Insatisfeitos, médicos e pacientes criam alternativas

Para marcar o Dia Mundial da Saúde e o Dia Nacional de Protesto contra os Planos de Saúde, celebrados ontem (07) segunda-feira, médicos de diversas partes do país promoveram diferentes tipos de protestos, inclusive suspendendo o atendimento de planos.

No topo da pauta das reivindicações está o valor pago pelas operadoras de saúde por consultas e procedimentos, considerado “incipiente” por organizações médicas e por profissionais ouvidos pela BBC Brasil.

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Apesar de algumas pequenas vitórias, o problema vem se arrastando há anos. Tanto que o slogan usado neste protesto pela Associação Paulista de Medicina é inspirado em uma campanha de 15 anos atrás: “Tem plano de saúde que enfia a faca em você e tira o sangue dos médicos.”

Diante desse cenário, um número crescente de profissionais – de pediatras a oftalmologistas – vêm criando alternativas para driblar os valores pagos pelas operadoras de saúde e condições impostas por elas.

Uma das estratégias mais comuns é um médico que não atende um plano de saúde cobrar do paciente com plano não o valor da consulta particular, mas sim a quantia paga como reembolso pelo plano.

Mas como isso funciona na prática? O caso da publicitária Juliana Linhares (nome fictício) é um bom exemplo. Após descobrir um problema no joelho, conseguiu fazer seu tratamento com um ortopedista de confiança apenas porque ele aceitava esse tipo de pagamento. Como não atendia o plano de saúde dela, o médico cobrou o valor mínimo de sua consulta particular (R$ 300) e deu dois recibos, no valor de R$ 150 cada. Juliana pagou e usou as nota dadas pelo médico para pedir reembolso a sua operadora de saúde, que era de R$ 120 para consultas desse tipo.

“No total, recebi R$ 240 do plano. Arquei com a diferença de R$ 60. O ideal, claro, seria não gastar nada, visto que já pago a mensalidade do plano. Mas não encontrei um médico de confiança entre os conveniados. Então, essa foi uma boa alternativa”, disse Juliana.

Planos lideram ranking de reclamações

Pelo segundo ano consecutivo, o setor de planos de saúde lidera o ranking de queixas recebidas pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), de acordo com balanço divulgado no mês passado.

Os planos de saúde estão no topo da lista, com 26,6% das demandas feitas à entidade em 2013, com acréscimo de 6,26 pontos percentuais em relação a 2012. Em seguida, vêm serviços financeiros (16,73%), produtos (13,05%) e telecomunicações (12,53%).

Sobre planos de saúde, as queixas mais recorrentes são negativa de cobertura, reajustes abusivos. O setor de saúde privada abrange cerca de 50 milhões de brasileiros.

Pelo prisma do médico, a proposta também é interessante, já que ele evitar perder pacientes, ganha mais do que receberia do plano e é pago na hora – ao invés de esperar até dois meses para receber os honorários pagos pelo plano.

Mais fôlego

Essa prática alternativa de cobrança vêm ganhando força, tanto que ela é incentivada inclusive pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), que analisa uma proposta de retirar as consultas dos contratos entre médicos e operadoras.

Pelo projeto, as consultas não integrariam os planos contratados pelos pacientes. Ele cobraria apenas exames, internações e outros procedimentos similares. Já as consultas seriam pagas diretamente pelo paciente ao médico, que realizaria o mesmo procedimento que o ortopedista no caso citado acima.

Ele daria um recibo pela consulta, com o qual o paciente poderia solicitar o reembolso do valor com a operadora de seu plano de saúde.

“Nossa proposta vem ganhando força porque a classe médica está muito impaciente e desmotivada”, disse à BBC Brasil o médico Aloísio Tibiriçá, vice-presidente do CFM.

“É claro que não é o cenário ideal, já que acaba sendo cômodo para os planos de saúde. Mas é uma alternativa para se evitar um desgaste progressivo na relação entre profissionais da saúde e operadores.”

Demora para pagar

Segundo Tibiriçá, no momento, os pacientes vêm se deparando com médicos desmotivados, que estão progressivamente abandonando os planos de saúde – além de operadoras incapazes de disponibilizar uma oferta razoável de profissionais para evitar uma demanda crescente – alta de 4,6% no ano passado.

“Estamos nas mãos dos planos. Eles demoram até mais de dois meses para pagar, por vezes não pagam determinada consulta ou exame e não há um extrato claro para se descobrir o motivo”, diz Tibiriçá.

“Para piorar, a ANS (Agência Nacional de Saúde Complementar, órgão do governo que regulamenta o setor) é complacente com as operadoras de saúde, não ouve nossas propostas e também não faz a ponte entre a classe médica e os planos.”

A ANS disse à BBC Brasil que as críticas são infundadas, já que há vários canais de diálogo com os médicos, como a recente criação de um comitê para incentivar boas práticas entre operadoras e médicos, para estreitar o diálogo entre as partes.

Segundo a agência, também não é verdadeira a afirmação de que não há diálogo, já que há “reuniões em grande periodicidade para se debater temas pertinentes.”

Já a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), que reúne 31 operadoras de planos de saúde, afirma que suas empresas associadas estão preparadas para garantir o atendimento aos seus beneficiários. “No acumulado dos últimos cinco anos, o reajuste aplicado pelas associadas à FenaSaúde aos honorários foi de 50%, em média – muito acima da inflação do período, que foi de 31%.”

No entanto, a insatisfação dos médicos em relação aos planos parece permear todas as especialidades e com profissionais em diversos momentos de suas carreiras.

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