As causas ambientais do vaginismo
Problemas relacionados ao comportamento sexual são bastante comuns na clínica psicológica, independente de gênero e orientação sexual, faixa etária ou localização geográfica. As chamadas “disfunções sexuais” existem há muito tempo, embora de forma silenciosa, tendo em vista o tabu que era considerado nos séculos passados falar sobre sexo. As pessoas convivem com este mal e já são familiarizadas com práticas sexuais insatisfatórias, indesejadas e desprazerosas, principalmente as pessoas do sexo feminino, considerando sua inclinação natural para a visão do ato sexual com forte carga emocional, muitas vezes não encontradas nas práticas do cotidiano. Em um número extremamente alto, as disfunções sexuais têm causas ambientais e não genéticas, ou seja, foram produtos de uma história passada a que o sujeito experienciou. Não tem como falar de disfunção sexual, sem considerar o repertório comportamental da pessoa, observando suas interações sociais e sua intimidade com o ato em si.
Falar sobre a prática sexual e suas (dis) funções é um campo bastante amplo que inclui fatores mais complexos, tema que daria para escrever milhares de textos envolvendo diferentes temas relacionados a isso, mas em particular neste texto, pretendo introduzir a discussão sobre a disfunção sexual levando em consideração o aspecto psicológico da mesma, mais precisamente o “vaginismo”, como queixa comum de mulheres insatisfeitas com o ato sexual em si. Conceituando, a Associação Americana de Psiquiatria (1994), apud Ferreira (2013, p.694) define o vaginismo como um “espasmo involuntário no intercurso sexual causando acentuado sofrimento ou dificuldade interpessoal.” Essas mulheres já chegam aos consultórios com o diagnóstico e como analista do comportamento, mais importante do que o diagnóstico em si, será a análise funcional do problema trazido. De modo geral, essas mulheres trazem uma história traumática em relação ao ato sexual, que atualmente tem causado respostas fisiológicas de ansiedade frente ao ambiente que configura relação sexual. Não é que a mulher deixa de se excitar nestes momentos, a excitação acontece, mas a penetração em si é impedida. Nestes casos, os músculos da vagina se fecham involuntariamente, em vista de uma história de reforçamento e punição; por exemplo, Luana uma mulher de 22 anos queixa-se de vaginismo há um ano quando tentou iniciar uma vida sexual com o namorado. Até então as relações sexuais com o namorado não envolvem penetração, mas afirma que tem desejo em ser penetrada. Investigando a história de Luana, será possível encontrar um ambiente repressor e pouco informativo educadamente sobre sexualidade, um ambiente onde a prática sexual era vista como impura, desonesta e poderia levar a mulher ao “castigo” caso praticasse sexo, principalmente antes do casamento. Podemos afirmar com isso que Luana emite autorregras de que sexo é uma prática impura e este comportamento foi aprendido em sua história pessoal e sociogenética. Ou seja, o meio cultural é capaz de modelar as pessoas para emitirem seus comportamentos, inclusive aqueles “involuntários”, pois a contração dos músculos nada mais são do que produto de uma história pessoal. Alguns circuitos cerebrais são formados de modo tão consistentes, que formar outro circuito requer bastante gasto energético, por isso as pessoas agem automaticamente frente a algumas situações.
Em geral, a ansiedade tem sido uma das principais emissões feitas pelo organismo antes ou durante o ato de penetração, a isso, damos o nome de pareamento de estímulos, ou seja, uma mulher com uma história de punição frente a qualquer comportamento que configurasse prática sexual, automaticamente irá sentir-se ansiosa sempre que estiver frente a estímulos que outrora foi punida. Para ficar mais claro, a presença de um homem e a aproximação da genitália, podem funcionar como estímulos (antecedentes) para o comportamento de contração vaginal (resposta), para com isso evitar punições como “castigos”, seja de alguma entidade divina, seja uma reação viral ou bacteriana proveniente da penetração, além da provável gravidez (consequência). LARA et. al. (2008, pg. 314) afirmam que […] “a mulher tem múltiplas razões para se engajar no ato sexual; além da razão puramente instintiva e, coloca dentro do padrão normal, as mulheres que necessitam de estímulo corporal direto pelo parceiro ou utilizam a fantasia sexual como estímulo para engajar na relação sexual.” As consequências da prática sexual, podem ser bastante prazerosas e saudáveis e que bom que são, mas nossas histórias individuais poderão ser expressas no bloqueio involuntário de nosso organismo. As causas ambientais de vaginismo são mais comuns do que as causas fisiológicas e é válido considerar que o vaginismo não envolve toda resposta fisiológica de excitação, mas apenas a abertura vaginal. Algumas queixas dos pacientes envolvem inclusive um histórico de pessoas que nem sequer tocaram sua genitália, pois aprenderam que se tocando estariam praticando algo que lhe trariam prejuízos no futuro.
Alguns outros casos também podem ocasionar o vaginismo como ser vítima de um estupro, pois essas mulheres tem um histórico de traumas durante a prática sexual. Algumas das recomendações mais utilizadas pelo senso comum é o relaxamento, mas não apenas pelo senso comum, a comunidade científica também dispõe de técnicas que visam o relaxamento, a diferença é que este é tido de forma gradativa e apropriado para cada indivíduo, com técnicas próprias, como a “dessenssibilização sistemática”. Uma técnica da psicologia comportamental utilizada por psicólogos do comportamento, bem como, por ginecologistas treinados há décadas e é tão certo que as causas desde problema é ambiental, que funciona. É válido considerar que a filogênese não determina o vaginismo, pois fomos selecionados para a reprodução. Do contrário, a sociogênese e ontogênese terão papel primordial na emissão dessas contrações musculares, frente ao estímulo ansiogênico.
Diego Marcos Vieira da Silva
Psicólogo comportamental (CRP15/4764), formado pela Universidade Federal de Alagoas, com formações em psicopatologia em análise do comportamento e técnicas de memória e oratória. Com capacitação para avaliação psicológica e experiência em casos de transtornos psicológicos tanto na clínica quanto em instituições de saúde mental
Referências:
Ferreira, A.L.C.G. et al. Disfunções sexuais femininas. FEMINA. Novembro 2007, vol. 35. Nº 11. Disponível em: < http://www.febrasgo.org.br/site/wp-content/uploads/2013/05/FEMINA_Novembro-691.pdf>
GUIDUGLI, Priscila Meireles. Conheça o livro enurese noturna – diagnóstico e tratamento. Comporte-se, 2017. Disponível em: < http://www.comportese.com/2017/02/conheca-o-livro-enurese-noturna-diagnostico-e-tratamento>
LARA, L.A.S. et al. Abordagem das disfunções sexuais femininas. 2008. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/rbgo/v30n6/08.pdf>
Skinner, B.F. (2003). Ciência e comportamento humano. Tradução organizada por J.C.Todorov & Azzi 11ª edição. São Paulo: Martins Fontes Editora. (trabalho original publicado em 1953).
Texto maravilhoso, muito bem explicado!