Canal do Sertão tem bombas quebradas e trechos cheios de mato

A falta de política para aproveitamento social e econômico dos recursos hídricos é flagrante no maior manancial artificial do semiárido: o Canal do Sertão. O governo federal investiu [desde 1990] até agora mais de R$ 3 bilhões na construção de 120 quilômetros de canal previsto para ter 250 quilômetros, cortando as regiões áridas do Sertão e Agreste até chegar ao município de Arapiraca.

A obra se arrasta sem prazo de conclusão, é investigada pelo Tribunal de Contas da União, que suspeita de superfaturamento na construção do trecho cinco. Em vários pontos a marca do abandono é evidente com o mato invadindo a calha, como constatou recentemente a Gazeta de Alagoas e a TV Mar.

O canal faz a captação no braço do “velho Chico” que fica no vale do Moxotó, no município de Delmiro Gouveia. Das seis bombas de sucção da central de captação, cinco estão quebradas, revelou o deputado Inácio de Loiola (PDT), ao alertar que, se a sexta bomba quebrar, o canal vai secar, as paredes vão trincar, e tudo o que foi investido até agora será perdido. O deputado tem feito repetidos pronunciamentos no plenário do Legislativo cobrando política agrícola e agrária para o Sertão.

“Não tem sentido se manter a indústria do carro-pipa quando temos a região com o maior volume de água no semiárido nordestino. A gente precisa de uma política de Estado, perene, com efetivos projetos e assistência técnicos para o Sertão e o Agreste se transformarem em celeiros de produção de alimentos, da produção pecuária e de outras potencialidades da economia rural”, afirma o parlamentar, que é um profundo pesquisador e conhecedor da realidade do semiárido nordestino. No canal correm mais de 30 metros cúbicos por segundo da água retirada do rio São Francisco.

A obra já chegou até o município de São José da Tapera. O grande volume é subaproveitado em projetos “pífios” de irrigação, abastecimento humano e animal. Algumas áreas não deveriam estar sendo irrigadas aleatoriamente por causa da grande quantidade de sal no solo, alertam os técnicos e parlamentares da Comissão de Agricultura do Legislativo Estadual.

Há risco de transformar grandes áreas em terras improdutivas, por causa da irrigação sem assistência técnica, dizem os sindicatos rurais do Sertão. A maior obra hídrica em andamento no País foi retomada recentemente com recursos do Estado, que promete investir quase R$ 500 milhões em recursos próprios. O Ministério do Desenvolvimento Regional diz que só fará novos aportes financeiros depois que o governo Renan “destravar” pendências que estão em investigações nos órgãos de fiscalização e controle, entre eles o Tribunal de Contas da União, disse o ministro Rogério Marinho.

Mato avança sobre a estrutura do Canal do Sertão e ilustra o cenário de abandono do projeto pelo interior de Alagoas – Foto: Ailton Cruz

LICITAÇÃO

O governo de Alagoas publicou no Diário Oficial do Estado, em 17 de janeiro, o resultado da licitação do trecho V do Canal do Sertão. A Secretaria de Estado de Infraestrutura trabalha com a retomada das obras e orçamento de R$ 607 milhões. A licitação foi feita por meio de Regime Diferenciado de Contratação Integrada (RDCI) [Sistema que tem sido questionado pela maioria dos 100 pequenos e médios empreiteiros de Alagoas].

O formato de contratação permite a administração pública incluir projetos e obras em um único contrato e inviabiliza pequenas e médias empreiteiras de participarem dos certames licitatórios, por falta de capital empresarial. Conforme a superintendência de Projetos Especiais e Infraestrutura Hídrica da Seinfra, o RDC tem início a partir das apresentações dos preços das concorrentes, em que o menor deles é analisado, diferentemente das licitações tradicionais, quando são analisados as propostas priorizando a empresa que ofertou o menor valor e que deve atender às necessidades exigidas no edital.

A empresa vencedora apresentou investimento de R$ 429 milhões, 29% abaixo do orçamento.

Sem a presença do poder público, Canal do Sertão não tem potencial utilizado – Foto: FOTO: Ailton Cruz

TROCA DE SECRETÁRIOS PREJUDICOU PARCERIA COM PLANTADORES DE CANA

O setor canavieiro ainda é considerado como “motor” da economia rural. Nem por isso goza do prestígio e incentivos que teve no passado, reclamam a maioria dos 7,5 mil plantadores em 60% dos 102 municípios, que reclamaram a falta de sementes, de assistência técnica rural e incentivos prometidos à agricultura familiar.

Os líderes setoriais dos fornecedores lembraram que os plantadores ainda são os maiores geradores de empregos no campo e nas cidades porque movimentam a economia e geram mais de 100 mil empregos diretos, afirmam o Sindicato dos Usineiros e a Associação dos Plantadores. A economia estadual se alicerçava em torno das 24 usinas. Depois do fim dos incentivos e benefícios fiscais no setor e da crise econômica que provocou o fechamento de nove usinas, o setor passou por profunda modificação nas gestões de indústrias e das fazendas. A maioria se profissionalizou. Com isso, o setor buscou equilíbrio.

Os plantadores representam quase 40% da produção total da safra plantada. Com o fim subsídios, com equalização de preços praticados em estados vizinhos e outros benefícios cortados, produtores e usineiros foram obrigados a adequar a gestão dos negócios. Hoje, a maioria dos 7,5 mil fornecedores de cana sobrevive em situação idêntica à dos agricultores familiares, de outros setores produtivos que dependem de políticas efetivas da pasta de Agricultura.

Segundo o presidente da Associação dos Plantadores de Cana de Alagoas, Edgar Filho, cerca de 90% dos associados da Asplana produzem entre 500 e 600 toneladas de cana/ano. Isso transformado em faturamento, segundo Edgar, representa um salário mínimo por mês. “Então, a maioria dos nossos fornecedores hoje são agricultores familiares, sim”, admitiu.

Nesse sentido, Edgar filho reconhece que a parceria com a Secretaria de Estado da Agricultura é importante para a sobrevivência do setor. Desde 2015, a Asplana mostra ao governo estadual a realidade econômica dos fornecedores. Foi criada inclusive uma Câmara setorial para discutir os problemas do setor, o principal deles o débito dos usineiros com os fornecedores.

A Asplana fez com o governo Renan uma espécie de parceria para o setor receber também sementes, adubos e assistência técnica rural mas não não funcionou por causa das trocas constantes de secretários.Os plantadores, como a maioria dos agricultores familiares, passaram três anos sem receber sementes e assistência técnica da Seagri.

Apesar disso, no balanço que o presidente da Asplana fez da gestão Renan para o setor canavieiro, destacou como “positiva”, pois o governo conseguiu fazer a equalização do incentivo fiscal do ISS de Alagoas com Pernambuco. Antes, os produtores de Alagoas pagavam impostos mais altos que os do estado vizinho. A situação estava provocando fechamento de usinas e aumento da dívida com os fornecedores. A Câmara setorial ajudou nos acordos com as usinas, abatimento de impostos e ainda fornecedores e usineiros a encontram equilíbrio econômico.

Obra do Canal do Sertão de Alagoas é apontada com graves irregularidades – Foto: FOTO: Ascom

*Gazeta web

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