Presos da Lava-Jato tentam melhorar as condições severas da carceragem da PF
Cama box é uma peça única, formada pelo colchão sobre uma base de madeira. Num espaço apertado, onde quatro pessoas ficam confinadas 23 horas por dia, o utensílio pode fazer toda a diferença. Por isso, incorporar algumas camas ao mobiliário da custódia da Superintendência da Polícia Federal do Paraná, em Curitiba, se tornou uma ambição entre os 17 presos da Lava-Jato encarcerados em seis celas. Enquanto os seus advogados acumulam derrotas na tentativa de libertá-los, eles travam uma luta pessoal e silenciosa para amenizar o desconforto da rotina na cadeia.
As seis selas da carceragem da PF estão divididas em duas alas. Na primeira, ficam os dirigentes das empreiteiras, quatro por cela. Na outra, convivendo com presos comuns, vivem Nestor Cerveró, ex-diretor da Área Internacional da Petrobras, o doleiro Alberto Youssef e os lobistas Fernando Antônio Falcão Soares, o Fernando Baiano, e Mário Frederico de Mendonça Goes — João Procópio de Almeida, tido como braço-direito de Youssef, está temporariamente internado em hospital penal.
Cada cela, de 12 metros quadrados, oferece uma cama beliche de cimento (dois andares) e um “boi”, vaso sanitário rente ao piso, sem divisória. Dois presos são obrigados a dormir em colchões no chão. Pelo regulamento interno, todos têm direito a uma hora diária de banho de sol.
RELÓGIOS ERAM PROIBIDOS
Mas já foi pior, segundo o advogado Alberto Toron, que representa Ricardo Pessoa, da empreiteira UTC. Ele disse que, quando o grupo maior chegou, no dia 14 de novembro, trazido pela sétima fase da operação, os carcereiros proibiam o uso de relógios e acesso a jornais ou revistas. O contato com os advogados era feito somente no parlatório, onde cliente e defensor, separados por vidro, comunicam-se via interfone, uma vez ao dia.
— O Estatuto dos Advogados garante o contato pessoal e reservado com o cliente. Portanto, o que estão fazendo é notoriamente ilegal – queixa-se Toron.
A reclamação, embora unânime, é a máxima manifestação de descontentamento. Aconselhados pelos advogados, os presos enfrentam a situação calados. No máximo, os advogados continuam atacando o parlatório, alegando suspeitar de grampos. Com o passar do tempo, o grupo tem colhido pequenas conquistas, como a liberação do uso de relógios e a entrada de publicações. Algumas das reuniões com os advogados passaram a ser em salas sem vidros. Dos visitantes, puderam receber água mineral, material de higiene pessoal, biscoitos e chocolates, estes no limite de duas barras de 200 gramas, por semana, para cada preso.
— Uma vez, os agentes barraram uma barrinha de 50 gramas de chocolate, mandada pelo meu filho — disse o advogado Pedro Henrique Xavier, que defende Erton Medeiros Fonseca, da Galvão Engenharia.
Mais de três meses depois, o grupo define a temporada no cárcere como dura, mas com respeito humano. Não há televisão ou rádio. É proibido fumar. As quentinhas, servidas nos horários do café, almoço e jantar, são fornecidas por uma empresa terceirizada. Os agentes comentam que “a qualidade da marmita melhorou com a chegada do pessoal da Lava- Jato”. Outro detalhe percebido pelos policiais é a sofisticação dos carros estacionados nas proximidades da superintendência, no bairro de Santa Cândida, nos dias de visita de parentes, às quartas-feiras.
— O tratamento é digno, mas com a firmeza necessária — observa o advogado Edward Carvalho, defensor dos dirigentes da Mendes Júnior.
Além das celas, a carceragem tem uma sala de visitas e outra da custódia, onde ficam o material de conservação. Presos comuns, em sua maioria traficantes, ficam pouco tempo no local. Logo são transferidos para presídios comuns.O banho de sol é oferecido numa área aberta, protegida por muros altos e arame farpado. Porém, alguns presos aproveitam a abertura das celas para limpá-las.
Como a PF não conta com guardas penitenciários, o plantão da carceragem é cumprido por dois agentes federais, deslocados de outras unidades. Os presos relatam aos advogados que as negociações por melhorias são travadas com o chefe da carceragem, um agente de ascendência oriental. Caberá a ele liberar ou não a cama box nas celas.
O Globo