“Eu não tenho raiva, não tenho mágoa, não tenho rancor. Eu perdoo, com certeza”, declarou a juíza Tatiane Moreira Lima, de 38 anos, sobre o homem que há exatamente um ano invadiu o fórum onde ela trabalha no Butantã, Zona Oeste de São Paulo, a manteve refém por meia hora e ainda tentou queimá-la.
O agressor é o vendedor Alfredo José dos Santos, de 37 anos. Ele está preso desde então em Tremembé, interior do estado, à espera do seu julgamento. A juíza, no entanto, disse que não se sente segura se Alfredo vir a ser solto. “Eu tenho medo dele… Não dele ser solto, mas dele novamente tentar contra a minha vida.”
Desde que voltou ao trabalho em 4 de abril de 2016, a juíza tem se dedicado a difundir dentro do fórum um programa de recuperação de homens que agridem mulheres. Além de psicólogos, ele conta com a ajuda da assistente social Eiko Ita Hashizume.
No dia do ataque, 30 de março de 2016, Alfredo havia furado a segurança do prédio e jogado um ‘artefato incendiário’ em direção ao segurança Crispiniano Márcio Oliveira de Almeida, que atirou, mas não o atingiu. Em seguida, ele foi até ao local das audiências da vara e arremessou no chão uma garrafa com líquido inflamável.
Alfredo derrubou a juíza sobre o produto e também o derramou nele e nela, ameaçando atear fogo nos dois com um isqueiro. Ele achava, equivocadamente, que a magistrada havia tirado a guarda do filho dele e, por esse motivo, a obrigou a gravar um vídeo com o celular dizendo para o filho do invasor que o pai dele era inocente da agressão contra a ex, senão a mataria.
“Eu achei que iria morrer mesmo porque, assim… meu olho até saltava. Eu fiquei muito sem ar… O momento inicial em que ele chegou. E depois quando ele quebrou o vidro de combustível e pegou o isqueiro, ele falava ‘eu vou te matar’, ‘eu vim aqui pra matar ou morrer’”, recordou Tatiana, que concedeu entrevista à equipe de reportagem no mesmo gabinete onde ocorreu o crime.
Alfredo é acusado de tentar assassinar a juíza e um segurança, ao arremessar um artefato explosivo contra o mesmo, e ainda responde por cárcere privado por ter impedido Tatiane de sair da própria sala de audiência.
“Foi um ato de desespero porque era um pai que acha que perdeu um filho, mas ele se confundiu”, falou a magistrada sobre o fato de o processo da perda da guarda da criança estar com outra juíza. Tatiane cuidava de outro caso envolvendo Alfredo, com o qual tinha audiência naquele dia: uma agressão contra a ex-mulher pela Vara da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. “Eu sinto compaixão. Eu sinto compaixão no sentido de que ele se complicou demais”, disse Tatiane.
No dia 30 de março, quando o vendedor cometeu esse “ato de desespero”, nas palavras da própria juíza, ele tornou o caso conhecido. Além de ter filmado a vítima sendo ameaçada de morte e ofendida, Alfredo obrigou os policiais que negociavam a rendição dela a gravarem a cena. Seu objetivo é que as imagens chegassem ao menino que ele tem com a ex-companheira.
Os vídeos foram compartilhados com magistrados e acabaram vazando para a imprensa, que tomou conhecimento do caso e os divulgou. Eles mostram que Alfredo só foi detido pelos agentes num momento de distração. Depois os policiais libertam a juíza.
Procurada a defesa de Alfredo, que é feita pelos advogados Marcello Primo Muccio e Damilton Lima de Oliveira Filho informou que “não poderia comentar o processo porque ele corre em segredo de Justiça”. Alegou ainda que “a fase de processo está para apresentação de testemunhas para serem ouvidas em plenário e o próximo passo é marcar o julgamento”.
O julgamento, que deverá ocorrer em maio, será conduzido pelo juiz Adilson Paukoski Simoni, da 5ª Vara do Júri da Capital, no Fórum da Barra Funda. O promotor que irá sustentar a acusação contra Alfredo é Rogério Leão Zagallo.
Durante o interrogatório do réu, Alfredo havia dito que portava isqueiro “só para assustar” e que ele não tinha “qualquer propósito homicida”, que pretendia apenas chamar a atenção da mídia, “da televisão” com a intenção de “mostrar a verdade”
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