50 agricultores de baixa renda esperam por casa própria em Tanque d’Arca

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Redação e fotos:

CARLOS ALBERTO JR.

Especial para Estadão Alagoas

 

Criado pelo Governo Federal, o Programa Nacional de Habitação Rural (PNHR), já proporcionou a agricultores familiares brasileiros a realização do sonho de ter a casa própria. Gerenciada pela Caixa Econômica, a iniciativa alcançou o êxito em praticamente todo o Brasil. No entanto, na pequena cidade de Tanque d’Arca, no Agreste alagoano, o PNHR passa por entraves.

No município, com pouco mais de 6 mil habitantes, as 50 casas deveriam estar prontas desde o ano de 2013 pelo menos. E o que deveria ser um sonho realizado acabou por se transformar numa triste expectativa de quase três anos.

As casas são padronizadas, com dois quartos, sala, cozinha e banheiro. Porém, não ficam localizadas no mesmo espaço, como um conjunto convencional. No caso de Tanque d’Arca, estão distribuídas pelos povoados locais, em pelo menos 10 deles.

Algumas obras foram iniciadas ainda em 2013; outras ao longo dos anos seguintes, mas nenhuma foi concluída. A reportagem percorreu os povoados ao longo de uma semana e constatou as denúncias dos beneficiários. Em algumas localidades, as residências estão apenas com as paredes levantadas. Na maioria das casas, falta, por exemplo, instalar a eletricidade, concluir a ligação para fornecimento de água e a colocação dos forros.

O agricultor Genival dos Santos, é um dos cadastrados no PNHR em Tanque d’Arca. A sua futura casa está apenas com as paredes levantadas e rebocadas. “Não sei o que está acontecendo. As obras estão paradas há uns três meses e ninguém deu satisfação para gente”, disse. Em seu caso, a obra só foi iniciada ano passado.

No terreno onde ficará sua residência, localizado no Povoado Bonfim, também terá uma cisterna que está aberta e contribuindo para o acumulo de água e proliferação de doenças. Na parte interna da obra, fezes humanas completam a situação de caus. Na mesma rua, uma outra construção está na mesma situação.

Já no Povoado Chã Preta, a reportagem localizou as agricultoras Rafaela Rosa dos Santos, de 26 anos, e sua mãe Maria Rosa dos Santos de Souza, proprietária do terreno onde três casas estão construídas. Os imóveis, segundo as duas, estão prontos há cerca de dois anos. “Demorou três meses para construir, mas as três ficaram fechadas. Como aqui no terreno tem 3 casas, o pessoal da construtora deixou a chave com a gente”, revelou a agricultora Rafaela Rosa.

A situação de ocupações irregulares de imóveis foi verificada em outras residências em cinco, dos 10 povoados visitados pela equipe de reportagem. “Eu resolvi me mudar, porque não deixar a casa fechada, se acabando. Quando chove, molha tudo dentro. A água entra pelas portas e pelas janelas”.

O ex-presidente da Associação Água Viva, José Filho, que efetuou toda a negociação com a Caixa Econômica Federal em 2013, revelou que, até o mês de abril, as casas deverão ser entregues, incluindo aquelas que estão apenas com as paredes erguidas. De acordo com ele, a Caixa só entrega oficialmente as casas quando a última das 50 tiver suas obras finalizadas.

A Associação Água Viva é, para a Caixa, a Entidade Organizadora, que fica responsável pela indicação dos agricultores beneficiados pelo PNHR. Para José Filho, a única vantagem da associação foi “fazer com que cada um tenha sua moradia”, disse.

REPASSES EM DIA

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No regulamento do PNHR informado no site institucional da Caixa, para cada imóvel é repassado um subsídio de até R$ 28.500 para construção e de R$ 17.200 para conclusão, reforma ou ampliação de imóvel. Já no Programa Cisternas, o valor é de R$ 1.670 para Cisternas de Placas e de R$ 2.510 para Cisternas de Ferrocimento.

Em nota enviada à reportagem na última sexta-feira, dia 11, a Caixa informou que “no empreendimento Tanque d’Arca, 85% do total dos recursos de obra já foram repassados. Os repasses são realizados quando a Entidade demonstra a evolução das obras. Não há atraso de repasse para o empreendimento”.

Ainda na nota, a Caixa afirmou que “de acordo com as regras do Programa, as parcelas são pagas de modo antecipado na razão de 15%, sendo comprovada a aplicação dos recursos nas vistorias subsequentes. O prazo para execução do empreendimento, somado ao trabalho social, é de no máximo 18 meses, podendo, em casos excepcionais, ser ultrapassado, desde que seja devidamente justificado”.

No caso das casas de Tanque d’Arca, a Associação Água Viva está irregular com a Caixa e também junto aos beneficiários do PNHR devido justamente ao atraso na conclusão das obras.

OBRAS PARALISADAS

Com relação ao PNHR na cidade de Tanque d’Arca, a Caixa confirmou que as obras estão paralisadas. “A CAIXA aguarda manifestação da Entidade Organizadora  no prazo máximo de 10 dias para apresentar o novo cronograma visando a resolução da situação e definição de data para finalização das obras”, diz a nota.

Ainda de acordo com o atraso na entrega das casas, a Caixa informou, caso não haja manifestação no prazo previsto, a Associação Água Viva poderá ser objeto de comunicação ao Ministério Público Federal e/ou Polícia Federal, por conta da responsabilidade assumida no Termo de Cooperação e Parceria (TCP) firmado com a Caixa.

A Caixa confirmou também que, até o momento, nenhuma unidade habitacional em Tanque d’Arca foi entregue por falta do chamado ateste de finalização do banco, portanto não há autorização para ocupação das unidades habitacionais.

Sem detalhar esse assunto, o ex-presidente da Associação Água Viva, preferiu tratar sobre a ocupação dos imóveis, mostrando-se sensibilizado com a situação das famílias que precisam de moradia. “É ruim a gente ver as casas prontas e ninguém morando. A gente não pode tirar as pessoas de dentro”, disse, ao se referir às residências ocupadas irregularmente.

ONDE ESTÁ O DINHEIRO?

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Sem fins lucrativos, a Associação Água Viva ficou responsável pelo recebimento dos repasses referentes às obras de construção das 50 casas. Segundo o ex-presidente, a entidade presta contas à Caixa, por meio de notas fiscais dos serviços efetuados.

A Caixa esclareceu ainda que nas modalidades contratadas em Alagoas, o repasse é feito a uma Comissão de Representantes do Grupo de Beneficiários (CRE), composta por três pessoas, duas representantes dos beneficiários e uma representante da Entidade Organizadora. Para a conta da Associação Água Viva, são creditados apenas os subsídios referentes às atividades de Assistência Técnica e Trabalho Social, correspondente a R$ 1 mil por família beneficiária.

Para José Filho, a única vantagem da associação ao aderir ao Programa foi “fazer com que cada um tenha sua moradia”, disse. No entanto, ele não especificou sobre o montante recebido pela entidade desde 2013 quanto falta ser repassado pelo banco para finalização das construções.

Durante a conversa com a reportagem, ele acabou revelando que a Construtora Alternativa tem questões políticas com a Prefeitura de Tanque d’Arca. A partir da revelação dele, a equipe tentou localizar, em vão, a Construtora Alternativa, responsável pelas obras nas duas cidades. Pelo informado pelo próprio José Filho, a construtora ficaria instalada em Maceió e “teria mudado o número do telefone ou decretado falência”.

Pelas documentações encontradas pela reportagem, a Construtora Alternativa pertence a Érica Evangelista, esposa de um empresário conhecido na cidade apenas como Aparecido, que tem ligações pessoais e políticas com o prefeito cassado de Tanque d’Arca, Roney Valença. A mesma construtora, por sinal, era a responsável pelas obras envolvidas no desvio de recursos públicos naquele município que culminaram na cassação do então prefeito, o qual sempre negou participação acionária na empresa.

Na época em que as denúncias sobre os desvios nas obras custeados com recursos federais vieram à tona, a Construtora Alternativa foi envolvida diretamente no caso, já que ficou comprovado pelas investigações do Ministério Público Estadual que a Prefeitura efetuou repasses irregulares de pagamentos sem efetuar a medição e o chamado ateste das obras referentes à construção de uma quadra poliesportiva e uma creche.

O banco informou que “com relação à Construtora Alternativa, a Caixa ressalta que o regime de construção contratado foi Administração Direta, no qual a Entidade Organizadora [a Associação Água] é a responsável pela obra. A Caixa esclarece que providenciará notificação à Entidade solicitando esclarecimentos quanto à atuação da construtora”.

A Caixa Econômica Federal também informou na nota que 50 municípios do Estado de Alagoas foram beneficiados com o Programa Nacional de Habitação Rural, considerando as propostas em análise, os empreendimentos em andamento e os concluídos. E desses que estão em andamento, o único a ter problemas comprovados é o que está em andamento na cidade de Tanque d’Arca.

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