Governo de Alagoas deixou de investir mais de R$ 5,6 bilhões em saneamento

Apesar de a Companhia de Saneamento de Alagoas (Casal) ter apresentado superavit por seis anos seguidos, o governo Renan Filho (MDB) deixou de investir R$ 5,6 bilhões nos serviços de distribuição de água, coleta e tratamento de esgoto nos 102 municípios.

O resultado é o “fracasso” na política de saneamento do Estado, na contramão na universalização dos serviços, meta definida no Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab). O montante, se fosse aplicado, evitaria os leilões dos serviços da Casal entregues, via concessão, a três empresas privadas, num negócio de R$ 7 bilhões que vai ser explorado por 35 anos. O montante necessário para o saneamento foi identificado num estudo contratado pelo próprio governo ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Em geral, Alagoas tem pouco mais de 40% de saneamento básico e em Maceió não passa dos 70%. A situação da política de saneamento levou o banco a avalizar os leilões. Durante o processo de recuperação da Casal, só foram investidos R$ 50 milhões. Se continuasse nesse ritmo, seriam necessários mais de 100 anos para assegurar a universalização do saneamento do Estado, admite o próprio presidente da Casal, engenheiro Clécio Falcão.

Os deputados, consumidores e prefeitos, que não percebem melhorias no saneamento dos 13 municípios metropolitanos que tiveram os serviços de água e de esgoto leiloados para a empresa BRK no ano passado, estão preocupados com o futuro do saneamento.

Procon

O drama da falta de água na parte alta de Maceió, enfrentado há quase três meses por milhares de consumidores, repercutiu negativamente em todo o Estado, gerou uma audiência pública na Assembleia Legislativa e se transformou em centenas de queixas que foram parar no Procon de Alagoas, confirmou o presidente do órgão, Daniel Sampaio. “Estamos recebendo reclamações dos consumidores. Os processos administrativos estão em andamento. Estamos analisando a questão para definir as penalidades cabíveis”, revelou Sampaio.

Diante do volume de reclamação de falta d ‘água na maioria dos bairros, os técnicos do Procon têm feito reuniões com a BRK e cobram a solução dos problemas. Porém, o órgão não definiu, até agora, nenhum tipo de punição contra o governo de Alagoas que, através de leilões, entregou a concessão dos serviços da Casal e muito menos contra a empresa BRK, que prometeu melhorias nos serviços até o dia 23.

Um dos líderes comunitários dos bairros da parte alta da cidade, os mais prejudicados com as constantes interrupções no fornecimento de água potável, Tibério Guimarães, afirmou que as comunidades estão sem água há mais de dois meses. “As contas não param de chegar e sem abatimento. Essa privatização piorou o que já era ruim”, lamentou.

O presidente da BRK, Fernando Mangabeira, ao participar da audiência pública na Assembleia Legislativa na quarta-feira (15), confirmou a existência de diversos problemas no abastecimento de água e assegurou que há previsão de melhorias no abastecimento da cidade ainda este ano. Responsabilizou problemas no sistema Aviação, que, segundo ele, estarão resolvidos nos próximos dias com a regularização do fornecimento de água.

Após quase dois meses de desabastecimento em bairros da parte alta de Maceió, representantes da empresa BRK Ambiental, da Casal e da Agência Reguladora de Serviços Públicos de Alagoas (Arsal) foram ouvidos pela Comissão da Fiscalização e Controle da Assembleia Legislativa de Alagoas. Parlamentares pediram explicações sobre a situação. Durante a reunião, os deputados estipularam um prazo de até 23 dezembro para que o abastecimento na região seja regularizado. A BRK prevê que o sistema volte à normalidade até o dia 20 deste mês.

A reunião atendeu a um requerimento do deputado Cabo Bebeto (PTC). Estiveram presentes representantes das comunidades atingidas pela falta de água. “No dia 23 faremos uma visita técnica ao sistema que está sendo reformado para constatarmos se o problema da falta de água estará resolvido”,prometeu o deputado Silvio Camelo (PV), líder do na Assembleia.

O presidente da Casal, Clécio Falcão, afirmou que o rompimento da adutora Aviação é de responsabilidade da autarquia. A adutora abastece 5% da população da capital.

A Arsal já havia determinado, no início de dezembro, a suspensão dos pagamentos dos boletos gerados pela BRK Ambiental para a população afetada pelo problema. No último dia 3 de novembro, a Justiça determinou que a empresa restabelecesse o fornecimento de água potável para os bairros da parte alta de Maceió, o que não ocorreu. Na determinação, a Justiça aplicou multa de R$ 5 mil por dia de descumprimento.

O imbróglio envolvendo o desabastecimento na parte alta foi criticado também pelo Prefeito de Maceió, JHC, que usou as redes sociais para responsabilizar o governo do Estado.

Casal vai gerir obra física do Canal do Sertão

Agora é oficial. O presidente da Casal confirmou que o governo Renan Filho (MDB) vai transferir a gestão da obra física do Canal do Sertão para a autarquia. A notícia, que vazou nos bastidores políticos do palácio do governo, deixou a maioria dos deputados estaduais surpresos. “Como a Companhia falida e que não teve condições para gerir os serviços de distribuição de água e tratamento de esgoto terá capacidade de administrar a maior obra hídrica do País em andamento, e que já custou mais de R$ 3 bilhões do governo federal?”, questionam deputados como Inácio de Loiola (PDT), Davi Maia (DEM) e Cabo Bebeto (PTC).

Apesar das críticas também da bancada governista, o processo de transferência de gestão da obra já está em andamento e será analisado pelos 27 deputados estaduais. O presidente da Casal, Clécio Falcão, confirmou que o governador Renan quer passar a obra física e a gestão do Canal do Sertão para ser incorporada ao patrimônio da autarquia, como a Gazeta noticiou com exclusividade.

A gestão atualmente está com as secretarias de Estado de Infraestrutura, Planejamento, de Recursos Hídricos e Meio Ambiente e da Agricultura, sob a presidência do próprio governador. Nenhuma das pastas executou projetos relevantes de aproveitamento da obra física. A distribuição da água será entregue no próximo ano a uma das empresas que venceu o leilão dos blocos B e C.

A obra começou a ser executada em 1990 e já engoliu mais de R$ 3,5 bilhões. Dos 250 quilômetros previstos entre Delmiro Gouveia a Arapiraca, há 120 quilômetros concluídos e com água do Rio São Francisco captada [36 metros cúbicos por segundo] no vale do Moxotó. A construção está parada em São José da Tapera, os órgãos de fiscalização e controle investigam supostas denúncias de superfaturamento. A continuação do projeto depende de recursos federais.

O presidente da Casal não confirmou, porém, a intenção do governador de privatizar toda a estrutura do canal. “Receberemos a estrutura física para gerir. Se funcionar, não vejo motivo para privatizar”, ponderou. Clécio reconheceu, porém, que “os serviços de saneamento foram entregues para a iniciativa privada por incapacidade de manter o investimento”. Mesmo assim, acredita que a empresa conseguirá gerir o Canal do Sertão, o que até o momento cinco secretarias de Estado não conseguiram.

Privatização

Agora que a BRK e os consórcios Alagoas e o Mundaú ganharam o leilão da concessão dos serviços de distribuição de água tratada, coleta e tratamento de esgoto, mais de 80% do saneamento ficará privatizado por 35 anos. Esse negócio rendeu R$ 7 bilhões e, por determinação judicial, o montante tem que ser repassado aos municípios para investirem em obras de infraestrutura. O governo tentou ficar com os recursos para investir em seus projetos de fim de gestão.

Com relação aos problemas de saneamento enfrentados pelos 13 municípios metropolitanos desde o ano passado, Clécio Falcão defendeu a BRK. “Ainda é muito cedo para o consumidor obter a melhora dos serviços. A Casal reconhece que tem alguns problemas em Maceió. Por isso, a gente não pode jogar pedra na BRK”. Ele disse acreditar que, a partir do próximo ano, haverá melhoria no sistema de água e esgoto metropolitano.

O governo Renan, para justificar a entrega da concessão dos serviços de água e esgoto para empresas privadas, admite que a Casal não tem capacidade de investimentos necessários para alcançar a universalização definida pela lei 14.226 do Marco Referencial do Saneamento. A lei define o prazo de nove anos para garantir mais de 90% do saneamento das mais de 5,5 mil cidades brasileiras. A lei estabelece que em dezembro de 2033 haja universalização do fornecimento de água, da coleta e tratamento do esgoto.

Em Alagoas, os estudos contratados pelo governo ao Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES) apontam que seriam necessários R$ 5,6 bilhões para alcançar a universalização.

Leilões

O Consórcio Alagoas e o Consórcio Mundaú venceram o leilão dos serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário dos blocos regionais de saneamento de Alagoas, realizado nesta segunda-feira (13) na B3. As empresas vencedoras vão gerenciar os serviços no interior do Estado pelos próximos 35 anos.

Assume a concessão do Bloco B (Agreste e Sertão) o Consórcio Alagoas (Allonda Ambiental Saneamento e Conasa Infraestrutura), representado pela corretora Terra Investimentos, com lance de R $1,215 bilhão.

Já a concessão do Bloco C (Litoral e Zona da Mata) foi comprada pelo Consórcio Mundaú (CYMI Saneamento e Participações e Aviva Ambiental), representado pela corretora RJI, com lance de R $430 milhões.

As regiões que compõem os dois blocos têm 1,3 milhão de habitantes distribuídos em 61 municípios, que atualmente são atendidos pela Companhia de Saneamento de Alagoas (Casal) ou Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAEE).

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