Gastos leva milhões de brasileiros para lista de maus pagadores
A casa própria, o carro do ano, a viagem dos sonhos. Os desejos de consumo são muitos e, se não planejados, podem pesar no bolso e levar à ruína financeira. “Eu quase fui à falência”, recorda o servidor público Fabricio Rossi Fernandes Lima, 43 anos. Há sete anos, ele e a mulher, a também servidora Christiane Bubenick, 41, mudaram-se com os três filhos para um apartamento que a família havia adquirido em Águas Claras.
O que era para ser apenas uma mudança virou um pesadelo para o casal. Em poucos meses, tiveram de vender o único carro que tinham, tiraram os filhos da escola particular e viram a renda familiar se resumir ao salário de Fabricio, já que Christiane, que à época trabalhava numa operadora de telefonia, perdeu o emprego. “Foi uma dureza total”, resume Fabricio.
No sufoco, o casal cortou o máximo possível. “Não tinha mais cinema nem restaurante. As idas ao fast-food, que antes era toda semana, caíram para uma vez por mês. Também cortamos tevê a cabo e passamos a só assistir a filme alugado ou na tevê aberta”, recorda Fabricio. O relacionamento amoroso só não desmoronou porque ambos apostaram que dariam a volta por cima. “Graças a Deus, a gente se ama bastante e, juntos, conseguimos vencer a dificuldade financeira”, acrescenta. “Quando nos casamos, prometemos um ao outro que ficaríamos juntos na alegria e na tristeza.”
Valeu a pena. Depois de perder o emprego, Christiane dedicou-se aos estudos. Em dois anos, passou em dois concursos públicos. Hoje, é servidora do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT). O apartamento da discórdia já é página virada. Hoje, a família mora num imóvel quase duas vezes maior, também em Águas Claras. Mas, do tempo de vacas magras, sobrou a maior predileção por costumes espartanos. “Para economizar, dispensamos a empregada e demos tarefas a todos. Hoje, cada um é responsável pela organização do seu canto”, conta ela. “A gente aprendeu na marra a não gastar mais do que ganha. É aquela história, se não é pelo amor, é pela dor”, assinala.
No limite
O drama do casal resume uma prática comum no país: a de que só se atentar para a necessidade de controlar os gastos quando a situação chega ao limite. Na maior parte das vezes, a bola de neve começa com dívidas pequenas, que nem sempre recebem a devida importância pelo consumidor. Uma pesquisa divulgada pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) revela que dois de cada três brasileiros inscritos no cadastro de maus pagadores estão nessa situação por não dar atenção a gastos corriqueiros, como a conta de água e de luz. O mesmo levantamento mostra que despesas com o telefone celular e com a tevê a cabo, cujos valores também são considerados baixos, têm tirado o sono dos brasileiros e levado muitos deles à lista de negativados.
Não chega a ser uma surpresa, afirma o economista Samy Dana, professor de finanças da Fundação Getulio Vargas (FGV) de São Paulo. Ele lembra que as despesas mais difíceis de serem controladas são justamente as de menor valor, uma vez que poucas pessoas mantêm o costume de anotar tudo o que gasta no dia. “É a velha questão dos parcelamentos da loja ou no cartão, tudo sem juros, em suaves prestações”, observa. “A pessoa compra uma calça jeans em cinco vezes, um televisor em 10 vezes e um celular em oito. No fim, acumula tantas dívidas que já não consegue mais se dar conta de quantas são e, por isso, não se planeja para pagá-las”, revela.
Fonte: Correio Braziliense