar do Sertão, do Instituto Martha Medeiros. Sua relação com elas é dividida em duas partes bem distintas: uma mercadológica, através do trabalho remunerado e a política de metas, que permite que superem seu ganho financeiro de acordo com a produtividade. A outra é assistencial, levando auxílio em diversas áreas como educação, saúde e independência financeira. “A gente é do tamanho daquilo que a gente compartilha, por isso, que hoje, o Olhar do Sertão, é o grande projeto da minha vida.
Martha Medeiros criou o Projeto Olhar do Sertão com o intuito de levar assistência social para uma das regiões mais pobres do nosso país, o sertão nordestino. Dessa maneira, o projeto reúne pessoas do bem e leva assistência a quem mais precisa. A primeira etapa do projeto aconteceu em setembro de 2014 e contou a com a expressiva ajuda da Artefacto, que contribuiu na arrecadação de fundos, por meio da venda de uma linha especial de almofadas, criadas especialmente para o projeto. Além da Artefacto, a Fundação Oftalmológica Dr. Rubem Cunha, comanda pelos doutores Marcelo e Rosana Cunha também contribuiu.
Martha Medeiros, a alagoana que se tornou sinônimo de luxo ao colocar em novo patamar as rendas brasileiras, não poderia estar mais feliz e tomada de esperança. Nos primeiros dias de outubro, ao lançar oficialmente seu projeto Olhar do Sertão, a estilista reencontrou seu passado e concretizou um sonho: transformar com ações inovadoras e eficientes o carente sertão brasileiro – uma região com a qual, diga-se, ela tem intimidade de sobra. E ledo engano daqueles que imaginam que sua relação intrínseca com estas comunidades se dá apenas por ser o Nordeste sua terra natal. “Comecei por necessidade, e porque sabia que não poderia fazer um bom trabalho somente com ajudas pontuais”, afirma Martha, com a fala acelerada que lhe é tão proficiente, sem perceber que o projeto nada mais é que uma evolução humanitária dos ideais que carrega de forma arraigada.
Para entender o que ela chama de “necessidade”, é preciso voltar no tempo, quando Martha começou a trocar experiências com rendeiras sobre a atividade manual que consiste na arte de entrelaçar linhas – atualmente são mais de 400 profissionais sob sua direção, muitas às margens do Rio São Francisco. O aprendizado sempre foi mútuo: a estilista mostrou a elas novos caminhos e as fez compreender que possuíam uma relíquia feita à mão. Já Martha foi algumas vezes surpreendida ao encontrar rendas únicas – ocasiões nas quais fez questão de resgatar os pontos e aprimorá-los, ciente de serem valiosas obras de arte. Com tamanha intimidade, não poderia ser diferente: se envolveu emocionalmente com cada uma de suas rendeiras e batalhou por uma melhor remuneração à classe.
“Já chamei caminhão-pipa para levar água e até contratei advogados para ajudar em problemas matrimoniais”, diverte-se Martha, que começava a se inquietar cada vez mais em busca de soluções que pudessem ser permanentes, e não apenas paliativas. Nada mais natural, portanto, que ela sentisse falta de realizar algo concreto, que pudesse ajudar na profissionalização de cada uma dessas comunidades e a expandir as expectativas de um povo que sofre mazelas impensáveis em outros estados mais abastados do Brasil e que vive, em contraponto, numa das áreas mais férteis em termos de cultura e artesanato.