‘Sexóloga de Cristo’ diz que prazer carnal está previsto na Bíblia

Enquanto milhares de evangélicos espalhavam a palavra de Deus em estandes montados no imenso pavilhão do Anhembi, em São Paulo, um grupo de não mais de duas dezenas de pessoas, quase todas mulheres, acompanhava numa salinha uma mulher vestida de rosa choque ensinar que “nos tempos da Bíblia existia preliminar, beijo na boca, amasso, aconchego, acolhimento”.

Mais do que isso, que o sexo é uma atividade física criada por Deus e que, ao contrário do que defendem muitos pastores conservadores, não é apenas para fins reprodutivos. É também para o prazer.

A autora dessa pregação é a brasiliense Aryanne Marques, 33, uma espécie de sexóloga de Cristo.

Sua palestra “Sexualidade à Luz da Bíblia”, durante a Expo Cristã, no último dia 18, estava longe de ter lotação máxima (culpa, em parte, da sala afastada e de difícil localização que a organização arrumou para ela).

Não importa. Durante cerca de meia hora, Aryanne divertiu a plateia com sua inusitada mistura de aula de sexo com princípios bíblicos. E muitas piadas e referências à vagina como “preciosa”.

“Sexo é o vínculo afetivo mais precioso que Deus deixou na Bíblia para homem e mulher casados”, afirmou, enquanto projetava numa tela um diagrama do aparelho sexual feminino, com destaque para o clitóris.

“Em Cantares [de Salomão], a Bíblia fala: ‘que os teus lábios me cubram de beijos, pois teu amor é melhor que o vinho'”.

A plateia riu quando ela aconselhou as mulheres a “esquentarem” a vagina no banheiro antes do sexo. “Porque o homem já chega querendo colocar o carro na garagem, mas sem estímulo é igual a descer tobogã sem água. A gente queima os cotovelos tudo.”

Formada em sexologia clínica com especialização em teologia, Aryanne começou a se dedicar ao tema há cerca de dez anos. “Comecei a estudar sexualidade escondido da igreja”, diz ela, membro da igreja Comunidade das Nações, de Taguatinga (DF).

“Nos primeiros 4 ou 5 anos eu lia livros sobre sexo, fazia cursos, mas minha intenção era salvar o meu casamento, cuidar da minha sexualidade, que era mal resolvida”, afirma.

Hoje, tem no marido um parceiro que a defende dos muitos ataques que recebe em eventos de que participa e no canal que mantém no YouTube. “Já fui chamada de tudo, um pastor outro dia me disse que eu era uma pastora endemoniada do inferno”, afirma.

Para ela, é tudo resultado de uma cultura que considera o prazer carnal algo pecaminoso.

“O cristão criou uma cultura de que alimentar a carne é pecado, de que tudo tem que ser espiritual. Biblicamente a gente não encontra essa tese, pelo contrário. Eu poderia citar vários versículos que incentivam o prazer no sexo”, afirma.

Um destes trechos bíblicos, segundo Aryanne, é Eclesiastes 9:9, que diz: “Desfruta a vida com a mulher que amas, todos os dias da tua vida vã”.

Ela hoje vive de viajar pelo país dando palestras. Seu público preferencial são casais que querem resgatar o prazer sexual na relação matrimonial.

“Muitas pessoas, e em especial no público cristão, não têm a experiência orgástica. Homens sofrem de disfunções sexuais como ejaculação precoce e, por serem cristãos e religiosos, não buscam ajuda”, diz.

A única prática que ela não recomenda é a masturbação. “Respeito quem pratica, mas não recomendo. A Bíblia diz que o autoprazer gera pensamentos pecaminosos”, afirma.

Aryanne concilia a vida de palestrante com uma família de 6 filhos (3 do primeiro casamento do marido, 1 do primeiro matrimônio dela e 2 do casal). E diz que hoje se sente realizada no sexo, na igreja e na profissão.

“Sexo foi criado por Deus para a vida e o prazer. Senão, a mulher não teria clitóris”, afirma.

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