Centrão tenta impedir reeleição de Maia e Alcolumbre: ‘coronelismo parlamentar’

Líderes do Centrão lançaram nesta terça-feira, 1, uma ofensiva para barrar a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal (STF) abrir caminho para a reeleição de Rodrigo Maia (DEM-RJ) à presidência da Câmara e Davi Alcolumbre (DEM-AP) ao comando do Senado. Intitulado “Carta à Nação Brasileira e ao Supremo Tribunal Federal”. Um documento preparado pelo Progressistas de Arthur Lira (AL), um dos pré-candidatos à eleição na Câmara, já tem o aval de onze partidos e esquenta a disputa. A carta não apenas é contra a recondução de Maia e Alcolumbre como chama qualquer iniciativa nesse sentido de “coronelismo parlamentar” e “casuísmo tacanho”.

Principal adversário do grupo comandado por Maia, Lira é o chefe do Centrão e tem hoje o apoio do presidente Jair Bolsonaro para a sucessão na Câmara. O Supremo Tribunal Federal começará a julgar, na próxima sexta-feira, 4, ação impetrada pelo PTB pedindo que a Corte impeça a reeleição de Maia e de Alcolumbre. Além disso, a sigla presidida por Roberto Jefferson e o Progressistas querem que o julgamento seja retirado do plenário virtual, já que ali os ministros ficam longe dos holofotes e não sofrem pressão da opinião pública. A eleição na Câmara e no Senado está marcada para 1.º de fevereiro de 2021.

Deputados do Centrão reunidos no plenário da Câmara em 2019 © Dida Sampaio / Estadão Deputados do Centrão reunidos no plenário da Câmara em 2019

“O sistema democrático e representativo brasileiro não comporta a ditadura ou o coronelismo parlamentar”, diz um trecho da carta, assinada por Progressistas, PL, PSD, Avante, Patriota, Solidariedade, PSC, PSB, Rede, Cidadania e Podemos. Ao destacar que a recondução para o comando da Câmara e do Senado, na eleição imediatamente subsequente, é proibida pela Constituição, o texto diz que esta é “a solução (…) mais adequada para se evitar a perenização e engessamento das posições de liderança no Congresso Nacional”.

Maia foi eleito três vezes presidente da Câmara e nega ser candidato, mas acredita ter o direito de concorrer, caso queira. Ele tenta construir um bloco de partidos, com cerca de 300 deputados – incluindo a esquerda – para apoiar um nome à sua sucessão. Seis parlamentares desse grupo integram a lista dos “cotados”: Aguinaldo Ribeiro (Progressistas-PB), Baleia Rossi (MDB-SP), Elmar Nascimento (DEM-BA), Luciano Bivar (PSL-PE), Marcelo Ramos (PP-AM) e Marcos Pereira (Republicanos-SP). No Senado, Alcolumbre trabalha abertamente por um novo mandato à frente da Casa, com respaldo do Palácio do Planalto.

Na noite de ontem, 14 senadores também divulgaram uma nota para criticar a estratégia em curso com o objetivo de reeleger Maia e Alcolumbre. Na lista dos signatários do documento estão senadores que apoiaram a candidatura de Alcolumbre em fevereiro do ano passado, no duelo contra Renan Calheiros (MDB-AL), como Tasso Jereissati (PSDB-CE), Álvaro Dias (Podemos-PR) e Major Olímpio (PSL-SP). Na ocasião, os dois últimos chegaram até mesmo a retirar seus nomes da disputa para ajudar Alcolumbre. Agora a situação se inverteu. No texto, os antigos aliados observam que não apenas a Constituição, mas também o regimento interno do Senado vedam a recondução para o mesmo cargo na mesma legislatura. “Tentar alterar por via judicial essa escolha política representa evidente subversão à separação dos poderes, verdadeiro atentado contra o estado democrático de direito”, diz o comunicado.

O julgamento está previsto para durar uma semana na plataforma online, com previsão de término em 11 de dezembro. Pode, ainda, ser interrompido por pedido de vista (mais tempo para análise) de qualquer ministro, o que alongaria o prazo para o veredito.

Mudança

O plenário virtual permite que os magistrados analisem casos sem reuniões presenciais ou mesmo por videoconferência, distantes das transmissões ao vivo da TV Justiça. Aliados de Lira querem levar o tema para o plenário “físico” da Corte, onde os ministros, sob pressão da opinião pública, poderiam acabar mudando os votos. A avaliação de integrantes do próprio STF é a de que o entendimento pró-reeleição tem mais chances de prosperar no plenário virtual.

“O que está em jogo neste julgamento é a reafirmação da construção histórica do constitucionalismo brasileiro baseado no postulado do republicanismo, da alternância do poder parlamentar e da proibição da perpetuação personalista e individualizada do controle administrativo e funcional das Casas Legislativas”, afirmam na carta os líderes do Centrão. “Um Congresso Nacional forte é aquele que respeita os ideais da temporalidade dos mandatos e do revezamento da direção das suas respectivas Casas. Mudar este curso histórico fere o princípio constitucional da vedação ao retrocesso democrático e se constituiu em um casuísmo tacanho que não combina com a tradição do Supremo Tribunal Federal (…)”.

Como informou o Estadão na semana passada, a tendência dos ministros do Supremo é decidir que a recondução dos presidentes da Câmara e do Senado não passa de um assunto interno do próprio Congresso. Trata-se da mesma posição defendida pela Advocacia-Geral da União (AGU) e pela Procuradoria-Geral da República (PGR), o que na prática, abre caminho para uma eventual reeleição de Maia e Alcolumbre.

Aliados de Lira também apostam em outra possibilidade: um dos ministros pedir destaque durante o julgamento no plenário virtual. Dessa forma, a discussão não apenas seria interrompida, mas teria de ser retomada em outro momento, não na plataforma digital, mas nas sessões transmitidas ao vivo pela TV Justiça.

Nesse cenário, caberia ao presidente do Supremo, Luiz Fux, marcar a data do julgamento. Em seu discurso de posse, porém, Fux deu todos os sinais de que não pretende intervir em questões politicamente delicadas que envolvem outros poderes. “Tanto quanto possível, os poderes Legislativo e Executivo devem resolver interna corporis seus próprios conflitos e arcar com as consequências políticas de suas próprias decisões”, disse Fux, em setembro.

Uma eventual suspensão do julgamento também poderia levar o relator da ação, Gilmar Mendes, a tomar uma decisão individual (monocrática), caso a análise do assunto não seja retomada antes das eleições de fevereiro.

O ministro Marco Aurélio Mello já se declarou contra a reeleição na Câmara e no Senado. “Onde estiver o processo, me pronunciarei, seja na sessão virtual, seja na sessão por videoconferência. De minha parte, jamais pedi destaque ou vista em sessão virtual”, afirmou Marco Aurélio ao Estadão. “Como bom carioca, só conhecia destaque de escola de samba. Ou seja, no carnaval. Agora, temos o destaque também na sessão virtual e, acredito, sem fantasia.”

 

 

Estadão

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