Em 3 anos, mortes ligadas à hipertensão têm alta de 47%, mostra estudo nacional

 

No período de três anos, as mortes associadas à hipertensão tiveram um salto de 47,67% no país, saindo de 26.560 óbitos, em 2019, para 39.220, em 2022.
O período coincide com a pandemia de Covid, quando o atendimento de muitos doentes crônicos foi descontinuado e houve alta de fatores de risco como sedentarismo, obesidade e consumo de álcool.
Os dados são do Observatório da Atenção Primária à Saúde, da Umane, associação sem fins lucrativos na área de saúde pública com base no SIM (Sistema de Informação sobre Mortalidade). Os números de 2023 ainda não estão fechados.

Um outro estudo da Fiocruz vai na mesma direção. Mesmo com a exclusão de óbitos por Covid, a média de mortes associadas à hipertensão e à diabetes ficou acima das taxas globais, em um comparativo de dados de mortalidade entre os anos de 2015 a 2019 e 2020 a 2022.

No geral, as taxas de mortalidade ajustadas foram, respectivamente, 24% e 9% mais elevadas em 2020 e 2021 em comparação com 2015 a 2019.
“A pandemia teve um impacto duradouro nas taxas de mortalidade por essas enfermidades, e os números analisados enfatizam a necessidade de atenção contínua à gestão e prevenção dessas doenças como parte das estratégias de saúde pública”, dizem os autores do artigo.

Segundo o médico Gustavo Gusso, especialista em saúde da família e comunidade e professor de clínica geral da USP (Universidade de São Paulo), a pandemia piorou várias condições de saúde e os impactos ainda persistem mesmo com o fim da emergência sanitária.

“As pessoas precisam voltar a se cuidar, a controlar a pressão, a fazer atividade física, a tomar vacinas. E ter um médico de referência para coordenar esses cuidados.”
Em uma perspectiva histórica e ajustado ao crescimento populacional, o aumento das mortes associadas à hipertensão é ainda mais expressivo, segundo o estudo da Umane. Em duas décadas, a taxa de mortalidade a cada 100 mil habitantes quase quadruplicou: saltou de 5,3, em 2000, para 19,3 em 2022.

Embora a hipertensão possa ter relação com fatores genéticos, o consumo de alimentos ricos em sal, o sedentarismo, o tabagismo e o consumo de álcool contribuem para os piores desfechos.
Nesta quarta (15), a OMS (Organização Mundial da Saúde) fez um alerta sobre o impacto da hipertensão nas doenças cardiovasculares, responsáveis por 40% das mortes na Europa, aconselhando os europeus a reduzir o consumo de sal.

“Implementar políticas específicas para reduzir o consumo de sal em 25% poderia salvar cerca de 900 mil vidas de doenças cardiovasculares até 2030”, diz Hans Kluge, diretor para a Europa da OMS.
Silenciosa, em geral assintomática, a pressão alta afeta ao menos 1 em cada 4 adultos brasileiros, e é um dos principais fatores de risco para doenças como infarto e AVC (Acidente Vascular Cerebral).
A doença é mais prevalente a partir dos 65 anos. Em 2022, 30.921 pessoas nesta faixa etária morreram de doenças associadas à pressão alta, o que representa 79% dos total de óbitos.
Para o cardiologista Audes Feitosa, do departamento de hipertensão da SBC (Sociedade Brasileira de Cardiologia), o envelhecimento populacional e os hábitos não saudáveis são os principais responsáveis por esse aumento da mortalidade.

“Na pandemia, o principal entrave foi o acesso aos serviços de saúde. As pessoas ficaram em isolamento, muitos serviços fecharam, houve piora do controle. Agora, voltamos aos desafios anteriores, o sedentarismo, a obesidade, o tabagismo, o consumo de excessivo de álcool, os alimentos ultraprocessados.”

De acordo com um levantamento da Impulso.gov, organização sem fins lucrativos que atua fomentando uso de dados e tecnologia na gestão pública, as mulheres são as que buscam um maior controle da hipertensão nas unidades de saúde, aferindo duas vezes mais a pressão arterial do que os homens.

Segundo a análise, em 2023, as mulheres fizeram 68% desses procedimentos na APS (atenção primária à saúde, totalizando 152.691.239 aferições. Já os homens foram responsáveis por 32% das aferições no mesmo período (70.381.966).

O cardiologista Audes Feitosa explica que, por questões históricas e culturais, os homens tendem a negligenciar a saúde e, em geral, não investem em prevenção. “Quando procuram o serviço de saúde, já estão com complicações em razão da doença não tratada.”

Para João Abreu, CEO da Impulso, é fundamental que o SUS utilize os dados que já possui para criar estratégias de prevenção que mitiguem essas disparidades de gênero.
Por exemplo, se em determinada região, os homens hipertensos não estão comparecendo à unidade de saúde para o controle habitual da pressão arterial, seria importante direcionar a busca ativa desses pacientes, com ajuda dos agentes de saúde da família.

Mas, para isso, é importante que as unidades de saúde saibam onde estão esses pacientes. “É uma população muito grande, o acompanhamento tem que ser feito com base em dados. Não pode ser só da cabeça do profissional [para lembrar os pacientes hipertensos]”, afirma.

Sete em cada dez municípios brasileiros terminaram 2023 sem atingir o mínimo de controle de seus hipertensos, que é aferir a pressão arterial a cada seis meses de 50% dos pacientes com essas condições, segundo dados do programa federal Previne Brasil.

Mesmo que municípios melhorem a busca ativa desses pacientes, o cardiologista Audes Feitosa lembra que fazer a prevenção de doenças crônicas assintomáticas não é uma tarefa fácil. “Elas têm difícil adesão, as pessoas abandonam o tratamento ao longo dos anos, associam eventuais sintomas ao uso do remédio e param”, explica.

O SUS (Sistema Único de Saúde) oferece gratuitamente medicamentos para controle da hipertensão nas Unidades Básicas de Saúde e pelo programa Farmácia Popular. A receita pode ser emitida tanto por um profissional da saúde pública quanto por um médico que atende em hospitais ou clínicas privadas.

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *