PCC contrata pescadores para levar cocaína até navios em alto-mar
Interceptações telefônicas feitas pelo Ministério Público do Ceará (MPCE) mostram que membros do Primeiro Comando da Capital (PCC) dão ordens, de São Paulo, para que representantes da facção paulista na capital cearense contratem pescadores para transportar cocaína até navios em alto-mar.
O uso de barcos menores e mais precários tem como objetivo despistar o monitoramento das autoridades portuárias e conseguir despachar cargas milionárias da droga para a Europa por meio dos cargueiros. O MPCE já conseguiu flagrar um caso como esse e identificou mais ocorrências semelhantes, revelando essa nova tática.
Ao se aproximarem dos navios, segundo a investigação conduzida pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), os pescadores contratados pelo PCC entregam os pacotes de cocaína a mergulhadores da facção, que ficam encarregados de colocar a droga nos cascos da embarcação.
“Pegam essa droga em hotéis, que ficam ali na Beira Mar [avenida famosa de Fortaleza], e levam a carga para as embarcações. Os barcos são abastecidos e levados para determinados pontos [em alto-mar], onde a cocaína é colocada em navios e levada para a Europa”, explica um promotor do Gaeco, sob condição de anonimato.
Como já mostrou a reportagem, em abril deste ano, o Porto de Mucuripe, em Fortaleza, é um ponto estratégico para a maior facção do Brasil, usado como uma espécie de “plano B” no despacho de cocaína, por via marítima, para Europa e África. O tráfico internacional é a principal fonte de renda do PCC, rendendo bilhões por ano, conforme levantamento do Ministério Público de São Paulo (MPSP).
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Segundo o promotor de Justiça do Gaeco cearense, Fortaleza passou a ser a principal cidade nordestina e a “segunda mais importante” em todo o país para as atividades do PCC, atrás apenas de São Paulo, estado em que a facção foi fundada há mais de 30 anos dentro da cadeia.
A localização geográfica da costa cearense, aproximando as cargas ilícitas do continente europeu, aliada à expansão imobiliária e de investimentos na região, a torna “um ambiente propício” para a facção paulista operar o tráfico internacional de drogas e “lavar dinheiro”, segundo o promotor.
O tráfico internacional feito por meio do porto do Ceará, juntamente com o realizado pelo porto do Rio de Janeiro, rende ao PCC ao menos R$ 4 bilhões por ano.
Prisão de mergulhador do PCC
Em 5 fevereiro deste ano, câmeras de monitoramento registraram a movimentação suspeita de dois homens desembarcando de um carro, no bairro cearense de Praia do Futuro, e caminhando em direção à faixa de areia. Policiais militares foram acionados e conseguiram abordar um dos suspeitos, de 25 anos, que era de São Paulo.
Com o homem, os PMs encontraram três cilindros de mergulho, dois rolos de corda, a mesma quantidade de varas de pescar, uma máscara de mergulho, um par de nadadeiras, um celular e um carro. O suspeito foi levado para o 2º DP da capital para prestar esclarecimentos e acabou preso, acusado de prestar serviços ao PCC.
Em uma casa atribuída a ele, na cidade de Caucaia, Região Metropolitana de Fortaleza, os PMs prenderam uma mulher, de 47 anos, também de São Paulo, que fazia a guarda de 410 quilos de cocaína. A droga foi encontrada com a ajuda de cães farejadores.
No local também foram apreendidos mais dois cilindros de mergulho, cadernos de anotação, 13 cartões de crédito, além de um carro e um bote com motor, supostamente usado por mergulhadores contratados pelo PCC, para se aproximar de navios e fazer a colocação da droga nos cascos dos cargueiros.
Pesqueiro maior
Além das embarcações menores, atualmente identificadas pelo Gaeco do Ceará, uma ação da Polícia Federal (PF), em 2022, verificou o uso de pesqueiros maiores, utilizados pelo PCC também para transportar cocaína em alto-mar.
Em 20 de agosto, a PF encontrou 1,2 tonelada da droga em um barco desse tipo, que já navegava por águas internacionais. Seis pessoas foram presas na ocasião. A carca estava escondida sob toneladas de gelo, no porão do navio. A investigação apurou que o destino da cocaína seria a Europa.
O capitão e cinco tripulantes foram presos por tráfico internacional de drogas, associação para o tráfico e por integrar organização criminosa.
A abordagem foi feita juntamente com um navio patrulha da Marinha e resultou de um trabalho feito em cooperação com os departamentos de combate ao tráfico internacional de drogas dos Estados Unidos (DEA) e da Inglaterra (NCA).