Pecuarista, pai de Geraldo Cardoso foi morto por crime de pistolagem em Alagoas

Crédito: Paulo Tourinho
Crédito: Paulo Tourinho

O ex-soldado militar Manoel de Lima Filho foi condenado a 14 anos de prisão em regime fechado pela morte do pecuarista José Cardoso de Albuquerque, ocorrida em setembro de 1989.

A sentença foi proferida pelo júri no início da noite desta quarta-feira, 16, em Palmeira dos Índios.

Além da prisão em regime fechado, ele foi condenado a pagar R$ 10 mil das custas processuais.

A juíza Luana Cavalcante de Freitas arbitrou a pena, após o veredicto do júri que o considerou culpado pela maioria dos votos por homicídio qualificado por motivo fútil e sem chance de defesa à vítima.

A VERDADE

A peça chave do julgamento foi o depoimento de Iraci Barros da Costa, viúva do comerciante Roney Tenório da Costa, dono do gado que a vítima José Cardoso de Albuquerque transportava. “Meu marido morreu há quatro meses e sempre comentava que um dia participaria desse julgamento, pois nunca tinha visto um crime tão brutal contra um inocente. Os animais que estavam sendo transportados pertenciam a minha família. Meu esposo pagou pelo gado e o José Cardoso recebeu pelo frete”, revelou.

A testemunha disse também que, no dia do crime, seu esposo foi à delegacia para tentar resolver a situação. “Fiquei dentro do carro, mas achei estranho porque o próprio delegado Ricardo Lessa contratou outro caminhão para transportar o gado e o transporte do José Cardoso permaneceu na porta da delegacia, dando uma conotação de que ele queria se livrar da carga”, disse.

José Cardoso como habitual, junto com o motorista José Justino, foi à feira da cidade de Dois Riachos chegando a tentar comprar garrotes. Com o caminhão descarregado, chegou o comprador, Roney, que tinha comprado umas vacas leiteiras e bezerros. O dono do gado pagou para transportar os animais até Maceió.

No decorrer da viagem, ficou marcado entre o contratante Roney e o motorista José Justino que se encontrariam numa churrascaria em Palmeira dos Índios para seguir viagem até Maceió.

Antes de chegar ao local acertado, José Cardoso desceu na esquina do Cruzador para pegar seu veículo nas proximidades de um posto de combustíveis. Foi naquele momento que foi avisado pelo policial Góes, de que deveria comparecer à delegacia.

Em seu depoimento, o motorista do comerciante, José Justino, afirmou que foi “abordado por dois carros, um Chevette e um Gol, com vários homens dizendo para levar o gado para a porta da delegacia que José Cardoso já estaria lá prestando esclarecimentos”, declarou. “Ao chegar no local, o delegado Ricardo Lessa estava acusando o José Cardoso de ter roubado esse gado. Fiquei preso e apanhei muito, sem nem saber o porquê.”

MATERIALIDADE

O júri reconheceu a materialidade do crime ao condenado, mesmo estando ele, conforme apurado durante as investigações, a serviço e ordens do  delegado Ricardo Lessa, morto em 1991 pela polícia.

A magistrada salientou ainda que o condenado teve uma conduta reprovável no crime, o que reforçou a sua condenação. Outro fator destacado pela juíza foi o fato do réu ser, à época, policial militar que deveria estar no uso das suas obrigações.

O promotor Fábio Vasconcelos, falou que se tratou de “uma trama para matar o senhor José Cardoso, pela sua conotação política. “Inventaram ‘factoides’ para justificar o assassinato, até porque naquela época roubar gado era pior que ser um matador. Ele estava ali em seu trabalho habitual, para sustentar os dez filhos. Essa história de roubo de gado é surreal, é absurda.”

Durante a fase de debates no julgamento do ex-policial militar Lima Filho, o promotor Fábio Vasconcelos alegou ainda que o comerciante José Cardoso de Albuquerque foi fuzilado por várias mãos e estava marcado para morrer. “Naquela tarde ele não escapava porque esse grupo veio para executá-lo”.

Ele, no entanto, não especificou o real motivo do assassinato, já que não acredita no envolvimento da vítima com algum tipo de crime.

Segundo ele, a fama do delegado era conhecida por todos. “Ele era um psicopata, um doente. Todos sabem que só ficava na polícia quem estava ao lado dele nos crimes e quem não aceitava, morria”, frisou.

O promotor disse que, em 20 anos de atuação na Justiça, nunca teve tanta certeza de que o delegado teve participação ativa no crime praticado em 1989, juntamente com o ex-soldado militar Manoel de Lima. “Não costumo chutar cachorro morto. Tudo foi montado no inquérito, inclusive, o laudo cadavérico da vítima”, argumentou, ao reforçar sua tese perante o júri.

JUSTIÇA FEITA

O advogado assistente de acusação, Thiago Pinheiro, apesar da condenação, achou a pena suave, principalmente pela comprovação de homicídio duplamente qualificado.

“Vamos estudar recorrer da sentença. No entanto, a condenação trouxe um alívio para a família”, frisou.

Já o cantor Geraldo Cardoso, um dos filhos do pecuarista assassinado, disse que a condenação selou “esse ciclo horrível na vida da nossa família e mostrou que ainda podemos confiar em nossa Justiça”, disse. “Achei os 14 anos poucos, mas foi uma condenação. Tiramos um peso grande e conseguimos limpar o nome do meu pai”, destacou, ainda sob muita emoção.

Crédito: Paulo Tourinho
Crédito: Paulo Tourinho

O CASO

O crime ocorreu no dia 27 de setembro de 1989, por volta das 16h30, numa loja de autopeças em Palmeira dos Índios, quando o agropecuarista foi atingido por diversos tiros de forma brutal, pelas costas e sem chance de defesa.

local do crime

Após as investigações, foram denunciados os delegados Ricardo Lessa, já falecido, e os policiais militares, Manoel Bernardo de Lima Filho, então soldado, e José Belaildo dos Santos, posteriormente impronunciado.

Outros criminosos também participaram do delito, boa parte deles já falecidos.

Segundo as investigações, o delegado Ricardo Lessa e sua equipe teriam ido à cidade de Palmeira dos Índios a mando do então secretário de Segurança Pública de Alagoas, Rubens Quintella, executar a vítima, a qual naquele momento transportava gado, sua atividade habitual.

Vale ressaltar que após a prisão de Lima Filha se chegou então, aos autores intelectuais do crime,  o chefe político e ex-prefeito de Quebrangulo, Frederico Maia Filho, conhecido como “Mainha,” e sua esposa Cleusa, ambos já falecidos.

Os autos do processo relatam que o bando integrava um grupo de extermínio que derramava sangue no Estado de Alagoas, sob o comando doentão delegado Ricardo Lessa. Lima Filho e o falecido delegado foram os autores materiais do homicídio do pecuarista José Cardoso de Albuquerque.

LISTA CRIMINAL

4Manoel Bernardo de Lima Filho passou 17 anos foragido e foi preso em 2007  na capital paulista onde usava nome falso de Valderon Pereira da Costa, e segundo informações policiais permanecia em sua atividade criminosa.

Lima Filho já foi condenado por outro homicídio e responde a mais seis ações penais. O réu é acusado da morte de um vereador do PT em Novo Lino e de mais duas pessoas, cujos corpos foram decapitados, além da morte de um casal homossexual na cidade de Campestre.

Ainda segundo a polícia, Lima Filho responde também por roubos de carro e de cargas na divisa entre Alagoas e Pernambuco.

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