Política: Entenda a reforma política brasileira
O sistema político brasileiro deve mudar. Este é o diagnóstico de todos aqueles que acompanham a política brasileira. De Lula a Fernando Henrique Cardoso, de José Sarney a Eduardo Suplicy, da ruralista Katia Abreu ao líder sem terra João Pedro Stedile, todos apoiam a ideia de uma reforma política, um termo genérico para grandes alterações nas regras do sistema político. Mas que mudança cada um deles quer?
O tema ganhou atenção quando a presidenta Dilma Rousseff propôs um plebiscito e uma Constituinte exclusiva para a reforma política, após os protestos de junho de 2013. Sob críticas, o projeto foi afundado por sua própria base aliada.
Em seu discurso após o segundo turno, no domingo 26, Dilma retomou a proposta de submeter a decisão aos eleitores. Líderes do PMDB, partido aliado do governo, mostraram novamente que não aceitarão esta ideia.
Entenda o que está em jogo e quais as posições de políticos, entidades e movimentos sociais nas mudanças do sistema político:
O Brasil já teve uma reforma política?
Uma reforma política nunca foi aprovada no Brasil desde a Constituição de 1988. As leis que regem a eleição no Brasil ainda são o código eleitoral, de 1965, e a lei eleitoral, de 1997.
Isso, porém, não quer dizer que as regras sejam as mesmas desde então. Cinco leis já modificaram as regras das eleições desde então, sendo a última a lei da FichaLlimpa em 2010.
Além disso, as resoluções do Tribunal Superior Eleitoral também regulam a forma como as eleições devem funcionar e podem ser modificadas a cada eleição.
Qual é a proposta defendida por Dilma?
Dilma propôs convocar um plebiscito que autorizasse o funcionamento de um “processo constituinte específico” para fazer a reforma política. A consulta pública seria sobre cinco temas: financiamento de campanhas, sistema eleitoral, suplência de senadores, coligações partidárias e voto secreto.
A proposta foi primeiramente divulgada em um pronunciamento feito na televisão no ápice dos protestos nas ruas em junho do ano passado.
O que é uma Constituinte exclusiva?
Seria uma eleito exclusivamente para votar novas regras eleitorais, e dissolvido logo em seguida. Movimentos sociais que defendem esta proposta dizem que a constituinte de 1988 fez parte de uma “transição conservadora” e não apresentou uma ruptura com a ditadura.
Por isso, os congressistas deveriam ser eleitos por regras distintas das que existem hoje para eleição. Os movimentos defendem que este Congresso seja unicameral, ou seja, sem a divisão entre Câmara e Senado.
Apesar da falta de apoio político, Dilma tem defendido a Constituinte exclusiva. “Eu pessoalmente considero que a Constituinte é uma boa proposta porque não serão aqueles que estão no exercício do mandato que reformarão as instituições políticas do país”, disse em discurso durante a campanha em outubro deste ano.
O que foi o ‘plebiscito popular’ pela Constituinte?
Movimentos sociais conseguiram 7,4 milhões de assinaturas a favor de uma Constituinte exclusiva para a reforma política durante a semana da pátria deste ano. A cédula contava com uma única pergunta: “Você é a favor de uma Constituinte exclusiva e soberana sobre o sistema político?”
Como não tinha um caráter legal, o objetivo da mobilização era demonstrar o desejo popular por mudanças no sistema político e pressionar o poder público a convocar um plebiscito oficial sobre a reforma política.
Entre os apoiadores, estavam o PT, o PCdoB, correntes do PSOL, o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), o Movimento do Sem Terra (MST), a Central Única dos Trabalhadores (CUT), pastorais e ONGs.
O que aconteceu com a proposta de Dilma feita em junho?
A proposta foi enviada ao Congresso Nacional no dia 3 de julho do ano passado, já sem a ideia de uma Constituinte exclusiva. Mesmo assim, o projeto foi engavetado com a resistência de congressistas, inclusive da base aliada.
A Câmara dos Deputados reagiu para criar uma nova proposta. Uma comissão comandada pelo deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP) apresentou um novo texto no final do ano passado. A proposta de Vaccarezza, que não foi reeleito, acaba com a reeleição do presidente da República, dos governadores e prefeitos, põe fim ao voto obrigatório e flexibiliza as regras das coligações eleitorais.
O que o plebiscito para a reforma política precisa para acontecer?
Primeiro, um terço dos deputados ou dos senadores deve assinar uma proposta de decreto legislativo. Isso aconteceu no dia 30 de outubro, quando Luiza Erundina (PSB) e Renato Simões (PT) apresentaram o projeto assinado por 183 deputados.
Depois, ela deve ser aprovada no plenário das duas casas por ao menos metade mais um dos parlamentares de cada uma delas.
O projeto também sofre resistências jurídicas. Se ele for aprovado, alguns juristas acreditam que os pontos vencedores no referendo não obrigariam o Congresso Nacional a tomar a mesma decisão.
Qual é a diferença entre plebiscito e referendo?
Em um plebiscito, os eleitores são consultados antes da mudança e o resultado da consulta à população determina aquilo que o Congresso Nacional deve legislar. Foi assim em 1993, quando os eleitores decidiram entre o parlamentarismo, o presidencialismo e a monarquia.
No caso do referendo, proposta defendida pelos líderes do PMDB, a tramitação ocorre inversamente. Primeiro, o Congresso Nacional aprova a lei. Posteriormente, os eleitores devem decidir se aquela lei entra em vigor, a exemplo do que aconteceu com o estatuto do desarmamento em 2005.
Existem outras propostas de reforma política?
Sim. Além das propostas defendidas por Dilma e pelos líderes do PMDB, há outras possibilidades na casa. O líder do governo, deputado Henrique Fontana (PT-RS), defende, por exemplo, a proposta de iniciativa popular chamada de Eleições Limpas, relatada na Câmara por Luiza Erundina (PSB-SP). Elaborada por diversas entidades da sociedade civil, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o texto impede empresas de financiarem campanhas eleitorais, autorizando apenas pessoas físicas a fazerem doações de até R$ 700. Além disso, o projeto criminaliza a prática de caixa dois eleitoral, com punição de até oito anos de detenção.
Já o líder do PSDB, deputado Antônio Imbassahy (BA), defende a redução dos partidos políticos, para evitar legendas de aluguel de tempo de televisão, além da defesa do voto distrital. Há diversos outros projetos sobre o tema tramitando no Congresso Nacional.
Fontes: Plebiscito Constituinte, Coalizão pela Reforma Política, Câmara dos Deputados, Agência Brasil