O que LGBTs precisam fazer para oficializar o casamento homoafetivo

Com a eleição de Jair Bolsonaro para a Presidência da República, em 2018, centenas de casais LGBT decidiram antecipar o casamento por temer que tanto o direito à união estável quanto ao casamento civil entre pessoas do mesmo sexo,  garantidos pela Justiça desde 2011 e 2013 respectivamente, pudessem sofrer revés no Brasil.

Mesmo que não tivesse feito menção a esses assuntos em sua campanha, Bolsonaro já deu diversas declarações consideradas homofóbicas. Por isso, a decisão pelo casamento foi sendo recorrente entre esses casais desde a campanha do ano passado e se intensificou após a vitória dele.

Esse aumento nos casamentos foi comprovado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Dados apontam que, em 2018, 9.520 casais homoafetivos decidiram se unir formalmente no ano passado, o que representa um aumento de 61,7%. os registros tiveram um aumento expressivo nos últimos meses de 2018 e, sobretudo, em dezembro, somando 3.098 em um único mês.

Em 2013, Bolsonaro chegou a criticar a decisão do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) que obrigou os cartórios do País a realizar o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo. “Está bem claro na Constituição: a união familiar é [entre] um homem e uma mulher. Essas decisões só vêm solapar a unidade familiar, os valores familiares. Vai jogar tudo isso por terra”, disse à época.

Abaixo, entenda as regras que garantem o direito ao casamento homoafetivo e como realizar o tanto a união estável quanto o casamento em cartório:

1. Desde quando a união homoafetiva é permitida no Brasil?

No Brasil, a união civil entre pessoas do mesmo sexo foi reconhecido em 2011 pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

O tribunal decidiu, por unanimidade, que a união estável entre casais do mesmo sexo deve ser tratada como entidade familiar. Na prática, a decisão significou que as regras que valem para relações estáveis entre homens e mulheres deveriam ser aplicadas a casais homossexuais.

2. E o casamento?

A partir do entendimento de que as normas deveriam ser as mesmas, casais homoafetivos passaram a pedir também a conversão da união estável em casamento, como prevê o Código Civil.

Com a resistência dos cartórios em reconhecer esse direito e até mesmo o que foi explicitamente garantido pelo STF, o CNJ aprovou, em 2013, uma resolução determinando que todos realizassem, além do reconhecimento da união estável, o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.

Em 2017, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou, em turno suplementar, projeto de lei que altera o Código Civil para reconhecer a união estável entre pessoas do mesmo sexo e possibilitar a conversão dessa união em casamento.

3. O que reconhece o Código Civil?

Atualmente, o Código Civil reconhece como entidade familiar “a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.

O projeto aprovado em 2017 pela CCJ do Senado estabelece que a lei seja alterada para estabelecer como família “a união estável entre duas pessoas”. O projeto não foi a plenário até o momento e segue em tramitação.

Recentemente, o STF reconheceu por unanimidade que o conceito de entidade familiar não pode deixar de fora a união entre pessoas do mesmo sexo, ao julgar a constitucionalidade de uma lei do Distrito Federal. Isso significa que, perante ação do DF, a Corte entendeu que políticas públicas não podem excluir casais homoafetivos.

4. O casamento homoafetivo é garantido por lei?

O direito ao casamento igualitário no Brasil continua não sendo garantido por lei, apenas pela Justiça. Hoje no Brasil não há nenhuma lei federal que garanta direitos à comunidade LGBT.

“Enquanto não há legislação, existe um vácuo. Esse vácuo está sendo preenchido pela Justiça. Ela reconheceu as uniões, assegurou o direito ao casamento, o direito à alteração de nome e gênero, tudo dentro da omissão do Legislativo. Mas se vier alguma regra desse lado [da Presidência], ela se sobrepõe às decisões da Justiça”, explica a presidente da Comissão de Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Maria Berenice Dias, ao HuffPost Brasil.

5. Quanto custa para realizar o casamento?

Em São Paulo, a papelada sai a partir de R$ 400 tanto para o casamento quanto para a união estável. Uma opção sem custo é o casamento coletivo promovido pela Prefeitura de São Paulo.

“A proposta da cerimônia – realizada pela primeira vez em novembro de 2017 – é dar visibilidade a um direito já conquistado pela comunidade LGBTI, além de promover para esta população (historicamente posta à margem da sociedade) o exercício da cidadania plena”, diz comunicado da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania.

O procedimento é realizado de forma gratuita. Para se inscrever, é preciso comparecer a um Centro de Cidadania LGBTI com os seguintes documentos:

– Certidão de nascimento

– RG

– CPF

– Comprovante de residência

Veja os endereços dos Centro de Cidadania LGBTI em São Paulo

Em novembro de 2019, a prefeitura realizou a terceira edição do evento.

6. E no cartório?

Perante a lei, o casamento homoafetivo segue as mesmas regras de um casamento heterossexual. A orientação é que os pretendentes e duas testemunhas, maiores de 18 anos, compareçam ao Cartório de Registro Civil correspondente à sua região de 20 a 90 dias antes da data prevista para a cerimônia.

Os documentos necessários são:

– RG

– CPF

– Certidão de nascimento original

– As testemunhas devem ser alfabetizadas e levar o documento de identidade original e atualizado

– O procedimento e documentos para converter a união estável em casamento são os mesmos, porém em alguns locais a cerimônia não é realizada. O custo chega a R$ 405 reais.

7. O que Bolsonaro pode fazer contra o casamento gay?

A jurisprudência que garante o direito de casais homossexuais se casarem só poderia ser revertida caso o Congresso Nacional aprovasse uma lei proibindo o casamento entre pessoas do mesmo sexo, apontam especialista ouvidos pelo HuffPost Brasil. Em todas as hipóteses, casamentos já celebrados não seriam atingidos por uma mudança na regra.

Uma medida proibindo casais LGBTs de se casarem não poderia ser feita por decreto presidencial, mas o presidente pode, sim, encaminhar o projeto de lei ao Legislativo. Mas a lei seria facilmente questionada na Justiça, levando em conta as posturas do CNJ e do STF a favor dessas uniões.

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