A ciência por trás da bola oficial da Copa
Brazuca, a bola oficial da Copa 2014, é a 12º bola criada pela Adidas para Mundiais. A empresa foi duramente criticada pela Jabulani, a bola oficial da África do Sul, em 2010.
“Sua trajetória é imprevisível”, disse na época o goleiro italiano Gigi Buffon. “É sobrenatural”, afirmou o atacante Luis Fabiano em 2010.
A Adidas afirma, no entanto, que neste ano será diferente – e que a Brazuca proporciona uma “maior estabilidade no campo”.
A BBC Mundo conversou com especialistas em aerodinâmica para saber como se comportará a bola oficial desta Copa.
1. Painéis em forma de hélice
A nova bola conta com seis painéis, dois a menos do que os oito da Jabulani e os 14 da Teamgeist (a bola da Copa da Alemanha, em 2006) ou os 32 das bolas tradicionais.
Os painéis são termoselados, ou seja, são unidos com calor e não costurados à máquina, como na Jabulani. E a Brazuca incorpora, segundo a Adidas, “uma inovadora estrutura simétrica de painéis idênticos em forma de hélice” e uma nova superfície, com pequenas protuberâncias para criar mais aderência.
A forma dos painéis e a maneira como são unidos são elementos cruciais, pois mudam a forma em que a bola agita o ar ao se deslocar.
2. Diferenças nas emendas
Simon Choppin, pesquisador do Centro de Engenharia de Esportes da Universidade Sheffield Hallam, na Inglaterra, analisou as uniões dos gomos da bola.
“Descobrimos que a profundidade das emendas da Jabulani é de cerca de 0,48mm, enquanto as da Brazuca têm 1,56mm – mais de três vezes.”
“Por outro lado, medi a longitude das uniões de cada bola as delineando com uma corda. A longitude de total é cerca de 203 cm na Jabulani e 327 na Brazuca.”
Choppin explicou que quando uma bola se move no ar, suas emendas “agitam o ar, assim como a felpa de uma bola de tênis.”
Apesar do menor número de painéis, as emendas mais profundas e longas aumentam uma das características cruciais: a rugosidade.
3. Rugosidade
“O mais importante em uma bola de futebol é seu grau de rugosidade, proque isso afeta a velocidade na qual se produz o máximo do chamado knuckling effect”, disse à BBC Mundo Rabi Mehta, especialista em aerodinâmica do centro de pesquisa Ames, da Nasa.
Esse efeito é produzido quando a bola, se movendo sem ou com pouca rotação, se torna imprevisível e muda de direção ao alcançar certa velocidade.
“Quanto mais lisa a bola, maior a velocidade na qual ela produz esse efeito”, disse o engenheiro da Nasa. Para ele, o problema da Jabulani era justamente sua menor rugosidade.
“Na minha opinião, o que aconteceu é que ao fazer uma bola mais lisa em 2010, a velocidade crítica para esse efeito aumento e coincidiu com a velocidade típica dos chutes livres, cerca de 80 quilômetros por hora.”
“A velocidade crítica para esse efeito no caso da Brazuca é de cerca de 48 quilômetros por hora. Acredito, então, que ela se comportará mais como a bola tradicional de 32 painéis, por isso deve haver menos queixas do que as que vieram à tona no Mundial anterior.”
Para Choppin, a Brazuca vai ser mais estável nessa velocidade do que as bolas anteriores.
4. Vai mais longe
“Todo mundo sabe que as bolinhas de golfe têm umas protuberâncias. Isso surgiu quando os ‘caddies’ praticavam golf com bolas velhas e notaram que elas iam mais longe do que as novas”, explicou o engenheiro Raúl Bertero, professor titular de Mecânica da Faculdade de Engenharia da Universidade de Buenos Aires e diretor do Laboratório de Dinâmica de Estruturas da mesma universidade.
5. O efeito Magnus
“Quando a bola não gira ou gira muito pouco, temos o chamado efeito knuckling. Quando gira, temos o efeito Magnus, que faz com que a bola tenha o efeito de uma curva”, explica Rabi Mehta, da Nasa.
Raúl Bertero explicou à BBC Mundo que esse efeito “é conseguido ao se fazer girar a bola sobre seu eixo. Ao fazer isso e ao avançar na corrente de ar, cada lado da bola passa por uma velocidade do ar distinta.”
“Como a diferença de velocidade implica em uma diferença de pressão, a bola recebe uma força lateral – e isso se chama efeito Magnus.”
6. A altitude
Segudo Bertero, da Universidade de Buenos Aires, o efeito Magnus varia com a altitude porque a densidade do ar é alterada.
Em 2013, ele se propôs a investigar se era factível o que havia dito o então técnico da Argentina, Daniel Passarella, quando sua seleção perdeu por 2 x 0 em uma partida eliminatória em 1996 em Quito, a mais de 2.700 metros de altitude: “Aqui, a bola não faz curvas.”
“Me propus a fazer um modelo do comportamento de uma bola em um planície e no estádio de Siles Suazo, na Bolívia, que está a 3.700 metros de altitude”, contou o engenheiro.
Ele pegou como exemplo o famoso chute de Roberto Carlos, que colocou a bola no ângulo com uma curva espetacular, que deixou atônito o goleiro da França, Fabian Barthez, em um amistoso em 1997.
“Se essa mesma bola entra no ângulo na planície, vimos que em La Paz ela chega 4 metros fora do arco”, explica.
“Assim, Passarella, que foi muito criticado e ridicularizado, tinha razão. Na altitude, a bola faz menos curvas, mas não da mesma maneira.”
7. Poliuretano
Os painéis da Brazuca são de poliuretano.
“Ao se passar das bolas de coro para esses materiais artificiais, como o poliuretano, as bolas se tornaram totalmente impermeáveis, de maneira que quando chove, a massa da bola não muda”, explica Mehta, da Nasa.
No entanto, a água pode afetar outro aspecto: “Quando (o argentino) Riquelme vai bater um escanteio, ele seca a bola com a camiseta. Isso não é uma mania dele”, disse o engenheiro Bertero. “Faz isso porque sabe, instintivamente, que a bola tem um comportamento diferente se está molhada. A água cobre os gomos e deixa a bola lisa – então o efeito que se quer dar com um determinado chute pode não funcionar por não haver essa rugosidade necessária.”