“O mundo vai se acabar em sexo”: é normal sentir tesão no apocalipse?

No meio de uma pandemia global de meses, colapso econômico, calamidade climática e turbulência civil como nada que vimos na vida antes, o mundo – ou pelo menos o mundo como conhecemos – parece estar acabando. E tem gente que tem tesão nisso.

“Assim como rir num enterro, transar durante o apocalipse parece um tabu, mas também algo incontrolável para algumas pessoas, sem nenhum problema nisso”, explica o psicoterapeuta Lucas Maia. Segundo ele, a quarentena do COVID-19 é um fator que agrava isso. “Com coabitação ou isolamento forçados, todo mundo está um pouco doido da cabeça”.

Porém, não é de hoje que as pessoas se excitam com o fim do mundo na pornografia. “Isso é algo muito humano, mesmo quando encaramos o apocalipse”, complementa. Historicamente, esse gênero está presente da pornografia há um pouco mais de tempo do que se imagina.

Em 1987, o filme The Load Warrior, uma paródia do Mad Max 2, traz um universo distópico em que os homens são como vacas, fornecendo a commoditie mais escassa e preciosa do mundo: sêmen. Em Satisfiers of Alpha Blue de 1981, pessoas de um futuro distante viajam para um planeta de prazer erótico para ter seus desejos satisfeitos por computadores.

Na categoria de pornô pós-apocalíptico, o vanguardista Café Flesh, de 1982, se passa num futuro pós-apocalipse nuclear onde todo mundo fica violentamente doente se faz sexo, e quem não fica é colocado num palco para fazer sexo ao vivo para o resto. Atualmente, nomes como Crescendo 2012, lançado em 2007, conta a história de pessoas que estão transando como se não houvesse amanhã (porque não vai ter mesmo).

Por que há atração no pornô do fim do mundo

“As pessoas estão sendo impactadas pelo estado do mundo no momento – e pode ser difícil lidar com toda a incerteza e turbulência”, disse Lucas. Ele explica que a vida sexual das pessoas, na maior parte, está sendo impactada negativamente em termos de frequência. “Para aqueles que continuam sexualmente ativos, eles tendem a ser mais abertos para experimentar e tentar atos sexuais diferentes. Isso pode oferecer uma distração do mundo ao redor, algo que faz as pessoas se sentirem bem, e a novidade pode ser útil.”

“Algumas pessoas buscam prazer, intimidade e conexão como uma distração de sua ansiedade, enquanto outras experimentam uma queda na libido por causa da ansiedade.”

Parte disso pode ser biológico. O especialista conta que quando as pessoas estão sob níveis mais altos de estresse– digamos, sendo bombardeadas por tragédias nas notícias todo dia, por desemprego, ou falta de intimidade no lockdown – o cérebro e o corpo buscam por todas as fontes possíveis de oxitocina e dopamina.

“As pessoas tendem a ser mais suscetíveis ao fenômeno de se apaixonar quando estão sob estresse intensificado, graças a uma mudança na química do cérebro e do corpo, como níveis amentados de cortisol e adrenalina”, reforça. Ele ressalta ainda que é normal haver um aumento e diminuição de frequência no sexo e desejo, dependendo de como a pessoa lida com a ansiedade.

É normal?

De acordo com a sexóloga Jane Cortes, “independente de como você está se sentindo no aparente fim do estado atual das coisas, esses sentimentos provavelmente são ‘ok’ e saudáveis, sexualmente falando”. Ela cita ainda que o desejo sexual é comandado por muitos fatores. “Por estresse, ansiedade, exaustão, incerteza, contexto do relacionamento e pressão social.”

A profissional destaca que o pornô pode ser um espelho da sociedade, mesmo filmes eróticos dos anos 1980. Se perguntar como o sexo vai se encaixar no futuro pode iluminar nossos desejos e valores no presente. “O pornô tem se mostrado um lugar interessante para ideias assim, porque por um lado, claro que o pornô vai lidar com um cenário relacionado a sexo, mas, por outro, muitas visões do sexo no futuro são estéreis, sem intimidade, ou expressas em algum tipo de economia ilegal”, disse.

Ela finaliza: “Acho esse tipo de filme pornô conflituoso particularmente interessante, e às vezes eles podem gerar níveis inesperados e surpreendentes de erotismos, mesmo sendo simultaneamente sombrios.”

 

 

Metrópoles

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