Por ano, mais de 12 mil meninas com menos de 14 anos engravidam

 

Segundo um estudo realizado por pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em parceria com o Ministério da Saúde, no período entre 2011 e 2021, foram identificados cerca de 110 mil partos de bebês nascidos vivos entre jovens de 10 a 14 anos, uma média de mais de 26 nascimentos por dia. Tais dados revelam a preocupante situação da gravidez de meninas menores de 14 anos no Brasil.

Do grupo analisado, 73,6% eram meninas pretas e pardas, 60,6% eram moradoras das regiões Norte e Nordeste, 20,7% informaram estar em união estável ou casadas e para 5% , os bebês não foram a primeira gestação.

O estudo foi realizado com uso de dados do Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (SINASC) e coordenado pela professora da Escola de Enfermagem da UFMG Deborah Carvalho Malta.  Ela destaca que a gravidez em meninas de 10 a 14 anos tem despertado preocupação no campo da saúde pública, devido aos riscos à gestante, bem como aos filhos. “Os dados sobre violência mostram um cenário alarmante de violação de direitos de meninas e mulheres, pois além de serem as maiores vítimas da violência sexual, elas ainda enfrentam o risco de uma gravidez indesejada e doenças sexualmente transmissíveis”, afirma a docente.

No Brasil, desde 2009, a lei considera a relação sexual com menores de 14 anos como estupro de vulnerável, independentemente da idade do parceiro ou do relacionamento estabelecido entre eles. Sobre o acesso aos serviços de saúde, a pesquisa revelou que 53,8% dos filhos de meninas de 10 a 14 anos e seis meses tiveram o cuidado pré-natal no primeiro trimestre; 45% teve 7 ou mais consultas e, em 38,7%, o tipo de parto foi cesariana. Os filhos de meninas na faixa etária estabelecida tiveram o maior percentual de nascimento prematuro (18,5%) e baixo peso ao nascer (14,6%), contra 11% e 9% das mães adultas, respectivamente.

Entre os dados, destaca-se o percentual de 6,3% sem escolarização. “A educação é reconhecida como fator de proteção para o casamento infantil e para a gravidez precoce. Para além, a educação sexual pode oferecer ferramentas e informações necessárias às adolescentes para o exercício responsável da sexualidade, assim como para reconhecer situações de abuso, ressaltou Deborah Malta.

Interrupção legal da gravidez

As informações coletadas pela pesquisa revelam o início tardio do cuidado pré-natal nas meninas de 10 a 14 anos, um indicador importante relacionado ao acesso aos serviços de saúde, bem como à ciência sobre a gravidez.

De acordo com a professora e coordenadora do estudo Deborah Carvalho Malta, o fato pode estar relacionado a situações de violência sexual em que o agressor é geralmente alguém próximo, como familiares, como acontece na maioria das ocorrências . Nestas situações, há dificuldade de acesso das meninas aos serviços de saúde, na tentativa de adiar ou mesmo ocultar a revelação do abuso sexual cometido.

No Brasil, a interrupção legal da gravidez é permitida em casos de gravidez decorrente de estupro. Atualmente, o Código Penal não traz limitações quanto à idade gestacional ou ao peso do feto, entretanto, dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde de 2019 mostram que apenas 290 estabelecimentos ofertavam serviço de aborto legal em todo o país, sendo que ⅓ destes serviços não realizaram nenhum procedimento no ano.

Além da barreira geográfica (pois muitas cidades e regiões não são contempladas) e de acesso aos serviços de aborto legal previsto em lei, a professora explica que a baixa ação dos serviços prestados por clínicas legalizadas se deve, também, ao desconhecimento dos serviços e da legislação, o medo da criminalização e a vergonha pelo estigma do procedimento.

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