Governo “superfaturou” queda de violência em Alagoas

1O governador Renan Filho (PMDB) ignorou dados flagrantemente divergentes da realidade, ao voltar a exaltar na última sexta-feira (28) a notícia de que Alagoas deixou o posto de Estado mais violento e ainda foi o que mais reduziu mortes decorrentes de crimes no Brasil. Para isso, se valeu do 10º Anuário Brasileiro da Segurança Pública, que utilizou dados enviados pela Secretaria de Segurança Pública de Alagoas (SSP/AL) aos pesquisadores do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Renan Filho e o titular da SSP, coronel Lima Júnior, ignoraram na cara dura a diferença de mais de cem mortes com relação aos números oficiais de 2015, que o próprio Estado divulga mensalmente sobre a violência. Além disso, a redução das mortes violentas já apresenta um sensível aumento neste ano de 2016 e já havia sido anunciada em janeiro deste ano.

Com base nos dados enviados pelo seu governo ao Fórum Brasileiro da Segurança Pública, Renan Filho exaltou a “redução de 20,8%” das mortes violentas, mesmo sabendo que essa redução foi de 18% e que 114 vidas perdidas para o crime ficaram de fora da pesquisa do Anuário e fazem a diferença na estatística e, principalmente, na vida das famílias das vítimas alagoanas.

Nenhuma ressalva foi feita pelas autoridades, diante da óbvia vantagem que Alagoas ganhou nos números irreais apresentados ao conceituado Fórum, em resposta ao pedido oficial dos pesquisadores, com base na Lei de Acesso à Informação (LAI). Pelo contrário, a ocasião se transformou em palanque para o governador reafirmar que o rumo de sua política vai ser focada ainda mais em repressão, com novo concurso público para a Polícia Militar de Alagoas.

De acordo com os dados reproduzidos pelo 10º Anuário, foram 1.696 mortes em 2015. Enquanto a SSP já havia divulgado que teriam sido 1.810 mortes decorrentes de crimes violentos letais e intencionais, os CVLIs. Divergência que ampliou a taxa de redução da violência em mais de dois pontos percentuais, o que não tira o mérito da redução histórica dos dados oficiais obtira em 2015.

“Enviaram menor”

O Diário do Poder pediu ao Fórum Brasileiro de Segurança uma explicação para a divergência. E a resposta da diretora executiva do Fórum, Samira Bueno, foi de que os dados de fato não batem e os pesquisadores já desconfiavam, pois as informações também divergiam de matéria divulgada na imprensa meses antes. A dirigente do Fórum enviou ofício em que reforça o pedido pelas informações e a resposta oficial da SSP, em agosto.

E ainda atentou para o fato de que, desde que começaram a produção do Anuário a SSP só divulga os dados de 2016 em seu site, o que os impedia comparações com o dado oficial divulgado pelo Estado de Alagoas.

“Quando solicitamos os dados ao Estado, eles nos enviaram uma estatística bem menor do que tinha sido divulgado, e nós ligamos na SSP mais de uma vez para questionar isso, já que as matérias publicadas eram bem anteriores ao ofício que nos foi encaminhado. Mas o fato é que, apesar dos nossos questionamentos, a SSP manteve a posição de que os dados informados estavam corretos. E temos aqui toda a documentação, inclusive com a assinatura do Secretário da Segurança Pública. Então para todos os efeitos, o que temos como posicionamento oficial do Estado são os dados que publicamos”, respondeu Samira Bueno.

Diante dos boletins das estatísticas oficiais encaminhados pelo Diário do Poder, o Fórum informou que deverá mais uma vez questionar o Estado pelos dados divulgados.

Veja o documento encaminhado por e-mail pela SSP para o Fórum Nacional de Segurança Pública:

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Pacificando com guerra

A redução agora duvidosa, seja ela de 20% ou 18%, é realmente um feito histórico, se observadas as listas nominais de mortos, divulgadas para dar credibilidade às estatísticas do Estado. Porém, de toda forma, foi obtida não apenas com a ajuda da integração das polícias e do que o governo chama de inteligência policial, atrelada basicamente aos grampos telefônicos.

Teve um peso significativo o trucidamento de suspeitos pelos clandestinos tribunais de rua instituídos juntamente com a pena de morte no Estado, o que impactou o psicológico dos pistoleiros ligados ao tráfico de drogas, a quem se atribui a matança em Alagoas.

De acordo com os dados das tais listas nominais da SSP, foram 102 suspeitos mortos pela polícia no primeiro ano do governo de Renan Filho. Havia sido 77 em 2014. Maioria negro e pobre, morto na periferia e até dormindo dentro de suas casas, como denunciaram familiares após forjadas “trocas de tiros”.

Alagoas tem a 3ª polícia que mais mata no Brasil perdendo apenas para os Estados do Amapá e Rio de Janeiro. Este ano, até setembro, foram 79 “bandidos” mortos em ações policiais nada transparentes e muito mal explicadas em Alagoas. E, entre os meses de junho e a setembro, ápice do período eleitoral, houve uma média mensal de mais de 13 mortos pela polícia em supostas trocas de tiros.

Muitas dessas mortes, obviamente, aconteceram em legítima defesa dos profissionais da segurança. Porém, o exemplo mais absurdo que chegou a público foi o caso dos irmãos Josenildo Ferreira Aleixo e Josivaldo Ferreira Aleixo, de 16 e 18 anos, alvos de ação denunciada como truculenta, em 25 de março, no conjunto Village Campestre.

Nela, os policiais alegaram que trocaram tiros com os estudantes especiais, mas já foram indiciados pelo crime em que um dos irmãos tentou defender o outro, desarmado, e o pedreiro Reinaldo da Silva Ferreira, 49, que passava de bicicleta tentou impedir as mortes e também acabou baleado na suposta confusão.

Até nesse aspecto, os dados enviados para os pesquisadores do Anuário divergem, trazendo 97 em vez de 102 mortes em “confronto” em 2015.

 

 

 

Fonte: Davi Soares/Diário do Poder

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