Filho vê, filho faz

A psicologia analítico-comportamental se mostra baseada na filosofia do behaviorismo radical de B.F. Skinner e tem como princípios a compreensão do comportamento humano conforme sua história filogenética, ontogenética e sociogenética, dando ênfase a uma relação entre eventos ambientais que se chama tríplice contingência, ou seja, um evento sucede ao outro. Vejamos um exemplo: João é uma criança de 10 anos que apresenta comportamento de espernear-se quando quer algum objeto. Os pais de João, procurando evitar ao máximo a exposição pública, dá o objeto de desejo da criança e ela para de fazer birra no supermercado. Estes eventos que se sucedem são chamados de “contingentes”  e as chances do comportamento de birra voltar a ocorrer em ambientes semelhantes é muito alta, pois dessa forma ela “aprendeu” a conseguir o que quer. Em outras palavras tecnicamente chamamos de comportamento reforçado. Com este exemplo básico, podemos começar a compreender que nossos comportamentos acontecem porque estamos em um ambiente que favorece o aparecimento do mesmo. A aprendizagem acontece exatamente quando existe um leque de variáveis que proporcionem a mesma acontecer, mas quero chamar atenção para dois tipos de aprendizagem específicos: modelagem e modelação.

Quando fomos ensinados na alfabetização a conhecer as letras do alfabeto, e depois gradativamente aprendemos a formar sílabas e depois palavras, para só mais tarde formarmos frases estávamos praticando o que chamamos de ”modelagem”.  As pessoas podem aprender um infinito de coisas através da modelagem pois todos nós somos capazes de aprender, só necessitamos de um ambiente de aprendizagem adequado. Este ambiente não é só o físico e concreto, mas tudo aquilo que está relacionado ao comportamento. Em um outro exemplo, podemos citar a habilidade de uma costureira em fazer uma roupa em questão de minutos. Poucos de nós, paramos para pensar o quanto de tempo e aprendizagens simples foram necessárias para que ela tivesse a agilidade que tem atualmente. Manusear a agulha sem se machucar, manusear a tesoura, cortar o tecido na medida certa, dobra-lo conforme a roupa, sentar na máquina e ao mesmo tempo concentrar-se na costura e no movimento com o pé para a máquina funcionar; e nesse contratempo trocando linha e mexendo nos botões da máquina para fazer a melhor costura. A modelagem está presente em nossa aprendizagem desde muito antes de darmos os primeiros passos de vida (olhe ai mais um exemplo de modelagem: aprender a andar. Primeiro engatinhando, depois tentando se equilibrar nos primeiros passos); desde o balbuciar da criança. Quando o bebê começa a falar la-la, ta-ta, do-do, ca-ca, não é tão “valorizado”, quanto o “ma-ma”. Ao ouvir o “ma-ma” a mãe abraça este filho, dando-o grande carinho e chamando pessoas próximas para ouvir, imaginando que ele naturalmente aprendeu a reconhecê-la como mãe, quando na realidade a criança foi bastante abraçada quando pronunciou este som, aumentando as chances de continuar emitindo sempre que precisar ter ela por perto.

Um outro tipo de comportamento o qual chamo atenção neste texto é o da “Modelação”. Este tipo de aprendizagem pode ser sinônimo de imitação; ou seja, naturalmente temos tendência em imitar os comportamentos das pessoas (lembremos de nossos filhos e irmãos mais novos). Isto foi importante para nossa sobrevivência pois evoluímos imitando comportamentos que deram certo e enquanto cultura, a modelação se faz necessária para emitirmos comportamentos que evitem o conflito social.  Comumente vemos pessoas imitarem comportamentos assertivos por analisarem que aqueles fazem com que alcancem seus desejos. As “simpatias” para casamento são um sucesso e as mulheres brigam para fazerem da forma mais perfeita possível para não haver possibilidade de falha. Um servente de pedreiro, pode despertar a aprendizagem só em observar a atuação de um outro. Da mesma forma aprendemos diversas habilidades imitando o que o outro está fazendo. A aprendizagem por modelação é utilizada inclusive na clínica psicológica quando o psicoterapeuta apresenta um modelo de comportamento a ser seguido e automaticamente o cliente em atendimento passa a reproduzir aquele modelo nos ambientes necessários. Poderíamos citar vários outros exemplos, basta lembrarmos de nossas aprendizagens do dia a dia, mas e quando nos damos conta de que nossos filhos estão reproduzindo o mesmo padrão de comportamento indesejado que emitimos? O ditado popular “faça o que eu mando, não faça o que eu faço” acaba sendo inviável quando estamos o tempo todo apresentando um modelo de comportamento para nossos filhos, o qual não desejamos que seja emitido por eles. As crianças, assim como nós adultos, também tendem a imitar aquilo que os pais fazem e isso fica claro quando vemos filhos começarem a se interessar pela profissão dos pais, a se interessar pelos ambientes que os pais frequentam e gostar das mesmas coisas que eles. Isso fica claro também quando falam da mesma forma que os pais falam com eles, gesticulando e emitindo comportamentos que veem normalmente serem emitidos pelos pais.

Algumas considerações a respeito dos modelos que ensinamos aos nossos filhos, incluem inclusive os materiais auditivos, visuais e audiovisuais que permitimos o mesmo ter acesso. As coreografias musicais que reforçam a prática sexual, por exemplo, viram “febres do momento” e as pessoas imitam para dizer que conhecem a coreografia. Alguns pais não percebem problema em ver os filhos dançando e estimulando a prática sexual, por acharem natural e sem perceber acabam permitindo a imitação de outros comportamentos que eles acharem prazerosos, inclusive de usar drogas e tornarem-se  vulneráveis ao sexo sem compromisso, porque a música ensina isso e seus pais nunca o repreenderam quando imitavam aquilo que a letra da música dizia. Outro exemplo bastante comum é os pais assistirem com seus filhos filmes de ação que envolvem cenas de violência e morte como algo natural e sem prejuízos para quem o faz. Pouco tempo depois de ver o filme automaticamente as crianças imitam as mesmas cenas que acabaram de assistir e pior emitem estes comportamentos na brincadeira com outros coleguinhas; e estes são básicos exemplos frente a indústria midiática que temos atualmente que produz cada vez mais materiais que estimulam práticas nocivas numa sociedade. Vídeo games que envolvem luta, corrida e morte dos inimigos, são péssimos exemplos para uma criança desprovida de conceitos necessários para seu desenvolvimento saudável e os pais acabam tendo grande parcela de culpa na formação de jovens delinquentes e perigosos em nossa sociedade.

Antes de mostrar algo para seu filho, analise se o conteúdo é saudável para a mesma, levando consideração não apenas a idade, mas seu desenvolvimento intelectual para compreender o conteúdo da melhor forma. Claro que não tem como evitarmos todos os estímulos que podem influenciar na formação de nosso filho, mas devemos por obrigação que nos atentar aos estímulos pouco saudáveis que estão ao nosso alcance. Me refiro não apenas ao conteúdo de vídeos, músicas, livros e filmes, mas aos nossos próprios comportamentos emitidos na presença da criança. Os pais são uma espécie de espelho para seus filhos, então nessa relação deve haver modelos de comportamento que reforcem comportamentos produtivos para seus filhos, visando não apenas uma relação saudável para ambos, mas principalmente para o filho. Eduque-se antes de educar.

 

Diego Marcos Vieira da Silva

Psicólogo comportamental (CRP15/4764), formado pela Universidade Federal de Alagoas, com formações em psicopatologia em análise do comportamento e técnicas de memória e oratória. Com capacitação para avaliação psicológica e experiência em casos de transtornos psicológicos tanto na clínica quanto em instituições de saúde mental.

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