‘Perdi meus braços e pernas, mas tive o ano mais feliz da vida’
“Há dias em que eu acordo e penso, nossa, meus ombros doem, minhas extremidades estão doloridas, mas sigo em frente”, diz Alex Lewis.
Aos 34 anos de idade, o britânico, ex-proprietário de um pub, viu sua saúde ficar em estado crítico em poucas semanas. Perdeu as pernas e os braços. Perdeu também os lábios e o nariz.
Cirurgiões desde então retiraram pele de seus ombros para substituir seus lábios – deixando-o, ele brinca, parecido com um personagem de Os Simpsons e com um nariz que escorre constantemente.
Apesar disso, Alex descreve seu último ano como o melhor de sua vida.
A atitude positiva do britânico é considerada extraordinária pelas pessoas ao seu redor. Ele diz que se sente mais feliz agora do que antes de ficar doente. Muitos acham difícil de acreditar, mas Alex afirma que tirou coisas boas do processo.
“(A doença) me fez pensar de forma diferente quanto a ser pai, parceiro, ser humano”, contou ele ao programa Ouch, da BBC, dedicado a temas de deficiência e diversidade.
Uma organização de caridade aberta em seu nome lhe deu ímpeto para ajudar outras pessoas. E ele pretende se casar com sua companheira.
“Tive sorte por ter minha família ao meu lado. Eu sabia que tinha um futuro adiante, porém sofria pelo fato de meus entes queridos estarem passando por isso, sofrendo ao me ver.”
Por outro lado, Alex não consegue mais fazer muitas coisas das quais gostava, como cozinhar e jogar golfe. Ele e sua companheira Lucy perderam o pub que administravam.
Infecção
Era novembro de 2013 quando Alex percebeu sangue em sua urina e manchas e machucados estranhos em sua pele.
Levado às pressas ao hospital, descobriu que tinha uma infecção estreptocócica tipo A. A infecção penetrou profundamente em seus tecidos e órgãos e provocou um envenenamento sanguíneo, ou sepsia, que pode causar falência múltipla de órgãos.
A pele de seus braços e pernas e parte de sua face rapidamente escureceram e gangrenaram – seus membros tiveram de ser amputados. Para parentes e amigos que ficaram ao lado dele diariamente enquanto respirava com a ajuda de aparelhos, foi algo chocante.
Mas para seu filho Sam, na época com três anos, era como se o pai estivesse coberto de chocolate.
Quando Alex soube que seu braço esquerdo teria de ser amputado acima do cotovelo, resultado de uma gangrena que estava infeccionando seu sangue, ele diz que não sentiu tristeza, porque os médicos foram bastante realistas. “Era uma questão de ‘este braço está me matando'”, conta.
Na segunda semana de dezembro, mesmo após a amputação, sua vida ainda corria risco. Por isso, pouco tempo depois, Alex teve de perder também as pernas.
“Processei cada amputação individualmente”, conta. “Parte de mim pensou, ‘vamos só resolver esse processo para que eu possa sair do hospital e voltar para casa’.”
Mas, no fim das contas, ele diz que não teve muito tempo para pensar.
Seu último membro, o braço direito, também estava doente, mas os médicos acharam que havia uma chance de salvá-lo. Fizeram uma operação de 17 horas e meia na véspera do Natal de 2013 para reconstruí-lo, retirando o tecido morto.
Tarefas cotidianas
Para os médicos e para Alex, era crucial fazer o possível para preservar pelo menos um dos membros.
“Todos os amputados de quatro membros que conheci ao longo dessa jornada me disseram que fariam tudo por uma mão”, diz Alex. “(Com ela) você ainda consegue fazer tarefas cotidianas, beber água, escrever.”
Mas o dano era grave demais e, certa noite, enquanto dormia, Alex se virou e acabou quebrando o braço ao meio, porque o osso estava infeccionado.
Sua companheira Lucy ficou devastada, imaginando que a vida ficaria muito mais difícil também sem esse membro. Mas Alex diz que achou o desfecho melhor do que se ele tivesse tentado por anos salvar o braço em vão.
“Acho que psicologicamente teria sido muito pior esperar muito tempo e depois perdê-lo”, raciocina.
A partir daí, o britânico teve de aprender a viver uma nova vida. Não conseguia mais se levantar sozinho, tampouco se lavar e se vestir. Precisou acostumar-se à ajuda de um cuidador diariamente. Sua prioridade passou a ser aprender a andar.
Esse aprendizado começou em um hospital de Roehampton, no sudoeste de Londres. Em apenas duas semanas, Alex surpreendeu todos ao conseguir caminhar com próteses especiais.
Ele já caminha há mais de três meses e diz que progrediu muito, mas ainda pena para se adaptar. “Subir escadas é difícil, porque (as próteses) são curtas.”
Alex agora também usa próteses de braços, na forma de ganchos, que o ajudam nas tarefas cotidianas.
Irreconhecível
O britânico diz que ainda se sente como em um mundo surreal e confessa que se estranha ao se ver no espelho: o corpo que ele conheceu durante 33 anos mudou drasticamente em um ano, e ele reconhece que foi uma perda horrível.
“É algo inquietante, mas acho incrível o que o corpo humano é capaz de superar”, afirma.
“Sempre fui tranquilo, relaxado. Essa atitude mudou, hoje tenho pressa para conquistar coisas – o que no meu caso é conseguir pegar uma xícara de café. (Mas) tenho sorte de estar vivo”, diz.
“Foi, de longe, o ano mais incrível da minha vida. É difícil explicar, mas me sinto forte, bem, saudável e feliz em casa, talvez mais do que antes. Coisas ótimas saíram dessa experiência, que me fez perceber o quão preciosa é a vida.”
BBC