Alagoana transforma experiências em conhecimento para ajudar albinos

 

Maria Verônica Soares Melo, alagoana de 40 anos, nascida em Monteirópolis, é uma mulher albina, alegre e comunicativa, que se dedica a ensinar sobre o albinismo. Casada e mãe de dois filhos — uma jovem de 20 anos e um rapaz de 16, que não são albinos, assim como seu companheiro —, Verônica já enfrentou muitas dificuldades devido à falta de informação sobre sua condição rara de pele.

Verônica nasceu às 3h30, sob a luz de um candeeiro, com a parteira sendo sua tia. Quarenta anos atrás, sem tecnologia, com pouca informação e sem a medicina moderna, o albinismo não era falado, muito menos conhecido. Ela relembra que sua tia, ao vê-la nascer, esfregou-a achando que estava com fuligem de candeeiro, descobrindo que Verônica era uma criança “diferente” quando o dia amanheceu. Verônica vem de uma família de seis irmãos, sendo ela a única albina.

Ela também conta que sua mãe morreu em 2007 sem saber da sua condição rara de pele, e que seu pai até hoje, com 74 anos, acredita que de alguma forma foi “castigado” na vida. “Vez ou outra, minha mãe dizia que se eu tivesse nascido em uma maternidade, não me quereria, acreditando que eu não seria sua filha”, relembra.

Verônica veio morar em Maceió aos 7 anos de idade e hoje reside no bairro do Canaã, com o marido e o filho mais novo. Determinada a transformar sua experiência em conhecimento para ajudar os outros, dedica-se especialmente a apoiar aqueles que têm albinismo. Isso porque, desde a infância, carrega uma bagagem de falta de informação sobre o albinismo e sequelas em seu corpo, devido à falta dos cuidados necessários.

“Os cuidados que uma criança albina deveria ter, eu nunca tive, porque meus pais não sabiam. Minha mãe faleceu sem saber que eu era uma pessoa com albinismo. Ela sabia apenas que eu não podia tomar sol, mas os cuidados que eu precisava, ela não conhecia”, compartilha.

“Eu sofri muito, porque minha mãe não sabia como cuidar de uma criança albina. Eu sofri muitas queimaduras de sol e minha pele ficou toda queimada. Para você ter uma ideia, minha mãe precisava passar um pano molhado por baixo de mim para poder me tirar da rede que eu dormia, senão minha pele grudava”, acrescenta.

Verônica frequenta médicos dermatologistas desde muito nova e recorda como eram os atendimentos no passado, lamentando a falta de profissionalismo e conhecimento sobre o albinismo.

“Os médicos me trancavam na sala com minha mãe e questionavam se ela quem me queimava por causa das bolhas na minha pele. Depois, mandavam minha mãe sair e me deixavam sozinha para ver se eu confessava que era ela quem me queimava, porque, incrivelmente, os médicos não entendiam sobre o albinismo. É triste, pois ainda hoje nascem muitas crianças albina e o tema é pouco abordado. Na minha infância, ninguém explicou à minha mãe sobre albinismo, que eu precisava de protetor solar e acompanhamento dermatológico”, relembra.

Na escola, Verônica também enfrentou obstáculos por causa de sua condição. Um dos pontos que o albinismo mais afeta é a visão, dificultando sua frequência às salas de aula. Aos 40 anos, está próxima de concluir o Ensino Médio, apesar de ter apenas 75% da visão. Ela sonha em ser sexóloga.

“Não estudei muito quando criança porque tinha muita dificuldade e não havia professores para me auxiliar. As crianças geralmente me tratavam normalmente, mas os adultos não. Alguns adultos me tratavam com indiferença; porém, hoje estou concluindo o Ensino Médio na escola do meu bairro. Hoje tenho uma auxiliar de sala, mas na infância não consegui concluir por causa dessas situações”, disse, lembrando também dos preconceitos enfrentados.

Verônica não trabalha, dedicando-se apenas aos estudos. Ela recorda que, na fase adulta, enfrentou preconceito ao procurar emprego e lembra uma situação específica: “Nunca consegui um emprego formal por causa do albinismo. Uma vez, surgiu uma oportunidade de cuidar de crianças e a mulher que ia me contratar veio até minha casa e disse na minha cara que não me queria porque eu era daquele jeito, e que o marido dela não gostaria se ela me contratasse. Ela não queria colocar o casamento em risco por minha causa, me deixando desesperada e abalada”, contou.

VISÃO AFETADA

Hoje, Verônica destaca que o que mais a incomoda, mas que já aceitou, é a baixa visão, que a impede de ter independência para trabalhar ou sair sozinha de casa. Quando sai, os óculos escuros são indispensáveis. “Eu dependo de alguém para me acompanhar porque não enxergo bem. Eu posso andar pelo meu bairro porque conheço bem, mas não consigo pegar um ônibus sozinha ou atravessar ruas; preciso de alguém ao meu lado”, explicou.

Quanto à pele, ela segue em tratamento contínuo, frequentemente precisando remover células cancerosas. “Devido ao albinismo, minha pele é muito clara e isso traz esses problemas de saúde”, explicou.

Verônica compartilha todas essas informações de sua vida quando convidada para palestras ou através de suas redes sociais (veronicamelo407), onde troca experiências com outras pessoas com albinismo e pais de crianças com essa condição de pele. Ela também participa de um grupo de apoio para pessoas com albinismo da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), recebendo mensalmente protetor solar e atendimento dermatológico e oftalmológico no Pam Salgadinho, através do Sistema Único de Saúde (SUS).

Ela destaca ainda um curso sobre albinismo na Universidade Federal de Alagoas (UFAL), importante tanto para o público em geral quanto para profissionais de saúde e educação, buscando aumentar a visibilidade do tema junto às secretarias municipal e estadual para pessoas com albinismo.

Foi procurada a SMS para informações sobre os serviços disponíveis para pessoas com albinismo em Maceió, sendo informada que devem procurar a Coordenação Geral de Atenção à Saúde da Pessoa com Deficiência na sede da SMS, levando documento de identificação, cartão SUS e comprovante de residência para inclusão na rede de assistência inicial. Após o cadastro, são encaminhadas para o Centro Especializado em Reabilitação (CER) do Pam Salgadinho, onde recebem acompanhamento dermatológico. Além disso, há uma parceria com a Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (Uncisal) para oferecer acompanhamento oftalmológico.

PROTETOR SOLAR PARA 221 ALBINOS

O Estado de Alagoas, através da Secretaria de Saúde (Sesau), informou que a Farmácia Judicial distribui mensalmente protetor solar para 221 pessoas com albinismo no Estado, de acordo com prescrição médica, e que há suporte através de consultas dermatológicas e oftalmológicas no Pam Salgadinho e no Centro Especializado de Reabilitação (CER) III da Uncisal, respectivamente.

A médica dermatologista Catarina Santos explica que o albinismo oculocutâneo é uma condição genética rara caracterizada pela ausência ou redução completa da produção de melanina, o pigmento responsável pela cor da pele. Existem atualmente sete tipos registrados de albinismo não sindrômico, além dos albinismos sindrômicos e o albinismo ocular.

Ela ressalta que, devido à sua origem genética, não há tratamento ou cura disponíveis até o momento para essa condição. A transmissão genética ocorre quando os pais carregam os genes do albinismo ou são eles próprios albinos. Se já tiveram um filho albino, há uma probabilidade de 25% de que o próximo filho nasça com albinismo, motivo pelo qual é aconselhável a consulta com um geneticista antes de engravidar.

Além disso, devido à deficiência de melanina, que protege a pele contra os danos da radiação ultravioleta, os indivíduos com albinismo são mais propensos a desenvolver câncer de pele e complicações oculares. Por isso, é fundamental realizar consultas regulares com dermatologistas e oftalmologistas, usar protetor solar, chapéus, roupas e óculos de proteção.

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