A questão é saber se chegaremos ao final da pandemia com vergonha ou com decência, diz Mario Sergio Cortella
Para o filósofo, escritor, palestrante e professor universitário Mario Sergio Cortella, o isolamento social tem trazido à tona memórias da juventude. No início dos anos 70, aos 18 anos de idade e em busca de uma experiência religiosa mais intensa, o então estudante de filosofia decidiu viver três anos enclausurado em um convento da Ordem dos Carmelitas Descalços.
Embora tenha decidido não seguir com a carreira religiosa ao descobrir-se apaixonado pela docência, afirma que a experiência reverbera até hoje, principalmente no recolhimento da pandemia. “Afora as quatro horas no período da manhã em que eu ficava na universidade de segunda a sábado, no restante do dia eu tinha companhia por umas duas horas apenas”, relembra.
Da janela de sua cela, como era chamado seu quarto no convento, via-se o pico do Jaraguá, recorda o professor e autor de best-sellers, que afirma jamais ter previsto que o aprendizado daqueles dias voltaria a ser tão útil em 2020, aos 66 anos.
Trabalhando em esquema de home office e na divulgação do livro A diversidade: Aprendendo a Ser Humano, em que aborda o preconceito racial, o escritor e a mulher, Cláudia, têm se revezado também nas tarefas domésticas, às quais o jovem Cortella se dedicava com afinco nos seus dias de convento.
“No convento todos nós tínhamos que trabalhar o tempo todo”, diz o professor, que era responsável pela criação de coelhos e pelo cultivo dos pinheiros na comunidade.
Lidando “sem sufoco” com o isolamento atual, sua maior preocupação no momento é justamente com o “fosso” existente entre as diferentes condições em que muitos brasileiros estão enfrentando a pandemia.
“Se nós não dermos conta, enquanto nação, do cuidado com aqueles que são mais vitimados pela ausência de recursos financeiros, de emprego decente, de alimentação, de uma moradia saudável, se nós não cuidarmos disso desde agora haverá um aprofundamento desses fossos”, alerta o acadêmico, que defende que um dos papéis da filosofia é iluminar o caminho sobre os perigos em tempos de angústia como o atual.
Adepto do “otimismo crítico”, como ele define, Cortella diz que a pandemia levanta questionamentos éticos a todos os brasileiros sobre como foi possível que a situação chegasse a tal ponto.
“A questão não é só eu chegar ao final desse túnel escuro que é a pandemia, e ali respirar aliviado porque eu o atravessei. É como é que eu chegarei? Se eu chegarei com decência, se eu chegarei com a ideia de que mereci mesmo atravessar e lá chegar, ou se chegarei envergonhado”, afirma.
“Para que eu não tenha nenhuma vergonha de deixar de fazer o que eu deveria ter feito, de ter esquecido que eu poderia ter feito, e mais do que tudo, aquilo que é parte de uma solidariedade que neste momento não pode de modo algum ser só retórica, ‘estamos juntos!’, ‘estou com você!’. Como é que é isso no cotidiano?”, questiona.
“O descuido vem da onde? Ele não vem só daquilo que se faz, mas também daquilo que não se faz. Vem também não só daquilo que se diz, mas daquilo que se omite. O descuido vem quando há ausência de compaixão, ausência de transparência, e nós podemos ter isso em várias nações e também na nossa encontramos isso.”
Cortella diz, no entanto, acreditar que prevalecerá a capacidade humana de reinventar novos modos de superação.
“Persiste em mim a possibilidade de imaginar algo que eu sempre lembro e que os nosso avós, bisavós, trisavós, diziam sempre: não há bem que sempre dure, nem mal que nunca se acabe.”
Leia os principais trechos da entrevista, concedida por meio de teleconferência:
Eu sei que o senhor é um otimista nato. Na quarentena o senhor continua otimista? Como tem sido esse isolamento para o senhor?
Mario Sergio Cortella – São dois momentos e dois movimentos que não são idênticos. Para mim não é tão complexo o isolamento, por várias razões. Primeiro, eu estou habituado a um trabalho, uma atividade que, embora em vários momentos seja em meio ao público, a palestras, a viagens, à convivência, a hotéis, cidades, etc, ainda assim, uma parte da minha atividade é mais quieta, na medida em que eu também escrevo, também faço atividades que me colocam em um certo silêncio.
Do ponto de vista material, das circunstâncias, eu não tenho e não tive até o momento nenhum obstáculo intransponível, em relação às minhas provisões, às minhas capacidades, minhas necessidades. Cláudia, com quem sou casado e eu, em todo esse tempo, partilhamos nossas tarefas e cada um de nós continua atuando, naquilo que é possível, pelo trabalho a partir de casa.
Há, no entanto, uma agonia muito grande na medida em que a gente, mesmo estando protegido, sabe o número de pessoas que, em uma atividade essencial, que não é o caso da minha, têm que se colocar em uma vulnerabilidade maior.
Por isso eu não passo por nenhum tipo de sufoco neste momento, exceto o sufoco interior relativo à preocupação com a vida em geral, com outras pessoa à minha volta, não só a família, o ciclo de amigos, mas todo o conjunto do modo da vida humana que sofreu ali uma alteração.
Mas como você lembrava, eu tenho sim um otimismo crítico, não é um otimismo ingênuo em que eu acho que tudo ficará bem, que basta nós aguardarmos e virá. Mas eu acho que nós humanos e humanas somos capazes, na nossa trajetória, na reinvenção de muitos modos de superação.
Esse [momento] é muito complexo, instigou a necessidade de maior humildade da nossa parte, especialmente quanto à nossa suposição equivocada de que éramos absolutamente invencíveis. Mas também nos gerou outros modos de contato e relação.
Por isso, persiste em mim a ideia da esperança ativa, persiste em mim a possibilidade de imaginar algo que eu sempre lembro e que os nosso avós, bisavós, trisavós, diziam sempre: não há bem que sempre dure, nem mal que nunca se acabe.
Eu não supus, aos 66 anos de idade que eu tenho, que eu encontraria essa condição. E fico imaginando o que dirão meus quatro netos daqui a 30, 40 anos, o que que eles viveram. O que que isso significou, qual foi o impacto na vida deles. Isto é, como é que será relatado o passado em um futuro daqui a algumas décadas.
O senhor, quando morava em Londrina, pertencia à ordem católica dos Carmelitas Descalços, onde o senhor viveu um período enclausurado.
Cortella – É, mas não foi em Londrina (PR). Eu nasci em Londrina, meus pais paulistas estavam ali no norte do Paraná. De lá saí para a cidade de São Paulo, onde moro até hoje, no final do ano de 1967.
E aqui eu estudei, terminei o que seria o antigo ginásio. E quando eu entrei na universidade, quando terminei o primeiro ano de filosofia, eu tinha 18 anos. Decidi que eu queria fazer uma experiência religiosa mais intensa.
A religiosidade é uma herança familiar, minha família tem uma tradição familiar católica, minha mãe — hoje com 91 anos de idade, e moramos perto, a um quarteirão e meio — tem formação católica.
Eu sempre tive a perspectiva de que poderia, na minha profissão, mais adiante, também ter a escolha da atividade da pregação, do trabalho missionário, que é algo que eu tinha desde Londrina, como uma condição mais direta.
E ao fazer 18 anos e entrar na universidade eu decidi que ia entrar em uma ordem religiosa na qual pudesse viver uma experiência de clausura, isto é, enquanto estava na universidade, que eu pudesse ficar fechado numa clausura aprendendo coisas, lidando com a vida, olhando mais para o chão e não apenas para o alto das coisas e, portanto, fiquei três anos em um convento da Ordem Carmelitana Descalça, na Rodovia Anhanguera, no km 18,5.
Da janela da minha “cela”, do meu quarto, dava para ver o pico do Jaraguá inteirinho. Não existe mais esse convento, aquele espaço do convento foi mais tarde vendido pela ordem, que foi para outro lugar, e até hoje ele abriga um complexo local de produção de notícia, de informação, de televisão, é sede de uma das TVs que nós temos no Brasil (nota do editor: são os estúdios do SBT).
Esses pinheiros, alguns que eu ajudei a plantar e que eram pequenas mudas, olha só, 45 anos depois, esses pinheiros hoje são árvores imensas. E quando eu vou à emissora de TV e passo pelo estacionamento eu olho os pinheiros dos dois lados, que eu ajudei a fazer.
Entendi que minha rota de vida não se daria naquela direção, que eu gostava mesmo da docência porque num convento e numa atividade missionária que acontecia nos intervalos da universidade, eu gostava muito de atividades de convivência em regiões distantes no Brasil. Estive na Amazônia algumas vezes, em comunidades de nações indígenas, e outras em comunidades mais distantes.
A minha curiosidade é: agora, nessa experiência de isolamento, isso despertou memórias do senhor dessa época? Tem aspectos que o senhor compara?
Cortella – Claro, em vários momentos. Porque em uma ordem religiosa, especialmente em uma ordem carmelitana, embora a gente não fique isolado de modo contínuo, existe um isolamento programático, isto é, momentos em que a solidão é necessária para a meditação, para a produção, para o estudo.
Digamos que, afora as quatro horas que eu passava na universidade toda manhã, no restante do dia eu tinha companhia por apenas duas horas. Também no restante eram momentos de quietude.
Até quando se ia para a capela, naquilo que se chama no mundo religioso católico das ordens de momento do ofício, se fazia ali um momento de silêncio, de reclusão. Por isso eu reavivei várias situações desse tipo — embora hoje eu não possa dizer que seja católico, porque seria ofensivo dizer que sou um praticante de uma religião dado que não frequento igrejas, não vou a cultos, etc —, a ideia da forma mais isolada de ser, o silêncio, dado que o convento ficava afastado da beirada da estrada, havia um silêncio imenso naquele lugar. E também daquilo que é o trabalho doméstico, digamos.
Durante boa parte da minha vida eu contei com auxílio de pessoas em relação a alimentação, roupa, faxina, limpeza, por conta de ter uma atividade externa. Mas no convento, não. No convento, todos nós tínhamos que trabalhar o tempo todo. Um dos lemas clássicos que o cristianismo coloca a partir de uma carta de um dos apóstolos que não conheceu Jesus, mas é o principal teólogo na origem cristã, que é Paulo, em uma das cartas de Paulo, ele diz: quem não trabalha não come.
E eu tinha duas atividades: afora ter que cuidar das minhas coisas, afora o fato de que nós não tínhamos propriedade privada no convento, isto é, tudo era comunitário. Até financeiramente. Se eu recebesse algum presente, algum dinheiro, alguma contribuição, era colocada em uma caixinha, literalmente, uma caixa de sapato. E ali, quem precisava pegava, e quem tinha, colocava.
Esse modo de vida comunitária foi facilitador, mas eu cuidava de duas coisas: a mim cabia cuidar de algo que hoje eu acho um pouco estranho, eu ajudava a cuidar de coelhos, que compunham parte da alimentação do convento.
E a segunda: eu cuidava dos pinheiros, isto é, da área imensa de pinheiros que se tinha, e como sabem muitas pessoas, ele pega fogo com facilidade. Porque ele tem uma resina. Então, para manter toda a parte de baixo sempre limpa.
Falando um pouco agora de outro aspecto da pandemia sobre o qual o senhor fala muito, que é a cidadania. Essa pandemia evidenciou que muitos brasileiros não têm esse direito à cidadania, a direitos básicos, e questões de desigualdade com as quais nós convivemos na sociedade viraram uma questão de vida ou morte. Como essa convivência de nós brasileiros com tantas pessoas sem cidadania nos afeta?
Cortella – Uma das questões mais sérias deste momento é nós trazermos à mente algumas perguntas decisivas, especialmente no campo ético. A pandemia evidenciou desigualdades, fissuras, fossos. Ela não os criou ainda, mas vai criá-los.
Se nós não dermos conta, enquanto nação, do cuidado com aqueles que são mais vitimados pela ausência de recursos financeiros, de emprego decente, de alimentação, de uma moradia saudável, se nós não cuidarmos disso desde agora, haverá um aprofundamento desses fossos. Esses fossos existiam, mas agora ganharam uma nitidez imensa. Eles estão à nossa volta como parte daquilo que no jornalismo se chama de pauta. Uma pauta cotidiana, que está à mostra.
Há duas atitudes possíveis: uma é fechar os olhos e imaginar que não está acontecendo, o que não só é tolo, como de nada adiantará em relação a levar a uma solução. A segunda forma é fazer-se uma pergunta que é: mas o que foi que eu fiz? Porque uma tendência nossa nessas situações é dizer: o que foi que eu fiz? Porque a resposta é fácil (…): eu não fiz nada para isso (pandemia) acontecer.
Mas a pergunta tem que ser outra: o que foi que eu não fiz? O que que eu deixei de fazer, eu Cortella, como uma pessoa que vive nesta nação, para que coisas como essas que agora estão sendo evidenciadas chegassem em um nível que ganham uma característica aterrorizante para quem nessa situação já está?
Segundo: se aquilo que eu deixei de fazer é algo que eu não posso refazer, porque aquele tempo não existe, o que eu posso fazer desde agora? É necessário que a gente olhe sempre com uma perspectiva: face aquilo que temos, ou a pessoa diz ‘o que eu posso fazer’, de modo entregue, desanimado, até acovardado e, eventualmente, cúmplice. Ou coloca um ponto de interrogação e diz ‘o que eu posso fazer?’ E sai em busca de uma resposta e vai buscá-la.
Será vergonhoso, e eu venho insistindo nesse tema, todas as vezes que alguém toca nesse assunto como você agora fez. A questão não é só eu chegar ao final desse túnel escuro que é a pandemia, e ali respirar aliviado porque eu o atravessei. É: como é que eu chegarei? Se eu chegarei com decência, se eu chegarei com a ideia de que mereci mesmo atravessar e lá chegar, ou se chegarei envergonhado.
É preciso também que eu me sinta mais respeitoso comigo e olhe tudo o que houve para que eu não tenha nenhuma vergonha de deixar de fazer o que eu deveria ter feito, de ter esquecido que eu poderia ter feito, e mais do que tudo, aquilo que é parte de uma solidariedade que neste momento não pode de modo algum ser só retórica, “estamos juntos!”, “estou com você!”. Como é que é isso no cotidiano?
Ora, nosso país passará por momentos mais difíceis do que estamos vivendo agora no ponto da capacidade de acesso a bens, a meios, ao provimento da vida. O mundo passará, mas nós também. (…) Por isso volto e concluo: O que foi que eu não fiz? E aí pensar no que eu devo fazer.
A pandemia, além de mexer com a nossa rotina, nos traz novos questionamentos éticos, sobre como convivemos com isso até agora. E quando se fala do poder público? Em muitos países, o governante teve esse papel de unir as pessoas, dar esse sentimento de nação. Aqui no Brasil nosso presidente tem sido mal avaliado na condução da pandemia e acusado de demonstrar pouca solidariedade. Isso pode ser considerada uma postura antiética neste momento?
Cortella – Duas coisas. Primeiro, Millôr Fernandes lembrava sempre, é verdade, que um povo que precisa de salvador não merece ser salvo. Afinal de contas, nós temos que negar o que em larga razão teve Lima Barreto quando disse que no Brasil nós não temos povo, nós temos público.
Há pouco menos de 100 anos, ele dizia, com toda razão, e porque é parte da nossa trajetória a postura de espectadores daquilo que está acontecendo à nossa volta. É algo que agrava a circunstância, mas não é uma fatalidade que nos leve a ficarmos sem ação.
Neste momento eu acho extremamente desconcertante o modo como a gestão do Executivo federal vem fazendo a condução daquilo que é a atual crise profunda que o país vive. Nós temos exemplos cotidianos de colisões internas.
Voltando ao teu ponto de partida: será que é antiético? Se a gente entender a ética como sendo o cuidado com a vida coletiva. Todas as vezes que há um descuido isso acaba se tornando antiético. E o descuido vem da onde? Ele não vem só daquilo que se faz, mas também daquilo que não se faz.
Vem não só daquilo que se diz, mas daquilo que se omite. O descuido vem quando há ausência de compaixão, ausência de transparência, e nós podemos ter isso em várias nações e também na nossa encontramos isso.
Aliás, uma das coisas que nos faz falta hoje são lideranças comprometidas com a preservação da integridade das vidas do país, de modo que não se resvale apenas para a disputa no campo da ideologia ou da política.
Há um clima de conflito entre os poderes, e se discute se há riscos para a democracia. Isso preocupa o senhor?
Cortella – Eu tenho um livro com o Renato Janine Ribeiro que eu gosto muito do título dele, do conteúdo também: Política para não ser idiota foi lançado há muitos anos e é um diálogo entre nós. E nós ali lembramos que a palavra idiota significava uma pessoa que ficava olhando só para o próprio umbigo, que não era capaz de tomar conta também da vida da comunidade. E político era aquele que ajudava a cuidar da comunidade.
Sendo eu um cidadão, eu não sou um político institucional, eu não sou um político partidarizado, não sou um político formalizado como atividade profissional. Mas eu sou um cidadão, por isso eu sou alguém que tem que se interessar pela vida da comunidade.
Eu nasci em 1954. A primeira vez que eu votei para a Presidência da República foi em 1989, 100 anos após a proclamação da República.
E eu já era alguém que estava como adulto, já era pai. Isso significa que essa castração de alguns dos mecanismos do cidadão em relação ao voto (ocorreu) durante um período. Havia um movimento de censura, havia uma atividade em que se tinha uma repressão a várias manifestações, e o nosso país ultrapassou essa fase.
Nosso tempo republicano não é tão extenso, ele tem 131 anos. Mas dentro dessa República, desde 1989, nós ainda temos um período muito restrito de democracia no sentido mais amplo.
Nós tivemos durante o período republicano governos em que o voto era censitário, em que se votava a partir do tanto de propriedade que se tinha. A proibição do voto ao analfabeto até 1988 na nossa Constituição tirou do circuito da possibilidade de escolha milhões e milhões de brasileiros.
Nossa democracia é muito recente. Pessoas com mais idade como eu entendem mais fortemente qual é o impacto que traz a ausência da democracia na possibilidade de liberdade de ação, de pensamento.
Quando nós temos hoje manifestações quase que cotidianas de algumas pessoas que se dizem avessas à democracia, embora na democracia se possa isso dizer, a grande diferença entre uma democracia e uma ditadura, que alguns reivindicam, é que em uma democracia eu posso reivindicar a ditadura, mas na ditadura eu não posso reivindicar a democracia. Essa é uma diferença decisiva.
Por outro lado, nós brasileiros temos, eu digo vez ou outra, um afeto um pouco mais limitado pela nossa democracia. A gente não a afaga com tanta tranquilidade.
Uma democracia é aquela que fez com que os conflitos sejam coordenados, para que a gente não chegue ao confronto. O fato de alguém pensar diferente de mim na política não significa que a pessoa esteja equivocada. Mas não é porque ela pensa como eu que só por isso ela está certa.
Nós podemos ter pensamentos diferentes, eles podem ser até divergentes, estão em campos separados, mas isso não coloca em mim o desejo de fazer com que essa pessoa seja enclausurada, detida, descartada, a menos que ela cometa algo que é considerado absolutamente criminoso, inconstitucional, uma brutalidade na nossa sociedade.
Por isso sim, é muito ruim nós já termos uma pandemia que é massiva e enquanto isso temos também que lidar com contínuas ameaças à nossa estabilidade democrática. Afinal, se alguém tem algum tipo de intenção em relação ao debate sobre a nossa democracia, esse não é o momento mais adequado.
Porque até quem defende a presença de uma ditadura, por exemplo, essa ditadura o que faria em relação à pandemia no nosso país? Ofereceria o quê? São as instituições democráticas que estão atrapalhando o combate ao vírus? O contrário.
Todas as vezes em que há um abalo nas instituições democráticas se retarda a condição de combate ao vírus.
Seria uma contribuição patriótica tão grande, não que a gente deixasse as nossas diferenças, porque elas estão abaixo ou acima de nós, mas que elas fossem colocadas lateralmente nesse momento para que a gente pudesse lidar com aquilo que é decisivo.
Fonte: BBC