Justiça decide que vítimas dos bairros afundados de Maceió terão caso julgado na Holanda
A Justiça da Holanda decidiu que as famílias que residiam nos bairros atingidos pelas rachaduras causadas pela atividade de mineração terão o caso julgado no país. Milhares de pessoas tiveram que deixar seus imóveis devido aos riscos à vida.
A decisão foi divulgada nessa quarta-feira (21), pelo escritório de advocacia global Pogust Goodhead e pelo escritório parceiro local Lemstra Van der Korst, que representam os moradores. A Corte holandesa confirmou a jurisdição do caso, o que garante que as vítimas serão ouvidas nos tribunais da Holanda, onde a mineradora Braskem S.A mantém subsidiárias.
O processo foi aberto após a maior empresa petroquímica do Brasil negar reparação adequada às vítimas. A Braskem ofereceu o que os advogados dizem ser quantias injustas de indenização depois de ser obrigada a remover famílias das zonas de perigo ‘vermelhas’ da área, mas não aceitou a responsabilidade.
Além disso, as ofertas de ‘danos morais’ da empresa têm sido feitas por núcleo familiar e não por pessoa, e equivalem ao valor de bagagem perdida por uma companhia aérea no Brasil ou menos, conforme jurisprudência dos tribunais brasileiros. Agora que o processo foi aceito para ser julgado na Holanda, o caso entra na fase de mérito, onde a responsabilidade é estabelecida.
Marc Krestin, sócio do Pogust Goodhead, disse que levar o caso aos tribunais holandeses é oferecer justiça às pessoas que moravam na região. “Eles perderam suas casas, sua comunidade e seu senso de identidade após essa grande empresa, que é a Braskem, tirar o que quis da terra e não pensar duas vezes no meio ambiente e nas pessoas ao seu redor. Estamos aqui para garantir que isso não continue acontecendo. Pedimos agora que a Braskem tome nota desta decisão, pare de negar a responsabilidade por suas ações e faça a coisa certa por todos aqueles que foram prejudicados”, afirmou Krestin.
O Pogust Goodhead representa os atingidos em Maceió em parceria com os escritórios de advocacia Neves Macieywski, Garcia e Advogados Associados, Omena Advocacia, Araújo e Máximo Advogados Associados e Lemstra Van der Korst.
A reportagem entrou em contato com a assessoria da Braskem e aguarda um posicionamento acerca do fato.
O caso
Em 2018, moradores da área assistiram horrorizados como suas comunidades foram atingidas por pequenos terremotos causados pela mineração subterrânea de sal por mais de quatro décadas. Muitos foram evacuados para escapar do desmoronamento de muros e edifícios, depois que as estruturas construídas em cima de uma terra agora insegura começaram a rachar. Alguns poucos moradores ainda permanecem no local, decididos a não aceitar as pequenas quantias oferecidas pela Braskem para realocação.
O êxodo e o desmoronamento de prédios são agora evidentes pelas imagens da cidade fantasma dos bairros que já abrigaram centenas de pequenos negócios. Em maio de 2022, vários autores compareceram à audiência em Roterdã, onde advogados do Pogust Goodhead argumentaram que é necessário litigar contra a Braskem nos tribunais da Holanda, onde a empresa mantém subsidiárias.
Maria Rosângela Ferreira Da Silva, 58, compareceu e disse ao tribunal que perdeu sua identidade quando o bairro desmoronou. Ela e sua família foram forçadas a se mudar, sua mãe faleceu pouco depois e, desde então, Maria Rosângela luta por justiça.
“A justiça foi feita. Graças a Deus, nessa quarta-feira, que é meu aniversário, eu acordei com essa notícia. Sou a mulher mais feliz do mundo, é meu melhor presente, depois de estar viva”, afirmou Maria Rosângela.
José Ricardo Batista, 57, e sua mulher foram realocados de sua comunidade e de casa. Ele acredita que seus direitos constitucionais previstos no artigo 6º foram violados. Ele diz que o desastre afetou “a perspectiva de futuro até para as próximas gerações”. “Para mim é motivo de felicidade saber que toda essa destruição que a Braskem causou a mim e minha família será julgada por um tribunal internacional. Agora, a esperança e a dignidade de nosso povo se tornaram uma realidade”, afirmou Batista.
Outros casos
O sucesso jurisdicional do caso Braskem em Maceió é o mais recente de uma série de processos do Pogust Goodhead, que recentemente ganhou um recurso para que o caso de 200.000 vítimas do pior desastre ambiental do Brasil, o desastre da barragem de Mariana, seja litigado nos tribunais do Reino Unido.
*Com assessoria e Gazeta web