Após quase 50 anos, Sérgio Chapelin deixa de ser apresentador da Globo
Um longo e-mail chegou às caixas de entrada dos funcionários da rede Globo nesta sexta-feira (09/08/2019) trazendo novidades. Ali Kamel, diretor de jornalismo da emissora, divulgava diversas mudanças no programa e uma, em especial, deixou muita gente emocionada: Sérgio Chapelin não é mais um dos apresentadores globais.
Tendo chegado à Globo em 1972, ele se tornou, ao lado de Cid Moreira, o exemplo de como um âncora de um programa jornalístico deve se comportar. E Kamel não economizou elogios. “Conversar com Sérgio é sempre um prazer. Algo na natureza dele o faz ser o mesmo de quando começou na Globo, quase cinquenta atrás, um pioneiro: a vitalidade, a voz, a energia, o carisma são os mesmos (temperados pelos cabelos grisalhos)”, escreveu.
Porém, deixou claro que Chapelin não está saindo da Globo, somente do Globo Repórter, pois ficará marcado na história do canal. “Sérgio deixará o Globo Repórter no fim de setembro. Mas não deixará a Globo. Como Cid Moreira, continuará ligado à emissora que a ele é tão grata. Tenho certeza de que falo por todos nós, seus colegas, quando, em nome da TV Globo, agradeço seu trabalho magistral. Sérgio, muito, muito obrigado. Sua contribuição ao nosso jornalismo é imensurável”, completou.
Mudanças
Com a saída de Chapelin, Sandra Annenberg assumirá o semanal, ao lado de Glória Maria. Com isso, a vaga para âncora do Jornal Hoje ficará com Maju Coutinho. “Como substituir alguém como Sérgio Chapelin? Com duas das mais completas e consagradas jornalistas da televisão brasileira, Glória Maria e Sandra Annenberg. Conversei com elas e fiquei imensamente feliz ao perceber o entusiasmo delas diante do novo desafio, tanto Sandra como Glória. O Globo Repórter, eu sei, empolga todos nós jornalistas, porque é um programa vitorioso, de altíssimo nível”, escreveu Ali.
E, sobre Maju, acrescentou: “Agora, como titular da apresentação do Jornal Hoje, Maria Júlia Coutinho repetirá um caminho que Sandra Annenberg também trilhou, do mapa tempo para a bancada. E o público poderá acompanhar mais essa etapa de uma carreira solidamente construída e merecidamente aplaudida”.
Leia o e-mail completo:
Cinco anos atrás, Sérgio Chapelin me procurou. Era a época de renovação do contrato. Sempre gentilíssimo, ele me disse que acreditava que era hora de parar. Sérgio adora o que faz, tem uma relação de décadas com o público, com o jornalismo, mas queria mais tempo para a família, para aproveitar a vida sem tantas obrigações. Eu discordei, e o carinho dele pelo público e pelo jornalismo é de tal ordem, que ele acabou se convencendo a ficar mais cinco anos e a voltar a conversar sobre o assunto no futuro. Esse futuro chegou, ele me procurou algumas semanas atrás e a conversa se repetiu. Mesmo apaixonado pelo que faz, Sérgio ponderou que é parte da sabedoria encontrar o momento de desacelerar e aproveitar mais a vida, o tempo com a família.
Conversar com Sérgio é sempre um prazer. Algo na natureza dele o faz ser o mesmo de quando começou na Globo, quase cinquenta atrás, um pioneiro: a vitalidade, a voz, a energia, o carisma são os mesmos (temperados pelos cabelos grisalhos). Com anos de diferença, eu e ele temos uma origem profissional comum, a Rádio Jornal do Brasil, e essa coincidência me alegra. Quem o trouxe para a Globo foi Dirceu Rabelo, a “voz” da Globo ainda hoje. Dirceu o chamou para um teste em 1972. Ele veio em roupas esportivas, o cabelo longo e se pôs à prova diante de nossa querida Alice-Maria e do editor Silvio Júlio. Foi aprovado, mas teve de voltar no dia seguinte com uma orientação expressa de Alice: “Venha com terno e gravata porque o Armando Nogueira vai ver tudo”.
Armando adorou e Boni (José Bonifácio de Oliveira Sobrinho), também. Boni o queria logo no Jornal Nacional, mas Armando precisava dele no Jornal Hoje, para substituir Ronaldo Rosas. Sérgio dividiria a apresentação com Sônia Maria e com Márcia Mendes. “E também com dois comentaristas muito jovens, Nelson Motta e Scarlet Moon”, Sérgio me contou, sorrindo, mas logo lamentando a morte precoce de Marcia e Scarlet. Ficou no Hoje apenas um mês, porém. O sucesso foi tão grande que quando o saudoso Hilton Gomes deixou o Jornal Nacional, Sérgio foi o escalado para fazer dupla com Cid Moreira, e essa dupla marcaria para sempre a história da Globo. Sérgio participou também da estreia do Fantástico, em 1973, sem deixar o Jornal Nacional, e foi o primeiro apresentador do Globo Repórter. Eu disse a ele que isso era um feito, mas Sérgio, sem nunca abandonar seu jeito simples, me disse: “É um orgulho, claro, mas naquela época, eu apresentava o Jornal Nacional, o Fantástico e o Globo Repórter, não tinha moleza, mas era tudo um grande prazer”.
Em 1974, o grande Heron Domingues, que apresentava no fim da noite o Jornal Internacional, teve um enfarte fulminante que o matou tão cedo. Foi logo depois de divulgar aos brasileiros uma informação de repercussão mundial: a renúncia do presidente Nixon, o ápice do escândalo Watergate. Foi uma edição marcante. O satélite abriu antes do início discurso do presidente. Não estava no ar nas emissoras, somente em circuito fechado para quem tinha acesso ao sinal da Casa Branca. Nixon começou a brincar em frente à tela, fez caretas e sorriu. Armando Nogueira, com o jornal no ar, disse a Jorge Pontual, redator do telejornal, para usar as imagens e escrever um “boa Noite” com base nelas. Pontual correu para escrever a tempo o texto, que finalizava assim: “Como um ator antes da novela, como um político que fez sua carreira dominando a televisão e às vezes sendo vencido por ela, Richard Milhous Nixon se despediu do cargo mais visado da terra com um sorriso”. Pontual se agachou por debaixo da mesa de Heron e entregou o papel com o texto. E Heron leu a nota, com aquelas imagens exclusivas (Pontual viria a ser por muitos anos diretor do Globo Repórter e, hoje, é correspondente em Nova York). Era o dia nove de agosto de 1974, e, na noite seguinte, lá estava Sérgio substituindo o amigo morto na véspera. Ficou na função por nove meses, quando o Jornal Amanhã foi criado, com apresentação de Carlos Campbell e Marcia Mendes. Voltou para o Jornal Nacional, onde ficou até 1983, ao lado de Cid, apresentando também eventualmente o Fantástico, Globo Repórter e a primeira versão do Jornal da Globo.
Metrópoles