Com preço alto da cocaína, brasileiros se arriscam como ‘mulas’ na Indonésia
Os brasileiros Marco Archer Cardoso Moreira — executado no último domingo (18) na Indonésia — e Rodrigo Muxfeldt Gularte — que continua no corredor da morte — foram presos na Indonésia em 2003 e 2004, respectivamente, e condenados à morte por tráfico de drogas. Quando foram pegos no aeroporto de Jacarta, ambos tinham o mesmo perfil: eram surfistas e se dirigiam até a paradisíaca ilha de Bali.
Praticantes de surfe, kite surfe e asa-delta, entre outros esportes, são usados como “mulas” para transportar drogas até a ilha desde meados da década de 1980.
Como o local é famoso por suas praias e ondas, os surfistas são escolhidos por terem um perfil que pode facilitar a superar os controles de fronteira.
No livro Snowing in Bali (Nevando em Bali, em tradução livre), a jornalista e escritora australiana Kathryn Bonella conta a história de traficantes de drogas na ilha, um paraíso que recebe cerca de 3 milhões de turistas todos os anos. Segundo ela, “vários” surfistas estão presos no país por causa do tráfico de drogas.
A ilha de Bali é descrita no livro como a capital do tráfico no país, localizada numa região estratégica entre os oceanos Índico e o Pacífico Sul, além de ser muito próxima de dois grandes mercados consumidores: Japão e Austrália. “Um dos destinos mais importantes do mundo para a distribuição de narcóticos”, diz.
Kathryn passou 18 meses entrevistando traficantes presos na cadeia de Kerobokan (também conhecida como Hotel K), onde chegou a entrevistar o brasileiro Marco Archer.
Na obra, ela mostra a vida de riqueza e poder dos traficantes, com um estilo de vida “movido a drogas, orgias, surf e extravagâncias”.
“Mas liderar um império de drogas em Bali pode ser também um negócio de alto risco, com terríveis consequências para quem é pego e condenado”, escreve Kathryn.
O que justifica o risco de encher os tubos de uma asa-delta com 13 kg de cocaína (no caso de Marco) ou esconder 6 kg da droga em pranchas de surfe (no caso de Gularte) são os altos preços praticados em Bali.
Segundo Kathryn, a cocaína é comprada no Peru ou na Colômbia por entre US$ 1.000 e US$ 2.000 o quilo. No Brasil, essa quantia pode atingir US$ 5.000. Já em Bali, a alta procura por turistas faz com que o quilo seja estimado entre US$ 20 mil e US$ 90 mil — a variação de preço responde à tradicional regra “oferta e demanda”: se muita droga estiver entrando, o preço cai; do contrário, o preço sobe. Já na Austrália, o quilo da cocaína pode atingir os US$ 300 mil.
Ela conta a história de Rafael, um surfista brasileiro que deu adeus à sua vida no Rio de Janeiro para se tornar um dos chefes do tráfico na ilha, traficando até 20 kg de cocaína por semana (no auge) e vivendo de “pôr do sol, surfe e sexo com lindas garotas”. Um lugar onde é possível “fazer fortunas e festejar muito”.
O jornalista brasileiro Renan Antunes de Oliveira escreveu, no site Diário do Centro do Mundo, um relato de uma entrevista de quatro dias com Marco em 2005. Na época, o detento avaliava em US$ 3,5 milhões o valor da mercadoria que transportava quando foi preso.
Marco e o holandês Ang Kiem Soei foram os primeiros ocidentais a serem executados pela Indonésia. Cerca de outras 60 pessoas estão no corredor da morte no país por tráfico de drogas, incluindo o brasileiro Gularte, dois australianos e até uma avó britânica.
Segundo as estatísticas oficiais, o número de apreensões de substâncias proibidas aumentou consideravelmente nos últimos anos. Entre as autoridades, existe a crença de que a pausa nas execuções entre 2008 e 2012 serviu de incentivo para mais crimes.
Eleito em 2014 com uma plataforma política de endurecimento no combate às drogas, o atual presidente Joko Widodo já avisou que negará todos os pedidos de clemência. O país deve realizar novas execuções entre fevereiro e março deste ano.
R7