Vasco: Chapa de Eurico Miranda vence e dirigente está de volta

Os gritos de “casaca!” na madrugada de terça para quarta-feira anunciam: o Vasco já sabe quem será seu novo presidente para o triênio 2015/16/17. Ou nem tão novo assim. Eleita com 2.733  votos, mais do que os outros dois concorrentes somados, a chapa “Volta Vasco! Volta Eurico!” recolocará Eurico Miranda no cargo que ocupou de 2001 a 2008. Amado por muitos, odiado por outros tantos, o polêmico dirigente, presente na vida política de São Januário desde o fim dos anos 1960, receberá das mãos de Roberto Dinamite, que  venceu a chapa de Eurico em 2008 – o candidato era o falecido Amadeu Pinto da Rocha -, um clube com sérios problemas financeiros e possivelmente de volta à Série A do Brasileiro. A reunião no Conselho Deliberativo será realizada no próximo dia 19 e a nova diretoria toma posse dia 1º de dezembro, com a Série B já encerrada.

– Eu só voltei para resgatar o Vasco. Para tirar o Vasco desta situação. Se o Vasco não se encontrasse nessa situação, não haveria hipótese de eu voltar. E vou repetir: o respeito vai voltar ao Vasco, internamente e externamente. É só isso. Isso eu tenho condições de fazer. Acho que todo o resto é consequência, todo o resto vem depois disso. Com apoio, sem apoio, uma coisa eu garanto. Isso é uma coisa pessoal. O respeito vai voltar ao Vasco – disse Eurico, logo após o resultado final.

O dirigente garante que terá apoio para realizar o seu mandato no clube.

– É evidente que eu não me proporia a fazer um negócio desse sozinho. Eu tenho apoio, não só do (Fernando) Horta, mas do José Luiz Moreira, do Silvio, eu tenho apoio de um grupo jovem, cheio de ideias, com vontade de trabalhar. É um grupo jovem que tem o mesmo sentimento de Vasco que eu tenho. Eu não tenho dúvida de que nós vamos tirar o Vasco dessa situação em que se encontra – afirmou.

No total, 5.592 sócios compareceram à Colina para votar. Do total, houve 60 abstenções e 60 votos computados, mas que não foram validados por inadequação com as regras da eleição – inadimplência ou fora do prazo do ponto de corte, por exemplo. A chapa “Sempre Vasco”, de Julio Brant, foi a segundo colocada, com 1.570 votos. Em seguida, ficou a “Identidade Vasco”, de Roberto Monteiro, com 1.155.

Este foi o pleito com mais votantes na história cruz-maltina. O recorde anterior havia colocado frente a frente Antônio Soares Calçada e Eurico Miranda em 1985. Foram contabilizados 5.553 votos, com vitória de Calçada por diferença de 369 votos – o presidente de honra do clube recebeu apoio nas urnas de 2.961 sócios contra 2.592 de Eurico.

Três anos antes, a votação expressiva – para o colégio eleitoral vascaíno – também colocou os dois em lados opostos. A dupla depois atravessaria lado a lado, Calçada como presidente e Eurico, vice de futebol, os vitoriosos anos 1990. Em 1982, na segunda maior participação da história das eleições no clube, houve um total de 4.778 votantes, com vantagem maior de Calçada sobre Eurico.

A eleição do Vasco é indireta. Nesta terça, os sócios elegeram a chapa que terá direito a 120 vagas no Conselho Deliberativo e indicará a Assembleia Geral (presidente e vice-presidente). O segundo colocado indica 30 conselheiros. No dia 19, em sessão na sede náutica da Lagoa, a diretoria administrativa é eleita em votação dos conselheiros eleitos e dos natos, outros 150, que formam o Conselho Deliberativo do Vasco.

Início tranquilo, desistência e precaução contra fraudes

Cercada de muita confusão desde o ano passado, quando houve adesão em massa de sócios em março e abril de 2013, a grande polêmica desta eleição, o pleito começou às 9h10 desta terça-feira com numerosas filas. Logo cedo, a chapa “Vanguarda Vascaína”, de Márcio Santos, retirou a candidatura. Na porta de São Januário, carros de som dos três candidatos faziam campanha, enquanto 40 homens da Polícia Militar (entre GEPE, Choque e 4º Batalhão) trabalhavam na frente da entrada social.

Para evitar possíveis fraudes, todos os sócios tinham que passar por pelo menos duas barreiras até chegar ao ginásio do clube, local da votação. Com a renúncia de Abílio Borges na última segunda por licença médica, o candidato Roberto Monteiro presidiu a sessão, que tinha um membro da sua chapa, Aníbal Rouxinol, na composição da mesa, além do presidente e vice-presidente do Conselho dos Beneméritos, Eurico Miranda e Silvio Godói. Os nomes da mesa de direção, aliás, foram um dos motivos para três pedidos de impugnação apresentados pela chapa “Sempre Vasco”, de Julio Brant. Após o encerramento das urnas, Monteiro e a mesa eleitoral rejeitaram os pedidos e a apuração começou por volta de meia-noite.

Choque de gerações: deboche e troco

Com intervalo de 15 minutos, Eurico Miranda, de 70 anos, votou e depois acompanhou de perto Julio Brant, mais de três décadas mais jovem, na caminhada para as urnas. O encontro de gerações chamou a atenção. Eurico olhou com ar de deboche e ouviu a manifestação do rival.

– Vamos votar consciente, Vasco, vamos votar pela mudança. Vasco, p…..! – bradou Julio, que ouviu gritos a seu favor e outros pelo rival.

Eurico, com cara de desdém, interferiu na manifestação de Julio, apontou para o candidato e passou na frente falando aos fotógrafos e jornalistas.

– Quantas vezes esse aí gritou Vasco na vida? Isso é uma ofensa ao Vasco – disse, ouvindo resposta de Julio Brant.

– Deixa ele passar para não estragar a foto.

Suposta irregularidade em lista de votantes causa bate-boca

No início da tarde, um novo bate-boca mexeu com o ambiente. A discussão aconteceu no ginásio, onde ocorre a votação, e contou com a presença dos três candidatos, representantes da chapa “Sempre Vasco” e um membro do Ministério Público que acompanha o pleito de perto. Tudo por conta de uma suposta irregularidade na lista de votantes.

José Henrique Coelho e Alan Belaciano, ambos da “Sempre Vasco”, reclamaram que cerca de 160 apoiadores de Brant teriam “sumido na madrugada” da lista de sócios com direito a voto. A queixa deu início a um bate-boca, e Roberto Monteiro pediu por escrito a reclamação com os nomes de todos os eleitores que se sentirem prejudicados para que a mesa analise caso a caso após o termino da votação. Segundo ele, há motivos variados para estarem fora da lista, como inadimplência e ainda casos de sócios fora do prazo para votar nessas eleições.

O momento de mais tensão se deu quando Belaciano começou a falar do próprio caso (ele seria um dos cerca de 160 casos). Quando o advogado disse que ficou um período inadimplente, logo foi cortado por Eurico.

– Você tinha de ser eliminado do Vasco, ficou mais de três meses sem pagar. Não sei nem porque você está aqui – exclamou o candidato.

Coelho não gostou das palavras e rebateu.

– Calado, Eurico! – disse ele, sendo repreendido por Euriquinho, filho do ex-presidente, e outros partidários do pai.

Dinamite vota e ignora candidatos ao seu cargo

Acompanhado de alguns vice-presidentes, Roberto Dinamite, maior artilheiro da história do Vasco, votou às 15h. Sem candidato da situação, o presidente não revelou seu voto e disse que deixa como maior legado de sua administração a democracia no clube. O ex-jogador passou direto por Julio Brant e Roberto Monteiro e ignorou Eurico Miranda, que estava à sua frente no momento em que o atual presidente se encaminhou às urnas.

– Não falei com ele (Eurico) em respeito aos outros candidatos. Por respeito à instituição, estou mantendo uma postura de neutralidade – disse o presidente.

Animal abraça Julio e alfineta Eurico

Edmundo chegou pouco antes das 19h para votar. O ídolo da torcida, que apoiava a chapa “Sempre Vasco”, de Julio Brant, passou direto por Eurico Miranda depois de depositar seu voto nas urnas. Na frente dele, o ex-presidente apenas sorriu quando percebeu que o ex-jogador passara direto.

Julio Brant acompanhou Edmundo na hora da votação. O ex-atacante, herói do título brasileiro de 1997, comentou em tom de ironia a coincidência de outros ex-jogadores, com exceção de Romário, não apoiarem o ex-presidente.

– Se eu, Felipe, Pedrinho, Juninho, que somos todos crias do Eurico, não estamos com ele, é porque já conhecemos o jeito dele de administrar – disse.

Tumulto do lado de fora

Se o clima ao longo de todo o dia de votação foi pacífico, às 21h, já próximo do horário de fechamento das urnas, o ambiente ficou pesado em São Januário. Do lado de fora da sede social, houve confusão e correria. A polícia precisou intervir com gás de pimenta para abrir a rua em meio a gritos de “volta, Eurico!”.

Na madrugada, enfim a vitória matemática

O que já era previsto desde a boca de urna e após a contagem dos primeiros votos aconteceu por volta das 3h: a vitória da chapa “Volta Vasco! Volta Eurico!” foi confirmada matematicamente antes do fim da apuração. De charuto na mão, Eurico comemorou ao lado de seus eufóricos eleitores e apoiadores. Estava escrito mais um capítulo da história vascaína – e ele novamente está presente.