Caso Marielle pode se tornar o 4º a ser federalizado desde 2004

A investigação do caso que envolve a morte da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes pode ser a quarta a ser federalizada no país. O assassinato aconteceu em março de 2018.

Nesta quarta-feira (6), o blog de Andréia Sadi informou que, segundo integrantes da cúpula da Procuradoria Geral da República (PGR), federalizar o caso será o “remédio processual” após a citação ao presidente Jair Bolsonaro.

Desde que a possibilidade de federalização foi inserida na Constituição, em 2004, três processos também envolvendo homicídios foram remetidos da esfera estadual para a federal (saiba quais e veja detalhes ao final desta reportagem).

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) deve julgar entre o fim de novembro e o começo de dezembro pedido da PGR, formulado pela ex-procuradora-geral Raquel Dodge, para tirar o caso de Marielle da Justiça Estadual (com atuação de Polícia Civil e Ministério Público Estadual) e enviar para a Justiça Federal (com atuação da Polícia Federal e do MP Federal).

Via de regra, crimes comuns, como homicídio, são de competência estadual – com exceção para os casos em que o suspeito tiver foro privilegiado em tribunais superiores, como STJ ou Supremo Tribunal Federal (STF).

A possibilidade de federalização foi inserida na Constituição em 2004 por meio da emenda 45, também conhecida como reforma do Judiciário.

O texto prevê que a PGR pode, em caso de “grave violação de direitos humanos”, pedir ao STJ a federalização de inquéritos ou processos criminais.

Pedidos de federalização

O primeiro pedido da PGR chegou ao STJ em 2005 – a Procuradoria queria federalizar as investigações sobre a morte da missionária Dorothy Stang.

O pedido foi negado porque o tribunal entendeu que as autoridades estaduais atuaram corretamente para esclarecer o crime.

Desde então, 24 pedidos – feitos por meio de um processo chamado Incidente de Deslocamento de Competência (IDC) – já chegaram ao STJ, entre os quais o de Marielle.

Dos 24 casos que chegaram ao STF:

  • 3 pedidos da PGR foram concedidos e casos foram federalizados;
  • 2 pedidos da PGR foram negados e casos seguiram na Justiça Estadual;
  • 7 pedidos da PGR estão pendentes de julgamento, entre eles o do caso Marielle.

Doze pedidos foram apresentados de maneira errônea, por cidadãos comuns ou empresas, e acabaram convertidos em outros processos, como conflito de competência, habeas corpus e outros recursos – a Constituição diz que só a PGR pode entrar com IDC para pedir federalização.

Os pedidos de federalização são sempre julgados na Terceira Seção do STJ, integrada pelos dez ministros da Corte que julgam temas penais.

Em condições normais, somente nove votam. O presidente comanda os trabalhos e só vota em caso de empate – se alguém faltar, por exemplo.

A relatora do pedido de federalização do caso Marielle é a ministra Laurita Vaz. Antes de levar a julgamento, a ministra ainda pedirá alegações finais aos envolvidos – Polícia, MP, Justiça.

Além disso, os ministros deverão julgar se a viúva de Marielle, a arquiteta Mônica Benício, poderá ser assistente de acusação, ou seja, atuar no processo.

No caso de Marielle, a PGR argumenta que o inquérito deve ser federalizado porque as autoridades estaduais do Rio não conseguiram apresentar até agora uma resposta sobre os mandantes do crime. O pedido de federalização foi um dos últimos atos de Raquel Dodge à frente da Procuradoria.

No STJ, a TV Globo apurou que há uma divisão entre os ministros sobre como proceder. Alguns consideram que federalizar prejudicaria a credibilidade de tudo o que foi feito no Rio de Janeiro.

E que, além disso, a Polícia Civil tem mais “expertise” para crimes comuns. Outros afirmam que o vazamento de informações envolvendo o presidente Jair Bolsonaro mostra que as autoridades estaduais não têm condição de manter o processo, e que a federalização pode acelerar a investigação.

Além de pedir a federalização, Raquel Dodge enviou ainda ao STJ denúncia contra cinco pessoas, entre elas o conselheiro afastado do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) Domingos Brazão. O grupo foi denunciado por tentar prejudicar as investigações da morte de Marielle e Anderson no Rio. Segundo Dodge, Domingos Brazão também é suspeito de ser mandante e deve ser investigado.

O ministro Raul Araújo foi escolhido relator da denúncia e do pedido de abertura de inquérito sobre os mandantes dos assassinatos. Ainda não há previsão de julgamento.

O STJ avalia enviar a acusação para a primeira instância por não ter relação com o mandato de conselheiro de Brazão. Se decidir enviar, e o caso de Marielle for federalizado, o processo sobre os mandantes vai para a Justiça Federal do Rio. Do contrário, pode seguir na Justiça estadual.

Casos federalizados

Saiba quais foram os outros três casos criminais já federalizados pelo STJ:

  • Assassinato de ex-vereador na Paraíba – PGR pediu federalização do processo sobre a morte do advogado Manoel Mattos, morto em janeiro de 2009 na praia de Acaú, em Pitimbú (PB). As investigações apontaram que o homicídio foi motivado pela atuação de Mattos, que integrava a comissão de direitos humanos da OAB-PE, contra grupos de extermínio que agiam na divisa de Paraíba e Pernambuco. O STJ reconheceu a incapacidade das autoridades locais de chegar a uma conclusão. Pedido feito em junho de 2009 e atendido em outubro de 2010. A Justiça Federal condenou acusados em 2015.
  • Morte de promotor de Pernambuco – PGR pediu o envio para a Justiça Federal da apuração sobre a morte do promotor estadual Thiago Faria Soares, morto em 2013. Havia indícios de que o assassinato resultou de ação de grupos de extermínio que agiam no interior do estado. A Terceira Seção do STJ considerou que a falta de entendimento entre a Polícia Civil e o Ministério Público estadual “ensejou um conjunto de falhas na investigação” e comprometeu a verificação dos mandantes. Pedido feito em maio de 2014 e atendido em outubro de 2014. A Justiça Federal condenou um homem como mandante do crime em 2016.
  • Grupos de extermínio em Goiás – PGR pediu federalização dos procedimentos administrativos ou judiciais de investigação, inquéritos policiais ou ações penais relacionados a violência policial e atuação de grupos de extermínio no Estado de Goiás desde 2000. O pedido foi feito em maio de 2013 e atendido em dezembro de 2014. Dez pessoas foram condenadas recentemente pela Justiça Federal, mas há diversos processos em andamento.

Fonte: G1

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