Toffoli atende a pedido de Flávio Bolsonaro e suspende inquéritos com dados do Coaf
A pedido do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), o presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, suspendeu os inquéritos que tramitam em todas as instâncias da Justiça que tenham partido de dados detalhados compartilhados por órgãos de controle, sem prévia autorização judicial. Um desses órgãos é o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).
A decisão beneficia Flávio, filho do presidente Jair Bolsonaro (PSL), e paralisa a investigação que está sendo realizada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro e que envolve o ex-assessor Fabrício Queiroz. A apuração começou com compartilhamento de informações do Coaf e só depois a Justiça fluminense autorizou a quebra de sigilo bancário.
A decisão de Toffoli é desta segunda-feira (15). A defesa de Flávio alegou ao Supremo que há, em discussão na corte, um tema de repercussão geral (que afeta o desfecho de todos os processos semelhantes no país) que trata justamente da possibilidade, ou não, de compartilhamento de dados por órgãos de controle sem prévia autorização judicial.
“O MPRJ [Ministério Público do Rio] utilizou-se do Coaf para criar ‘atalho’ e se furtar ao controle do Poder Judiciário. Sem autorização do Judiciário, foi realizada devassa, DE MAIS DE UMA DÉCADA, nas movimentações bancárias e financeiras do requerente [Flávio] em flagrante burla às regras constitucionais garantidoras do sigilo bancário e fiscal”, disse a defesa.
Para a defesa, todos os casos que têm essa controvérsia deveriam estar suspensos. Toffoli concordou com o argumento, sob a justificativa de evitar que, no futuro, quando o STF decidir a respeito, os processos venham a ser anulados. O debate sobre o tema está previsto para ser realizado no plenário em 21 de novembro.
Em outras oportunidades, Flávio já havia tentado anular a investigação referente a si, tanto no Supremo como na Justiça do Rio, mas teve os pedidos negados. Agora, a defesa do senador “pegou carona” em um processo que já tramitava na corte e que debate a questão do sigilo de modo mais amplo -apesar de também ter nascido de um recurso relativo a um caso concreto, de relatoria de Toffoli, que está em segredo de justiça no STF.
Trata-se do tema 990 da repercussão geral, que debate a “possibilidade de compartilhamento com o Ministério Público, para fins penais, dos dados bancários e fiscais do contribuinte, obtidos pela Receita Federal no legítimo exercício de seu dever de fiscalizar, sem autorização prévia do Poder Judiciário”.
“As razões trazidas ao processo pelo requerente [Flávio] agitam relevantes fundamentos, que chamam a atenção para situação que se repete nas demandas múltiplas que veiculam matéria atinente ao Tema 990 da Repercussão Geral, qual seja, as balizas objetivas que os órgãos administrativos de fiscalização e controle, como o Fisco, o Coaf e o Bacen [Banco Central], deverão observar ao transferir automaticamente para o Ministério Público, para fins penais, informações sobre movimentação bancária e fiscal dos contribuintes em geral, sem comprometer a higidez constitucional da intimidade e do sigilo de dados”, afirmou Toffoli na decisão.
Segundo o ministro, o plenário do STF já decidiu anteriormente que “o acesso às operações bancárias se limita à identificação dos titulares das operações e dos montantes globais mensalmente movimentados, ou seja, dados genéricos e cadastrais dos correntistas, vedada a inclusão de qualquer elemento que permita identificar sua origem ou a natureza dos gastos a partir deles efetuados”.
“De mais a mais, forte no poder geral de cautela, assinalo que essa decisão se estende aos inquéritos em trâmite no território nacional, que foram instaurados à míngua de supervisão do Poder Judiciário e de sua prévia autorização sobre os dados compartilhados pelos órgãos administrativos de fiscalização e controle que vão além da identificação dos titulares das operações bancárias e dos montantes globais”, escreveu Toffoli.
Não é possível calcular de imediato o impacto da decisão em termos de número de investigações que serão paralisadas, porque será preciso que as autoridades analisem caso a caso. Os relatórios do Coaf que embasam a investigação contra Flávio e Fabrício Queiroz, ex-assessor dele na Assembleia Legislativa, apresentam informações detalhadas de determinados tipos de movimentação financeira.
Em relação ao senador, o órgão federal detalhou hora e data de cada depósito de R$ 2.000 feito entre junho e julho de 2017. Foram no total 48 depósitos, somando R$ 96 mil. Em relação a Queiroz, o órgão também detalhou hora e data de saques e depósitos feitos em 2016. Este documento é, inclusive, a origem da investigação contra o filho do presidente.
A defesa do senador também alegou ao STF que o Coaf se comunicou diretamente com as instituições financeiras a fim de detalhar informações enviadas pelos bancos. A medida foi vista como um “atalho” à necessidade de autorização judicial para quebra de sigilo bancário.
A defesa de Fabrício Queiroz afirmou, em nota, que “vinha desde o início apontando uma série de irregularidades no curso da investigação e está decisão do STF só confirma os seus argumentos”. A 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro adiou o julgamento que faria nesta terça (16) do habeas corpus que trata do mesmo tema.
Os desembargadores devem expedir uma decisão confirmando se o caso de Flávio se encaixa ou não na decisão de Toffoli.