Em áudio analisado por perícia, homem confessa assassinato de jovem grávida em Penedo, AL: ‘Matei por besteira’

O desaparecimento da jovem grávida Roberta Dias, em 2012, ainda não foi solucionado, mas um novo elemento chama atenção novamente para o caso. A repertagem teve acesso a um laudo pericial produzido pela Polícia Federal de uma conversa gravada em áudio em quem um homem admite que ajudou o pai do filho de Roberta a assassiná-la. A Polícia Civil investiga o caso como homicídio, embora o corpo nunca tenha sido encontrado.

“Matei por uma bosta, por uma besteira”, diz Karlo Bruno Pereira Tavares na gravação transcrita pela perícia. Por telefone, ele conversa durante 43 minutos com um amigo sobre o homicídio e dá detalhes do motivo e de como tudo aconteceu (veja os principais trechos da transcrição abaixo).

Na conversa, Bruno conta que ajudou Saulo, ex-namorado de Roberta, a matá-la porque ela esperava um filho dele. Segundo ele, Saulo não queria a criança e temia a reação do pai quando soubesse da gravidez.

A mãe do Saulo, Mary Jane Araújo dos Santos, ficou presa 61 dias sob suspeita de ser a mandante, mas foi libertada com o fim do prazo da prisão temporária. Na conversa gravada, Bruno diz que ela não teve participação no crime e que mesmo assim, Saulo não confessou.

Além de Mary Jane, foram presos pelo crime dois policiais civis, como também duas pessoas identificadas apenas como “Dido Som” e “Neguinho do Pedro Melo”. Eles não são citados na conversa gravada.

A reportagem entrou em contato com o delegado Cícero Lima, que preside o inquérito, mas ele se negou a falar sobre a investigação. A Polícia Civil não informa sequer se os suspeitos presos anteriomente continuam sendo investigados ou se o homem citado na gravação foi incluído no inquérito.

O laudo foi entregue pela PF à Polícia Civil em 3 de outubro de 2017 e, mesmo assim, segundo moradores da cidade, Karlo Bruno jamais foi preso, e até então era visto andando livremente pela cidade.

Veja abaixo os principais trechos da transcrição feita pela perícia:

“A gente foi lá né, aí pegamos uma enxada. Uma enxada do cabo até pequeno, assim, que cabe na mala. Uma enxada e uma pá. E a extinção de som, que já era né a arma. E eu já saí daquela casa, ele botou o carro, o golzinho de ré, ali, e eu já saí dali na mala”, contou Bruno.

Bruno continua. “Sim. Botei a tampa original em cima da mala. Já tinha combinado com ele. Quando eu vir você ,para, para eu saber, sentir o carro parado, é a hora, deixe comigo”, relatou.

“Eu disse para ele, quando você parar, deixa comigo. Ele disse, Bruninho paro onde mais ou menos? Bicho, tem que ser em um canto longe. Eu disse, eu vou para aquele canto ali, que quero entrar ali na Santa Amélia. Para ir pra Santa Amélia, para a piscina”, disse Bruno.

“Sim, eu disse, pronto está certo, foi buscar ela, e eu, na mala. E ela entrou, não sei o quê, conversando safadeza, aquela peste toda”, completou.

Nesse momento, o amigo de Bruno pergunta se Saulo conversou com Roberta antes de cometer o crime. Bruno responde que sim e o amigo opina. “Cabra frio da porra”. Bruno continua contando e dá detalhes de como enforcou a vítima.

“Aí quando eu senti o carro parar, dei aqui a volta logo assim, na mão. Estiquei assim”. Então, o amigo pergunta, “o fio”? Bruno responde, “Sim, mais ou menos que eu sabia que dava para garantir no pescoço dela e, nesse assento assim, no apoio de encostar a cabeça, né. Vou logo botar, digo não, ói, vou devagarzinho aqui, ó. Quando tirei um pouquinho, eu digo, tá, eu vou é ligeiro, aí fui, ela ainda olhou para mim. Essa cena é a que eu fico mesmo aqui”.

Roberta diz que vai tirar o filho, mas os dois autores ignoram. Depois de Bruno contar essa parte, ele explica que Saulo ficou muito nervoso no momento do crime. E então, falou para Saulo continuar enforcando Roberta, enquanto ele dirigia o carro para levar o corpo para um lugar chamado Peba.

Segundo os relatos, eles trocam de lugar e “função”. Enquanto Saulo continua com o enforcamento, Bruno dirige o carro. O amigo pergunta se ela morreu na hora.

“Morreu, mas assim, acho que ali já era a morta. Não voltava mais não. Mas, eu, pra grantir, eu queria um negócio garantido. E ela demorava, demorava, podia demorar cinco minutos e ela (suspiro)”, respondeu Bruno.

A conversa não deixa claro onde o corpo da vítima foi deixado. Mas em outro trecho da transcrição, Bruno diz que ele e Saulo conversaram sobre onde iriam enterrar o corpo.

“Foi, foi mais ou menos na metade do caminho, na metade de Feliz Deserto, daqui para Feliz Deserto. (…) E eu não sou um cara ligado, mas eu tenho certeza que um daqueles três era um canto. Ainda eu tentei cavar, queria arrancar pelo menos a arcada dentária dela e os fios de cabelo, arrancar e botar tudo numa mochila, pra dar um fim”, relatou.

Ainda na conversa, o amigo pergunta a Bruno se ele não ficou com peso na consciência. Ele responde. “Fiquei, fiquei porque (…). Não pelo o que eu fiz. Assim, não na minha atitude de matar alguém. Da atitude de dizer que matei por uma bosta, por uma besteira”.

Depois, questionado se consegue dormir, Bruno diz “durmo. Passei (…) passei uns tempos, mais de uma semana sem dormir direito. Agora, nunca tive pesadelo vendo aquela cena, não. Pesadelo era eu acordado de noite, sem conseguir dormir”.

Primeira página do relatório entregue pela Polícia Federal que mostra o início da transcrição da conversa em que homem admite ter assassinado a grávida Roberta Dias, em Penedo (Foto: Reprodução)Primeira página do relatório entregue pela Polícia Federal que mostra o início da transcrição da conversa em que homem admite ter assassinado a grávida Roberta Dias, em Penedo (Foto: Reprodução)

Primeira página do relatório entregue pela Polícia Federal que mostra o início da transcrição da conversa em que homem admite ter assassinado a grávida Roberta Dias, em Penedo (Foto: Reprodução)

As investigações ainda não acabaram. Ao G1, o delegado Cícero Lima confirmou que existe um laudo pericial de uma conversa gravada em áudio, mas não quis dizer se é o mesmo que a reportagem teve acesso.

“Ele [laudo] foi encaminhado para a perícia, mas eu acredito que não seja esse mesmo laudo que vocês têm, porque ele não saiu daqui e eu não dei ele para ninguém. A comissão não vai se pronunciar até que o inquérito seja concluído”, afirmou o delegado.

Em entrevista à TV Gazeta, a mãe de Roberta cobra uma resposta da Polícia Civil sobre o caso e questiona o motivo de, mesmo após meses de o laudo ter sido entregue, o homem que confessou o assassinato não ter sido preso.

“O delegado disse que está trabalhando, mas a Justiça está impune. Só quem sabe a dor sou eu, quem perdeu a minha filha fui eu, quero justiça. Quero a resposta do porquê esse laudo estar na rua e eles não estão presos”, questinou Mônica Reis.

Mãe de Roberta Dias questiona impunidade no caso do assassinato da filha, em Penedo

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O advogado de um dos policiais, Raimundo Palmeira, diz que soube do laudo, mas que ainda não teve acesso ao documento. “Ele [policial] conseguiu comprovar que estava trabalhando no dia do crime em Feliz Deserto e lavrando BO e, inclusive essa informação está no sistema da Segurança Pública. Por isso, ele foi solto”, disse.

A reportagem não conseguiu contato com as defesas dos outros suspeitos.

Na conclusão do laudo, o perito que analisou o material ressalta que foram encontrados indícios de edição no arquivo. “Durante as análises periciais procedidas, ficaram manifestos diversos indícios de edição neste arquivo perquirido, que foram deixados por algum software de edição de áudio”, diz o documento.

O perito ressalta que apesar das divergências no material, não foi solicitada a investigação por fraude. “Pondera-se, porém, que a edição noticiada alhures pode não ter sido produzida com o objetivo de alterar o sentido das falas contidas no registro de áudio analisado, o que configuraria, obviamente se objetivasse tal fim, uma edição fraudulenta. No entanto, não foi o escopo dos exames periciais realizados investigar fraude na edição”.

Por meio de nota, a PF disse que não ia se pronunciar sobre as investigações por ter apenas prestado apoio técnico à Polícia Civil. “Trata-se, contudo, de uma investigação de inteira responsabilidade daquela Instituição de segurança pública e, em razão disso, a Polícia Federal em Alagoas não se manifestará além das informações técnicas aqui registradas”.

Outros assassinatos na família

Quase dois anos depois do desaparecimento de Roberta Dias, o pai dela, Ademir Dias Santos, foi assassinado a tiros aos 44 anos. Ele estava indo levar uma outra filha na escola quando foi baleado diversas vezes em uma outra cidade do interior de Alagoas, Piaçabuçu.

No ano seguinte, o avô de Roberta, Ademar Dias, conhecido como “Seu Dedé”, também foi assassinado a tiros.

A Polícia Civil não confirmou se os assassinatos tinham relação entre si.

G1

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