Vale omitiu problemas na barragem de Brumadinho antes de rompimento, diz ANM

Um documento da Agência Nacional de Mineração (ANM) aponta que a Vale registrou problemas na barragem B1, em Brumadinho, antes do rompimento mas não repassou as informações ao órgão que regula o setor.

O Jornal Hoje teve acesso, com exclusividade, ao documento que a ANM vai divulgar, na tarde desta terça-feira (5), sobre o rompimento da barragem em Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.

A tragédia tem 252 mortos identificados e outros 18 ainda desaparecidos ou não identificados. Os bombeiros de Minas Gerais trabalham há quase 300 dias seguidos, sem previsão para o fim das buscas.

O parecer técnico foi aprovado pela direção da agência e aponta que a mineradora Vale deixou de informar à ANM problemas encontrados em Brumadinho meses antes do rompimento. Este documento vai ser enviado ao Ministério Público Federal e às polícias Federal e Civil de Minas Gerais.

Os técnicos da ANM analisaram toda a documentação da barragem – incluindo o plano de segurança e o plano de ação emergencial. Dentro desses dois planos estão todos os dados de segurança da barragem.

Quase 8 meses antes da tragédia, no dia 6 de junho de 2018, a Vale fez uma inspeção de segurança na barragem e preencheu uma ficha com os resultados. De acordo com a ANM, a mineradora fez duas versões deste resultado.

Na versão entregue à ANM havia somente uma foto. Mostrava uma canaleta obstruída que servia para escoar água da chuva. Os fiscais dizem que o conserto de canaletas faz parte dos procedimentos de rotina e não afeta a segurança da barragem.

Mas uma outra foto que, segundo os fiscais, não foi enviada à ANM aparece nos registros internos da mineradora.

Esta imagem mostra sedimentos na saída de um dos drenos da barragem. A agência afirma que a Vale deveria ter enviado esta foto porque os sedimentos podem indicar um problema mais grave.

“Nós teríamos que ficar sabendo quase que em tempo real que estava ocorrendo isso, porque aí nós teríamos somado esforços aos esforços da empresa. A presença de sedimentos na água drenada, se não combatida, ela pode evoluir para uma situação que coloca em risco a estrutura do barramento”, disse Victor Bicca, diretor da ANM.

Piezômetros
O relatório também menciona os piezômetros, que são aparelhos que medem a pressão da água na barragem.
Segundo a ANM, a Vale informou que “nenhum dos instrumentos atingiu o nível de alerta ou emergência no período que antecedeu ao rompimento da estrutura”.
Mas, depois de analisar o bando de dados do plano de segurança da barragem, a agência afirma que é possível verificar que alguns instrumentos entraram em nível de alerta e/ou emergência sem que a ANM tenha sido informada.
Gráficos mostram os registros das medições desses instrumentos de agosto de 2018 até o rompimento. Para a ANM, os níveis registrados eram relevantes e deveriam ter sido reportados.
“As leituras dos piezômetros – e de forma bastante destacada o piezômetro 19 – sinalizaram que, no início de dezembro de 2018 até meados de janeiro, de que havia uma leitura que colocava aquele piezômetro em nível de emergência (…). Significa que tinha muita água na estrutura e que essa água precisava ser drenada, porque, em não sendo drenada, aumenta o risco de colapso, aumenta o risco de ruptura da estrutura”, explicou Victor Bicca.
Em 22 de janeiro deste ano, três dias antes do rompimento da barragem, a ANM afirma que a Vale fez uma vistoria na barragem.
E só no dia 15 de fevereiro, 24 dias depois e com a lama já derramada, preencheu as informações no sistema da agência dizendo que não foram atingidos os fatores mínimos de segurança.
“Não é admissível que se tivesse identificado anomalia no dia 22 e reportar só no dia 15 de fevereiro, porque a nossa regra é de que anomalias que ensejam risco à segurança do barramento, elas têm que ser reportadas imediatamente”, disse Bicca.
O que diz a Vale
O parecer da ANM vai ser apresentado em uma entrevista na tarde desta terça-feira (5), em Brasília. O Jornal Hoje pediu à Vale uma entrevista sobre o relatório, mas a empresa disse que não tinha porta-voz e enviou uma nota.
A Vale informou que não teve acesso à íntegra do relatório da Agência Nacional de Mineração e, assim, não tem como comentar as decisões técnicas tomadas pela equipe de geotécnicos à época.
A empresa disse que tinha uma equipe de geotécnicos composta por profissionais altamente experientes e de reconhecida capacitação para tratar de questões referentes à manutenção da barragem B1.
Segundo a Vale, todas as informações disponíveis sobre o histórico do estado de conservação da barragem foram fornecida às autoridades que apuram o caso.
A Vale reforçou que aguardará a conclusão pericial, técnica e científica sobre as causas da ruptura da barragem.
A mineradora também disse que, como maior interessada na apuração dos fatos, continuará colaborando plenamente com as investigações, prestando total apoio aos atingidos.
Fonte: G1

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