Por falta de leitos, pacientes não conseguem fazer transplante de medula
Alguém adoece, vai ao médico e faz todos os tratamentos ao seu alcance. Mas eles falham e o doente é informado que para a sua condição (como alguns tipos de câncer), a única solução é um transplante de medula óssea. O frio na barriga vem: a chance de encontrar um doador compatível é de um para cada 100 mil pessoas. No Brasil, com os 3,4 milhões de doadores inscrito no Registro Brasileiro de Doadores de Medula Óssea (Redome), o quadro traz um pouco de esperança: até 70% das pessoas encontram um doador. Com a porcentagem alta, o alívio vem. Porém, vai embora rápido: mesmo com doador compatível, alguns pacientes aguardam até seis meses para conseguir um leito em um hospital para fazer o transplante de medula. Nesse meio tempo, a pessoa segue correndo risco de morte. Muitos morrem.
Atualmente, segundo a Sociedade Brasileira de Transplante de Medula Óssea (SBTMO), há cerca de 200 brasileiros com doadores compatíveis na fila por uma vaga em um dos 70 centros especializados em transplante de medula óssea espalhados pelo País. É gente que sofre de doenças como mieloma múltiplo, linfomas, leucemia mieloide aguda e crônica, leucemia linfoide aguda, anemia aplástica grave e mielodisplasias. O Ministério da Saúde confirma em nota: há 207 pacientes já com doadores aguardando o transplante.
“São pessoas para as quais o transplante é a única chance de sobreviver. Por isso, a urgência de se fazer o quanto antes”, afirma Lúcia Silla, presidente da SBTMO. A médica explica que como o transplante é arriscado, há risco de complicações e o paciente pode precisar ficar internado por até 90 dias. Por isso a necessidade de leito em longo prazo.
O orientador agrícola Ademir Brune, de 50 anos, teme não conseguir sobreviver até daqui a seis meses, tempo estimado para que ele consiga fazer o transplante. Há alguns meses, ele foi diagnosticado com leucemia mieloide aguda. Após o diagnóstico, passou por sessões de quimioterapia e viu o câncer regredir. Recentemente, porém, as células cancerosas da medula aumentaram novamente.
Brune foi internado em Porto Alegre e recebeu a notícia de que a única solução para seu caso é o transplante de medula óssea. Casado e pai de três filhas, ele começou a procurar doadores na família, que é sempre o lugar mais provável para encontrar alguém compatível. Não encontrou apenas um, mas três: seus três irmãos são compatíveis e estão dispostos a doar. A boa vontade fraternal não falta, mas uma cama de hospital sim.
A presidente da SBTMO conta que somente no Hospital das Clínicas de Porto Alegre há 31 pacientes esperando o transplante. Todos eles com doadores compatíveis dispostos a passar pelo procedimento. A falta de leitos disponíveis impede que o transplante seja realizado.
“Por isso é que nós da SBTMO estamos fazendo um esforço enorme para que se aumente o numero de leitos no País. Nós precisamos atender a todos”, afirma Lucia.
Conforme informações do Ministério da Saúde, dos cerca de 50 centros especializados em transplantes de medula óssea no Brasil, apenas 27 fazem o transplante não-aparentado, quando o doador e o receptor são pessoas diferentes. Por ser mais delicado e haver um risco maior de rejeição da medula, existem poucos lugares com capacidade de fazer esse tipo de procedimento.
Consultado, o Ministério da Saúde afirmou que há previsão de publicação de uma Portaria que irá instituir estratégia para ampliação e implantação de leitos para o transplante alogênico não aparentado.
Como doar medula óssea?
Quem quiser se tornar um doador de medula óssea deve ir até um centro de coleta e manifestar o interesse. Um exame de sangue será feito e o resultado será registrado no Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea (Redome). A partir desse momento, o doador precisa sempre manter os registros atualizados, como informar qualquer mudança de endereço ou telefone.
Quando alguém está doente e a medula do doador parece ser compatível, o doador é chamado para fazer mais exames. Se for comprovada a compatibilidade, o doador poderá decidir se a coleta será por aférese ou pelo osso da bacia.
O hematologista Guilherme Perini, do Hospital Albert Einstein, explica que, na doação por aférese (também chamada de periférica), o doador recebe uma medicação que aumenta a quantidade de glóbulos brancos e células tronco na corrente sanguínea.
“Aí extrai-se o sangue, que roda em uma máquina responsável por coletar as células-tronco, e em seguida o sangue é devolvido para o paciente”, explica ele. Essa doação é similar à doação de sangue. O paciente fica deitado em posição confortável e consciente.
O outro meio para doar é pelo osso do quadril. Nesse caso, o doador recebe uma sedação e o médico fará uma pequena perfuração com agulha no osso do quadril, extraindo a medula. O procedimento dura cerca de 30 minutos e o risco é o mesmo de uma pequena cirurgia. Perini explica que o paciente pode ficar um pouco dolorido no dia seguinte.
Fonte: IG