Em Alagoas só Maceió cumpre lei que prevê o fim dos lixões
O prazo para que todos os municípios extingam de uma vez por todas os lixões no país se encerra neste sábado, 2 de agosto de 2014. Foram quatro anos desde a sanção da Lei 12.305, em 2010, mas pouco foi feito neste período. Em Alagoas, dos 102 municípios, apenas a capital conseguiu acabar com o lixão e criar um aterro, como previsto na lei. Os demais prefeitos começaram a se mobilizar há apenas um ano, criando consórcios para dividir os custos, mas ainda estão ”engatinhando” para mudar essa realidade.
Enquanto isso, cenas degradantes e desumanas ainda são vistas frequentemente nos lixões espalhados por todo o país. De acordo com o Ministério do Meio Ambiente (MMA), não há um panorama atual sobre coleta e destinação de resíduos sólidos porque os municípios não são obrigados a apresentar os planos ao governo federal, mas o governo federal estima que somente 10% dos municípios brasileiros concluíram seus planos municipais de gestão integrada de resíduos sólidos ou fazem parte de um plano intermunicipal.
Fora deste seleto grupo estão cidades como Penedo. Tombado em 1996 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artísticos Nacional (IPHAN) por causa do seu conjunto histórico e paisagístico, o município, que é margeado pelo imponente Rio São Francisco, tem um lixão localizado a cerca de 12 Km do centro da cidade. Lá, 35 pessoas se embrenham no meio dos resíduos para separar garrafas pet e outros materiais recicláveis.
Cada um ganha cerca de R$ 300 por mês. Adelaine Herculano, 32, mãe de cinco filhos, conta que trabalha em lixões desde os 12 anos de idade e se mostra preocupada com o fim dos lixões. “É daqui que tiro o meu sustento e o dos meus filhos. Se o lixão acabar, não vamos ter de onde tirar o dinheiro”, diz.
O mau cheiro e as dezenas de urubus não incomodam em nada quem precisa tirar do lixo o sustento da família. Assim que chega um caminhão, todos correm para encher as bags, como são chamados os sacos grandes onde eles colocam o material que vai para a reciclagem. a maioria não usa luvas, nem calçados. Há um funcionário da prefeitura que toma conta do local e tenta colocar ordem no lixão.
O Instituto do Meio Ambiente (IMA) junto ao Ministério Público do Estado de Alagoas (MP-AL) e outros órgãos fiscalizadores estiveram no lixão de Penedo no mês de maio, durante a Fiscalização Preventiva Integrada (FPI) do Rio São Francisco.
Para saber se há contaminação no local, o MP abriu um inquérito civil público e os fiscais do IMA coletaram amostras da água de uma lagoa que fica bem próximo do lixão e para onde corre o chorume [líquido proveniente da decomposição de resíduos orgânicos]. As amostras foram encaminhadas para laboratórios e, segundo a assessoria de comunicação do IMA, ainda estão sob análise.
É justamente para evitar a contaminação do solo, rios, lagos e lagoas que a lei criada em 2010 determina a extinção dos lixões. Os municípios deveriam se organizar e criar aterros sanitários, inclusive implantando a coleta seletiva. O aterro sanitário de Maceió já está operando, mas precisa corrigir algumas irregularidades, principalmente no que diz respeito à coleta seletiva. O estado ainda é carente desse serviço.
A maioria dos municípios se mobiliza para pôr fim aos lixões, mesmo a passos lentos. Uma das medidas nesse sentido foi a criação, em 2013, de consórcios para viabilizar verbas que possibilitem o projeto. Foram criados sete consórcios integrando 88 municípios: Sertão, Bacia Leiteira, Metropolitana, Zona da Mata, Agreste, Região Norte e Região Sul, do qual faz parte a cidade de Penedo, que também tenta se adequar à lei.
Segundo a assessora jurídica da Associação dos Municípios Alagoanos (AMA), Brígida Alencar, esse é o grande passo para que os projetos se concretizem. Dos sete consórcios, o da Bacia Leiteira, que abrange 16 municípios, é o único que está prestes a operar. Segundo o superintende do consórcio, Albino Freitas, o aterro localizado em Olho D’Água das Flores já está pronto, falta apenas a licença operacional. “Cumprimos todas as etapas e acredito que em quatro meses o aterro já estará em pleno funcionamento”, relata.
O consórcio da Bacia Leiteira, segundo a superintendência, conseguiu recurso da Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) e também do governo estadual e por esse motivo avançou muito mais que os outros.
Já os outros municípios, segundo a AMA, ainda estão na dependência dos planos intermunicipal e estadual que estão sendo elaborados com apoio da Secretaria de Estado do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos (Semarh).
A diretora de planejamento da Semarh, Elaine Melo, diz que os planos estadual e intermunicipais estão sendo realizados em conjunto, mas afirma que o grande entrave é recurso financeiro que não chega para os municípios. “Muitos municípios não geram receita e dependem única e exclusivamente do FPM [Fundo de Participação dos Municípios] ficando impossibilitados de realocar verba da saúde e da educação, por exemplo, para a coleta e destinação de resíduos”, relata.
“Se tivéssemos recursos, nós teríamos avançado muito mais. Talvez não concluído, mas estávamos bem mais adiantados. Quatro anos é pouco tempo se pensarmos em todas as etapas, inclusive em educar toda uma população que não é acostumada a fazer a separação de resíduos. Também enfrentamos o pessimismo de muitos gestores que sempre dizem que essa ou aquela política não vai dar certo”, afirma Elaine.
O entrave financeiro também é a principal justificativa da AMA, porta-voz dos municípios. Para a assessoria jurídica da associação, “é praticamente impossível cumprir o prazo sem políticas públicas de incentivo”. Brígida afirma ainda que a lei foi criada, ”mas o governo federal não designou verba específica para a execução”.
A esperança agora é que o governo federal dê mais tempo para que a situação dos lixões seja regularizada. “Há uma grande expectativa dos prefeitos a respeito da prorrogação desse prazo. Se isso não acontecer, os municípios terão que assinar TACs [Termos de Ajustamento de Conduta] com o Ministério Público [MP-AL] para não serem denunciados”, explica a assessoa jurídica. A partir daí o MP deve monitorar de perto o problema.
Por meio de nota, o Ministério do Meio Ambiente informou à reportagem do G1 que só o Congresso Nacional é quem pode mudar a Lei e alterar o prazo estipulado em 2010. E alertou que a existência de lixão a céu aberto constitui crime ambiental, com pena prevista na Lei de Crimes Ambientais (Lei 9605/1998). A fiscalização caberá aos órgãos integrantes do Sistema Nacional do Meio Ambiente ou ao Ministério Público.
Fonte: G1