‘Chatô, o Rei do Brasil’ é lançado e finalmente chega aos cinemas
O ano de 1995 foi mesmo muito marcante: o Playstation I era sucesso, o Foo Fighters lançava o disco de estreia, a internet chegava ao país e – veja bem – o filme “Chatô, o rei do Brasil” começava a ser produzido. De lá para cá, o videogame ganhou versões sofisticadas, a banda de Dave Grohl se tornou uma das maiores do mundo, a rede mundial de computadores parou de ser chamada assim e… Nada de o “Chatô” estrear.
Mas eis que, finalmente, este mito do cinema nacional vira realidade. Com duas décadas de polêmicas nas costas do diretor Guilherme Fontes – que no ano passado foi condenado a pagar R$ 71 milhões à União –, o longa vai entrar em cartaz em 19 de novembro. Era muita expectativa. Spoiler (com atraso de 20 anos): “Chatô” não dá vergonha alheia.
Na sessão para a imprensa em São Paulo nesta quinta-feira (12), Fontes apresentou pessoalmente o trabalho (é raríssimo que um diretor faça isso) e disse que esperava todos para uma conversa no fim (é mais raríssimo ainda que um diretor faça isso).me Fontes curioso (ou tenso)
Terminada a projeção, ele fez questão de saber a impressão inicial de críticos e jornalistas. Perguntava e perguntava e perguntava. Diante de uma ou outra expressão de dúvida ou espanto, o cineasta estreante saía-se com esta: “É isto que eu queria, um choque”. E ria.
Replicando uma observação que lhe teria sido feita por Cacá Diegues, Fontes afirmava orgulhoso: “É o último filme tropicalista do Brasil!”. Tropicalista não se pode ter certeza, mas carnavalesco certamente: “Chatô, o rei do Brasil” lembra desfile de escola de samba.
Ao longo de 1 hora e 40 minutos, retrata a história de Assis Chateaubriand (1892-1968) sem qualquer obediência a cronologia, realismo ou versão oficial dos fatos reais.
É um fluxo delirante em que a sucessão de carros alegóricos com cores vibrantes dá lugar a uma sequência de curiosos episódios históricos. Em tom satírico e com cores vibrantes, obviamente. É muito tropicalismo.do Chatô doido
Assis Chateubriand era o empresário que, nos anos 1920, fundou os Diários Associados, grupo de mídia que englobava jornais, emissoras de rádio e de TV.
Em “Chatô”, o protagonista (vivido por um Marco Ricca afetado do sotaque paraibano à peruca de fios alisados) é tudo isso.
E também um viciado em sexo e poder, que tomava uma versão pré-histórica do Viagra e fazia acordos e intrigas com Getúlio Vargas (Paulo Betti, em versão cômico-imitativa).
A inspiração é o livro de mesmo nome, escrito por Fernando Morais. Da obra, o filme herda as passagens em que Chateubriand alucina. Autores do roteiro, Guilherme Fontes e João Emanuel Carneiro (hoje novelista conhecido por “Avenida Brasil” e “A regra do jogo”) ergueram uma trama que vai e volta no tempo e na consciência.
Sabe “Cidadão Kane”, o clássico do cinema habitualmente listado como um dos melhores filmes de todos os tempos, dirigido por Orson Welles e a propósito de um fictício magnata da mídia? Pois “Chatô” não se parece formalmente em quase nada com aquilo. Ao menos se o critério for cinematográfico. Está mais para samba enredo.
A piada infame “Chatô é chato” faz sentido só parcialmente. E soa injusta. “Chatô” acaba sendo, na pior das hipóteses, um chato meio bêbado de fim de festa. Mas que, durante parte considerável do evento, conseguiu ser tolerável, eventualmente divertido e, sobretudo, corajoso.
A dúvida essencial, enfim: valeu a pena esperar esses 20 anos? Valeu – desde que a expectativa não seja por uma obra-prima. “Chatô” não tem cara de antiguidade (dos anos 1990) e se segura como cinema, apesar dos absurdos e até independentemente de seu personagem.
Além disso, se justifica por no mínimo uma atuação bem inspirada: Andrea Beltrão continua excelente em 1995.
G1