Reforma política: entenda os temas mais polêmicos
Anunciada como a prioridade da presidente reeleita, Dilma Rousseff, em seu segundo mandato, a reforma política gera controvérsias entre os partidos políticos brasileiros há décadas.
Não existe consenso entre as siglas quanto às principais questões em debate, e nem mesmo os partidos têm posição fechada sobre alguns tópicos. O PT, por exemplo, defende em seu programa partidário uma reforma distinta da que tem sido pregada agora por Dilma.
O Congresso discute ainda um outro projeto de reforma, elaborado no ano passado por deputados de vários partidos em resposta às manifestações de junho. Outras propostas de mudança tramitam em paralelo.
Como grande parte das propostas em discussão precisaria de aval do Legislativo, a posição do órgão é crucial no tema e deverá forçar Dilma a buscar um entendimento com deputados e senadores.
A BBC Brasil listou algumas das principais propostas de alteração nos sistemas político e eleitoral, detalhando qual a posição dos principais partidos sobre os temas e o que trava a aprovação das medidas.
Plebiscito ou referendo
O primeiro ponto de divergência é a forma como a sociedade participaria da reforma. A presidente Dilma Rousseff inicialmente defendeu que o Congresso convocasse um plebiscito em que os eleitores pudessem se manifestar sobre vários pontos da reforma. Posteriormente, os congressistas teriam de elaborar um projeto com base na decisão das urnas.
Além do PT, apoiam no Congresso a realização de um plebiscito o PCdoB e o PSOL, que têm bancadas pequenas.
Mas o PMDB – que hoje preside a Câmara e o Senado – defende que o Congresso elabore a reforma e, só depois de aprová-la, convoque um referendo para consultar a população sobre o texto. Os eleitores poderiam, então, chancelar a proposta ou reprová-la como um todo. A posição do PMDB é endossada pela ampla maioria dos partidos no Congresso, entre os quais PSDB, PP, DEM, PR e PPS.
Diante da resistência à sua ideia, Dilma recentemente indicou concordar com a realização de um referendo.
A proposta original do PT, no entanto, é outra: o partido, assim como o PCdoB e vários movimentos sociais, defende que o Congresso convoque uma Assembleia Constituinte para tratar exclusivamente da reforma política. Eles tentam colher milhões de assinaturas para pressionar o Congresso a atender seus anseios.
Financiamento de campanha
O PT, siglas de esquerda (PSOL, PCdoB) e outros partidos pequenos (entre os quais PRTB e PSDC) defendem que as campanhas sejam financiadas exclusivamente com dinheiro público, para reduzir o poder de influência de empresas na eleição.
Mas PMDB e outros partidos grandes são contra a mudança, argumentando que ela geraria mais gastos públicos com os pleitos e aumentaria o chamado “caixa dois” (arrecadação não declarada e ilegal de recursos).
O PSDB diz que o financiamento público só faria sentido se o voto for em lista (leia abaixo), modelo que diminuiria o número de candidatos na disputa. Caso contrário, a sigla afirma que o Estado gastará muito custeando as candidaturas.
Uma alternativa, defendida pela ONG Transparência Brasil, seria estabelecer um limite para as doações. Outra opção, prevista em proposta que tramita no Congresso, seria proibir apenas doações de empresas.
Esta medida, porém, também enfrenta a resistência de vários partidos, que consideram que ela favoreceria o PT. Esses partidos avaliam que, como tem grande número de militantes, a sigla arrecadaria mais recursos que as demais.
Nos próximos meses, o Supremo Tribunal Federal (STF) também deve se pronunciar sobre o tema. O órgão começou a julgar uma ação que pede o fim das doações de empresas, mas a votação foi interrompida. Se decidir que essas doações são ilegais, a posição da corte terá força de lei.
Votações majoritárias
Uma proposta elaborada por sindicatos e movimentos sociais defende que as eleições majoritárias (para vereadores, deputados estaduais e deputados federais) ocorram em duas etapas: num primeiro turno, os eleitores escolheriam um partido. No segundo, escolheriam políticos dos partidos mais votados.
Já o PSDB defende o voto distrital misto nas eleições majoritárias. Por esse sistema, os Estados seriam divididos em distritos eleitorais. Os eleitores teriam dois votos: um para candidatos de seu distrito e outro para um partido. O partido afirma que o sistema aproximaria eleitores dos eleitos e daria mais importância aos programas partidários.
O PT é contra o voto distrital, por avaliar que ele dificultaria a eleição de representantes de minorias. A sigla defende que o voto seja em listas de candidatos definidas pelos partidos. É o chamado voto em lista fechada.
Já o PMDB propõe mudança mais simples, ao defender que só os candidatos mais votados sejam eleitos. Hoje, por causa da fórmula eleitoral em vigor, candidatos muito bem votados acabam garantindo a eleição de outros membros de sua coligação partidária.
Todos os principais partidos concordam em pôr fim às coligações nas eleições majoritárias.
Mudanças na forma de contabilizar os votos em eleições majoritárias exigiriam mudança na Constituição, o que tornariam sua aprovação mais difícil.
Fim da reeleição
O PSDB defende o fim da reeleição para cargos no Executivo (prefeito, governador e presidente) e a extensão dos atuais mandatos dos governantes para cinco anos.
A maioria dos partidos não tem posição oficial sobre a proposta. Durante a campanha, Dilma disse que aceitaria discutir o tema, mas ironizou que o partido a propor o fim da reeleição (PSDB) fosse o mesmo a aprovar o mecanismo, no primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso (1995-1998).
Essa mudança também exigiria uma alteração constitucional.
Cláusula de barreira
A medida exigiria que os partidos obtivessem uma votação mínima em certo número de Estados para que pudessem eleger congressistas, receber recursos do fundo partidário e ter direito à propaganda eleitoral gratuita. A medida visa combater os chamados “partidos de aluguel”.
Estima-se que, se aprovada, só seis ou sete dos partidos atuais conseguiriam eleger representantes para o Congresso. Hoje há 28 siglas na Casa.
O PSDB e o PMDB apoiam a medida. O PT – que em sua coalizão conta com siglas pequenas – não tem posição oficial sobre o tema. PSOL, PCdoB e outros partidos pequenos são contra a cláusula de barreira e dizem que ela concentraria o poder político em poucas siglas.
Em 2006, o Congresso aprovou a criação da cláusula de barreira, mas a medida foi derrubada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que a julgou inconstitucional. Se o Congresso voltar a aprovar a matéria, é possível que representantes de partidos pequenos recorram ao STF outra vez.
Outros temas
Há vários outros temas em discussão. Em sua proposta de reforma, o PSDB defende unificar as eleições municipais, estaduais e presidenciais e alterar a fórmula para o cálculo do tempo de propaganda eleitoral de candidatos ao Executivo. O objetivo da segunda medida é desencorajar alianças eleitorais feitas apenas com o propósito de ampliar a fatia de tempo dos candidatos.
O PT defende obrigar os partidos a ampliar o número de candidaturas de mulheres e prega regulamentar o papel de conselhos populares na aplicação de políticas públicas. Antes da eleição, Dilma publicou um decreto que trata do tema, mas a Câmara derrubou a medida, alegando que ela reduzia as atribuições do Congresso.
Já a proposta de reforma elaborada por deputados em 2013 inclui, entre outros temas, tornar o voto facultativo, exigir que candidatos estejam filiados a partidos a no mínimo seis meses antes da eleição e ampliar os requisitos para a criação de novas siglas.