Aos 73 anos, palmeirense realiza sonho de se formar em Medicina

Com muita garra e superação, Luiz Antonio Albuquerque, 73, realizou o sonho de se graduar em medicina na Bolívia. Natural de Palmeira dos Índios, filho de Aluísio Guimarães de Albuquerque e Maria Luísa Marques de Albuquerque, de uma família de oito irmãos (uma falecida- Mercedes Marques), casado e pai de três filhos e netos, Luiz Antonio, surpreende por sua trajetória de vida. Após 50 anos, enfim, o sonho se concretizou.

Confira entrevista na íntegra:

EA: Com que idade o senhor descobriu que queria cursar medicina?

Luiz Antonio: A idéia de cursar medicina começou no curso ginasial estudado no Colégio Humberto Mendes, em Palmeira dos Indios. Na época eu já observava o trabalho humanitário do medico Remi Tenório Maia, uma das pessoas mais caridosas que já tinha visto. Foi sem dúvida nenhuma, a minha fonte de inspiração. Estudava pensando em medicina, pensando em ser um outro Remi, o que notadamente seria impossível. Terminando o curso cientifico veio o desespero; vestibular foram três e sem nenhum tipo de sucesso. Apesar de já trabalhar na Radio Sampaio, vieram dias de tristezas e boemias pelos bares da cidade.

EA: Por que reprovação em vestibular?

Luiz Antonio: Não foi por falta de estudar e muito pouco de dedicação. Na minha época o vestibular não era unificado. Você prestava exame para aquilo que você se propunha a ser. No meu caso, eu estudava para fazer exame para medicina. Recordo como se fosse hoje; o diretor do colégio era Padre Odilon. E, ao iniciar o curso cientifico, ele reunia todos os alunos no galpão do colégio e fazia os questionamentos em voz alta; Quem vai fazer medicina levante a mão! Quem vai fazer engenharia levante a mão! E assim eram formadas as turmas com os seus afins. No meu caso não tinha matemática, geografia e física. Só que após três anos, já matriculado no vestibular, entrou como ministro da educação Jarbas Passarinho. A primeira medida dele foi unificar o vestibular, no que resultou em não passar ninguém. Então, visto o ocorrido alguns colegas tinham condições financeira e procuraram rumos diferentes. Outros ficaram no estado tentando fazer vestibular em faculdade estadual. Lembro de Francisco Medeiros (sobrinho de Brivaldo) e Claudio, que trabalhava na Telasa, que preferiram a rota da Bolívia. Newton Jorge preferiu Portugal e um colega de Palmeira de Fora que optou pela Espanha. Eu, de família pobre, não tive opção nenhuma, salvo prometer a mim mesmo que um dia iria me realizar como pessoa. E estou aqui! A opção honrosa foi trabalhar. Como eu comecei minha vida profissional na Rádio Sampaio, segui o rumo da comunicação, enveredando pelo mundo afora trabalhando em Rádio e TV.

Depois de anos veio o casamento, filhos, netos e, com isto sentia que o sonho cada vez mais estava ficando distante. Depois de 43 anos de rádio e tevê, sou formado em jornalismo também, aposentei. Ai começaram a parecer doenças, depressão, inquietude e a sensação de que o mundo tinha acabado pra mim. Eu não conseguia ficar em casa deitado, não me agradava ficar nas pracinhas jogando dominó e, não nutria paixão por ficar “batendo palminhas” dentro de uma piscina em aulas de natação para a terceira ou quarta idade. Depois de uma graduação em psicanálise clínica, alguns cursos de medicina oriental e, muitos quilômetros rodados como motorista de Uber, resolvi vir para Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia, para me realizar como pessoa.

E.A: Quando inciou o estudos? Como conseguiu ingressar no curso e de onde surgiu a ideia de estudar na Bolívia, distante da família?

Luiz Antonio: Ingressar numa faculdade, não só na Bolívia, mas na Argentina, Paraguai, Uruguai, ou qualquer país do MERCOSUL é muito fácil. Primeiro, não existe vestibular. Você chega aqui com seu histórico escolar do Brasil sem que necessariamente tenha que ter uma média e procura, com toda sua documentação legalizada, a faculdade da sua preferência. Todas elas são eficientes e os cursos são extremamente baratos. Do ponto de vista teórico, medicina é igual a qualquer faculdade do Brasil, se diferenciando apenas na prática. Exatamente para qualificar mais ainda a minha prática, a partir de 02 de janeiro estarei iniciando o meu internato em um hospital na cidade de Mantena em Minas Gerais. As Universidades daqui da Bolívia têm convênios com alguns hospitais do Brasil para enviar alunos para o internato. Aliás, o hospital Santa Rita aí em Palmeira dos Índios deveria fazer esse tipo de convênio. Promove o hospital e a cidade, e oferece conhecimentos para brasileiros e estrangeiros que desejam ter um bom aprendizado. É um tipo de residência médica que tem duração de 9 meses. Acrescento ainda como informação que enquanto a mensalidade de uma faculdade de medicina no Brasil gira em torno de 12 a 15 mil reais, aqui na Bolívia custa aproximadamente R$ 1.300,00.

No nosso país está demonstrado que o estudo é privilégio de pessoas abonadas, ou muito bem apadrinhadas. Quando as universidades são públicas aí no Brasil, elas enveredam pelo sistema de Cotas e, não do conhecimento. Aqui, o governo financia o estudo para os nativos, e nos acolhe tão somente pelo preço de uma prestação de serviço humanitário por três meses, tão logo finde o internato rotatório. Uma modalidade de médico de província obrigatória, sem o que seu diploma não tem validade.

Sim; e ainda temos uma prova de grado (qualificação ) para que se receba o certificado de médico. Não é fácil como se imagina. A medicina aqui é levada muito a sério. Para complementar; um simples erro médico cometido, é o fim de sua carreira coma perca do diploma e uns bons anos de prisão. Basta que o familiar de um paciente abra um BO numa delegacia qualquer da cidade.

E.A: Como era a sua rotina de estudos e como ficou na pandemia?

Luiz Antonio: A pandemia prejudicou sensivelmente os cursos das áreas de saúde. Não tínhamos acesso aos hospitais para aulas práticas. Perdemos muitas vidas por aqui, onde se inclui vários dos nossos queridos doutores professores. No entanto, na teoria a rotina foi puxada. Tínhamos aulas pela manhã, algumas vezes a tarde e a noite, que você em que ter. Por tudo, e a exemplo de todos os lugares do mundo, a pandemia foi terrível! Tive sérios problemas por isso. Não podia sair nas ruas e, se saísse seria preso! Se não usasse máscara, e se fosse estrangeiro, corria o risco de ser deportado, e por ai foi. Na Bolívia, ou você cumpre a lei, ou você está fora.

E.A: O senhor atribui à quem a realização desse sonho?

Luiz Antonio: Em primeiro lugar devo a mim, né? (rs). À minha vontade, minha garra. Não é todo mundo que se atira nessa aventura não! A linguagem espanhol, a adaptação de moradia, clima, cultura, alimentação, preços e moedas… tudo isto no início complicou um pouco, mas nada que não se pudesse superar. Devo à minha esposa, que me compreendeu e me ajudou a realizar meu sonho. Fiz por vontade própria para mostrar aos meus filhos que o estudo é tudo. Para que os meus saudosos pais, estejam aonde estiverem, saibam que cumpri com a missão de retribui-los pelo esforço que fizeram em vida para educar oito filhos. Fiz por uma irmã (Mercedes) que faleceu por complicações de diabetes, antes que eu pudesse ajudá-la. Fiz para ajudar os miseráveis que não têm acesso à saúde. Fiz pelo olhar caridoso da minha Santa Dulce Dos Pobres.

E.A: Qual a mensagem que o senhor deixa para os jovens?

Luiz Antonio: Digo que observem o que fiz. A vida não acaba aos 40, 50, 60, 70, 80. Só Deus sabe. O que você prefere? Estudar ou morrer burro? Realizar seus sonhos, ou morrer frustrado? Prefere ser uma pessoa triste? Ou feliz e realizada? Então, o conselho que dou, é; levante a sua cabeça, saia de sua cama. Fuja do marasmo! Procure vida nova! Aqui tem gente de Arapiraca, tem gente de Quebrangulo, de Capela e outras cidades de Alagoas. Estou ciente de que ainda tenho obstáculos como médico. Por enquanto não posso clinicar no Brasil. Terei ainda uma prova de rivalida para poder obter o CRM. No entanto, se eu não obtiver sucesso nessa etapa e demais tentativas, serei médico cirurjano na Bolívia. Afinal, tenho visto de residência definitiva aqui no país e, por que não fazer caridade por aqui?

Como diz o Luva de Pedreiro: “RECEBA!”

 

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