MPE/AL quer garantir cotas para estudantes negros e indígenas em bolsas da Fapeal
Por Rafael Cavalcanti
O Ministério Público do Estado de Alagoas (MPE/AL), por meio da 61ª Promotoria de Justiça da Capital – Direitos Humanos e Proteção às Minorias, ajuizou, nesta quarta-feira (4), uma ação civil pública para garantir que a Fundação de Amparo à Pesquisa de Alagoas (Fapeal) reserve 10% das bolsas destinadas à Graduação e Pós-Graduação no Estado para estudantes negros e indígenas. O MPE/AL também quer que a Fapeal elabore e implemente um programa de ações afirmativas dentro de suas políticas de incentivo e fomento à pesquisa.
O procedimento do órgão ministerial é resultado da denúncia feita pelo Instituto do Negro de Alagoas (INEG) ao promotor de Justiça Flávio Gomes. Desde 2010, o INEG tenta iniciar um diálogo com a Fapeal sobre a adoção de ações afirmativas, mas sem sucesso, o que motivou a procura pelo Ministério Público. Em agosto, Flávio Gomes intermediou um encontro entre as partes, que culminou com a entrega de uma proposta do INEG a Fapeal, tratando das políticas de inclusão.
Na ocasião, a diretora-presidente da Fapeal, Janesmar Camilo de Mendonça Cavalcanti sugeriu a criação de uma Câmara Técnica de Políticas de Inclusão Social, com a participação do INEG. Entretanto, após as partes acordarem a solução, a gestora não cumpriu com a própria sugestão. O MPE/AL também cobrou à Fapeal uma reposta técnica sobre a implantação das ações afirmativas, sendo que o setor jurídico da Fundação respondeu que este tipo de política feria o Princípio da Igualdade protegido na Constituição Federal e Estadual.
A 61ª Promotoria de Justiça da Capital chegou a esclarecer à assessoria da Fapeal que o Supremo Tribunal de Federal (STF), através da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 186, julgada em 25 de Abril de 2012, de caráter vinculante, considerou as políticas de ações afirmativas constitucionais. O promotor Flávio Gomes insistiu na retomada do diálogo e no cumprimento do que havia sido acordado, mas não obteve qualquer resposta da Fundação.
“Todas as possibilidades de conversa e acordo foram estabelecidas, mesmo porque a adoção de políticas de ação afirmativa pelas fundações, sejam elas estaduais e federais, está inserida na Lei nº 12.288, Estatuto da Igualdade Racial. Ou seja, sendo lei deve ser cumprida, e a judicialização do pleito se deve pela falta de diálogo da FAPEAL”, explicou o promotor.
“Mais de dois terços da população de Alagoas são autodeclarados pretos e pardos, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, sem falar que Alagoas é a unidade da federação que mais mata seus jovens negros. É baseado nisso que entendemos ser urgente o cumprimento da lei e que os alunos oriundos de minorias, que a duras penas chegam ao Ensino Superior, possam participar dos programas de incentivo e fomento público”, ressaltou o promotor.
Educação, inclusão e minorias
Dados coletados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em 2001, mostram que, ao longo do século 20, houve uma considerável melhora na educação do país. Porém a diferença entre o acesso à educação de brancos e negros se manteve. O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) confirmaram tal diferenciação: a taxa de analfabetismo é de 12,8% no Brasil; entre os brancos cai para 7,5%; entre pretos e pardos (população negra) a taxa vai aos 16%.
Alagoas, segundo dados do Censo de 2010 (IBGE), possui cerca de dois terços de sua população que se autodeclaram pretos e pardos. Na proposta de ações afirmativas apresentada pelo INEG à Fapeal, a adoção de políticas inclusivas no Ensino Superior tem com objetivo diminuir essas diferenças. “Visa retardar o crescimento do espaço educacional entre brancos e negros”, explicou o titular da 61ª Promotoria de Justiça da Capita, promotor Flávio Gomes.
“Se não houver ação afirmativa no ensino superior, mas forem mantidas as atuais políticas de educação, apenas daqui a 20 anos os negros terão a média de escolaridade tida hoje pelos brancos. Quando isso acontecer, os brancos já estarão mais à frente, de maneira que a igualdade nunca será alcançada se não forem tomadas medidas diretas para sanar a desigualdade. Considerando a meta a conclusão do Ensino Médio, os brancos deverão alcançá-las em 13 anos, enquanto os negros necessitarão de 32 anos, caso sejam criadas ações afirmativas”, disse Flávio Gomes.
Para o promotor, a atuação da FAPEAL não seria a solução para todos os problemas sociais que se abatem sobre a população de Alagoas, em especial a população negra. Mas ele considera que as ações afirmativas seriam de enorme contribuição, “já que uma das saídas para este quadro passa pela educação, pela pesquisa, pelo acesso ao fomento e incentivo dos poucos jovens negros e indígenas que chegam à Graduação e à Pós-Graduação, com vários méritos, poderem através do trabalho acadêmico, não só construírem uma vida melhor para si, mas também contribuir com a produção acadêmica e com sua realidade”, concluiu Flávio Gomes.